CURRÍCULO: NÃO BASTA TER SÓ UM, TEM DE ADAPTÁ-LO A CADA VAGA

Currículo no formato tradicional ou arrojado? Soft skills ao lado de habilidades técnicas? Um só ‘curriculum vitae’ na manga ou vários? Entenda o que é novidade no mercado para sua carreira

Texto: Anna Barbosa

A publicitária Giovanna Bertasi, que fez currículo diagramado e com coresWERTHER SANTANA/ESTADÃO

Publicidade e propaganda, moda, direito, ciências econômicas, relações públicas. Cursos de áreas variadas, de alunos de instituições públicas e privadas de São Paulo, fazem surgir formatos de currículos igualmente variados. Há um consenso sobre como montar o currículo? Segundo especialistas da área de recrutamento e seleção, não existe modelo ideal. Mais importante do que ter um layout diferenciado, é ter conteúdos estruturados de maneira clara e objetiva. E, para além do formato, o conteúdo também passa longe da unanimidade: você deve personalizá-lo de acordo com a vaga e a empresa pretendidas.

“Não existe uma regra, certo ou errado. Na verdade, o currículo nada mais é do que um retrato da sua história: fala sobre presente, passado e futuro. Ele precisa construir uma narrativa. Para cada festa, um traje”, afirma Rodrigo Vianna, CEO da Mappit, empresa do Talenses Group especializada em vagas para quem está em início de carreira.

De acordo com um levantamento realizado pela Catho em 2019 com mais de 400 recrutadores, 30% deles demoram em média de 6 a 10 segundos para descartar um currículo para uma entrevista, enquanto outros 27% levam de 11 a 29 segundos. Só 17% deles demoram entre 30 e 59 segundos para descartar ou não o texto, e apenas 21% levam mais de 1 minuto.

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Se o tempo dos recrutadores é curto, então o foco deve ser construir uma narrativa assertiva para aquela vaga. Rodrigo Vianna explica que para cada processo existe uma demanda e que, por isso, recomenda que os candidatos tenham dois currículos à mão, um no modelo tradicional e outro num modelo mais contemporâneo, com conteúdo que pode ser customizado. “É sobre se conectar com o seu interlocutor. Em algumas empresas mais disruptivas, pode não pegar bem o currículo tradicional. Não é que pega mal, mas fica no ‘normal’.”

MAS O QUE SÃO O CURRÍCULO TRADICIONAL E O CONTEMPORÂNEO?

Em geral, o que diferencia os dois modelos é o layout. O formato tradicional é caracterizado por uma folha corrida, é feito em programas como Word, em apenas uma coluna. Não possui foto nem cores. Já o formato mais contemporâneo, que pode ser feito em sites ou programas de design, é diagramado com uma ou duas colunas, possui cores e até mesmo estampas e ilustrações.

Sobre o conteúdo, os especialistas apontam que ambos deveriam ter as mesmas informações, mas no mercado é mais comum ver a lista de soft skills (habilidades comportamentais) em currículos mais modernos, elencado em uma coluna vertical ao lado de outra coluna com as hard skills (habilidades técnicas). O assunto causa divergência entre especialistas, leia mais abaixo.

Modelos de currículos cedidos pelo CIEEREPRODUÇÃO


Para Rodrigo Vianna, o currículo tradicional continua funcionando e sendo um padrão no mercado, minimizando o risco de erro. “Eu ainda acredito que ter um currículo padrão é mais seguro, mas não necessariamente é o mais certo. O mundo online permite que você crie.”

Kerullen Pimenta de