Programa Mundial de Alimentos da ONU ganha o Nobel da Paz em 2020
Comitê Nobel da Noruega destacou a contribuição da agência para melhorar as condições para a paz em áreas atingidas por conflitos e por prevenir o uso da fome como arma de guerra
Redação, O Estado de S.Paulo

OSLO – O Programa Mundial de Alimentos (WFP, na sigla em inglês) da Organizaçao das Nações Unidas (ONU) ganhou o Prêmio Nobel da Paz de 2020, anunciou o Comitê Nobel da Noruega nesta sexta-feira, 9.
A organização destacou o programa promovido pela ONU “por seus esforços para combater a fome, por sua contribuição para melhorar as condições de paz em áreas afetadas por conflitos e por atuar como uma força motriz nos esforços para prevenir o uso da fome como arma de guerra e conflito.”

O WFP é a maior agência humanitária da ONU, responsável pelo maior programa de combate à fome do planeta, em busca de promover a segurança alimentar. Apenas em 2019, a agência forneceu assistência para cerca de 100 milhões de pessoas em 88 países.
Após a premiação, a entidade escreveu no Twitter que o Nobel da Paz é um “poderoso lembrete para o mundo de que a paz e a erradicação da fome são indissociáveis”.
Vítimas do furacão Matthews recebem comida do Programa Mundial de Alimentos no Haiti Foto: AFP PHOTO / HECTOR RETAMAL
Nos últimos anos, a situação alimentar no mundo vem se agravando, com 135 milhões de pessoas passando fome, aumento causado majoritariamente por guerras e conflitos armados. A agência enfrenta dificuldades para receber os recursos necessários para expandir seu trabalho.
“A entrega do Prêmio Nobel da Paz ao Programa Mundial de Alimentos é um reconhecimento humilde e comovente do trabalho dos funcionários do WFP que arriscam suas vidas todos os dias para levar comida e assistência para cerca de 100 milhões de crianças, mulheres e homens famintos em todo o mundo. Pessoas cujas vidas são frequentemente dilaceradas brutalmente pela instabilidade, insegurança e conflito”, afirmou David Beasley, diretor executivo do programa, após a premiação.
Beasley ainda destacou que o programa só é possível através das parcerias com governos, organizações e empresas locais, que colaboram para as atividades desenvolvida em cada país. O diretor também fez um apelo pela segurança alimentar como um meio de atingir a paz. “Onde há conflito, há fome. E onde há fome, freqüentemente há conflito. Hoje é um lembrete de que segurança alimentar, paz e estabilidade caminham juntas. Sem paz, não podemos alcançar nosso objetivo global de fome zero; e enquanto houver fome, nunca teremos um mundo pacífico.”
Preocupações com o futuro
A premiação ganha ainda mais importância em um ano em que o mundo enfrenta uma grave crise alimentar por causa da pandemia do novo coronavírus.
“O mundo está enfrentando fome generalizada de proporções bíblicas”, alertou Beasley, em abril, o chefe da agência de assistência alimentar da Organização das Nações Unidas (ONU). O diretor executivo do órgão afirmou que há pouco tempo disponível para agir antes que centenas de milhões passem fome.
No Brasil a situação também é grave: a fome aumentaou 43,7% em 5 anos, e o Brasil teve a 1ª piora em segurança alimentar desde 2004, quando o levantamento começou a ser feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“O Brasil saiu do Mapa da Fome em 2014, mas agora está caminhando a passos largos para voltar”, disse em entrevista ao Estadão, em maio, o economista Daniel Balaban, chefe do escritório brasileiro do Programa Mundial de Alimentos.

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‘Cooperação e multilateralismo’
Ao entregar o prêmio para o braço das Nações Unidas, o Comitê Norueguês do Nobel elogiou o programa por seus “esforços para acabar com a fome no mundo e pela necessidade de solidariedade e multilateralismo”.
A premiação ao programa é uma forma de apoio a ONU, que completou 75 anos em 2020. O Sistema das Nações Unidas enfrenta desconfiança, ataques populistas e incertezas sobre o futuro em meio à ascensão de governos populistas.
“A necessidade de solidariedade internacional e cooperação multilateral é mais conspícua que nunca”, disse a presidente do comitê, Berit Reiss-Andersen. “O Prêmio Nobel da Paz de 2020 foi para o Programa Mundial de Alimentos por seus esforços de combate à fome, por sua contribuição para melhorar as condições para a paz em áreas atingidas por conflitos e por agir como força-motriz dos esforços para prevenir a fome como uso de arma de guerra e conflito.”
The Norwegian Nobel Committee has decided to award the 2020 Nobel Peace Prize to the World Food Programme (WFP)#NobelPeacePrize #NobelPeacePrize2020 pic.twitter.com/z6v0K1NQe6 — Nobel Peace Center (@NobelPeaceOslo) October 9, 2020
Em seu anúncio, Reiss-Andersen ressaltou que a pandemia de covid-19 teve como consequência um grande aumento do número de vítimas da fome que, somada ao aumento de conflitos em países como Iêmen, República Democrática do Congo, Nigéria, Sudão do Sul e Burkina Faso teve efeitos dramáticos. Diante da pandemia, o Programa Mundial de Alimentos “demostrou uma habilidade impressionante para intensificar seus esforços”.
Outros premiados com o Nobel da Paz
No ano passado, o laureado foi o primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, “por seus esforços para alcançar a paz e a cooperação internacional, principalmente por sua iniciativa decisiva destinada a resolver o conflito na fronteira com a Eritreia”.
Em 2018, a jovem yazidi Nadia Murad e o ginecologista congolês Denis Mukwege ganharam o Nobel da Paz por seus esforços contra o uso da violência sexual como arma de guerra. No ano anterior, ganhou a Campanha Internacional para a Abolição de Armas Nucleares, por chamar a atenção para as consequências do uso do armamento e chegar a um acordo pelo fim das armas nucleares.
Em 2017, em razão de seus esforços para obter um acordo de paz com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), o ex-presidente colombiano Juan Manuel Santos levou o prêmio.
Algumas das grandes surpresas incluem a paquistanesa Malala Yousafzai, que recebeu o prêmio em 2014, aos 17 anos, “pela luta contra a opressão das crianças e dos jovens e pelo direito de todas as crianças à educação”. Ela se tornou a pessoa mais jovem a receber o Nobel.
Outra grande surpresa, muito contestada à época, foi a escolha, em 2009, do então presidente american Barack Obama, agraciado por seus “esforços extraordinários para fortalecer a diplomacia internacional e a cooperação entre os povos”.
Desde a última segunda-feira, o Nobel já divulgou os laureados das categorias de Medicina,Física,Química e Literatura.
Como funciona o Nobel da Paz
O prêmio Nobel da Paz é concedido, desde 1901, a homens, mulheres e organizações que trabalharam para o progresso da humanidade, conforme o desejo de se criador, o inventor sueco Alfred Nobel. Ele é lembrado como o patrono das artes, das ciências e da paz que, antes de morrer, no limiar do século 20, transformou a nitroglicerina em ouro.
O prêmio é entregue pelo Comitê Norueguês do Nobel, composto por cinco membros escolhidos pelo Parlamento norueguês. O vencedor recebe, além de uma medalha de ouro, 9 milhões de coroas suecas, o equivalente a US$ 910 mil (R$ 5 milhões).
Indicar uma pessoa a um prêmio Nobel é relativamente simples. O comitê organizador distribui (e fornece em seu site) formulários para centenas de formadores de opinião.

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As fichas com as sugestões são enviadas até o fim de janeiro de cada ano e então cada uma delas é avaliada até outubro, quando os vencedores são anunciados. Ao longo desse processo, a lista é reduzida para uma versão menor, com no mínimo cinco e no máximo 20 nomes, que são revisados. Os jurados debatem essa lista e buscam alcançar o consenso – quando ele não acontece, a escolha se dá por votação.
A entrega dos prêmios ocorre em dezembro. Mas pode acontecer de o comitê decidir que ninguém mereceu vencer o Nobel da Paz naquele ano – a honraria não foi entregue em 20 ocasiões, a mais recente delas em 1972.
Ate hoje, cinco vencedores não puderam participar da cerimônia em Oslo. Em 1936, o jornalista e pacifista alemão Carl von Ossietzky estava em um campo de concentração nazista. Em 2010, o dissidente chinês Liu Xiaobo foi preso e, portanto, sua cadeira, na qual o prêmio foi depositado, ficou simbolicamente vazia. Desde 1974, os estatutos da Fundação Nobel estipulam que um prêmio não pode ser concedido postumamente, a menos que a morte ocorra após o anúncio do nome do vencedor./AP, AFP e REUTERS

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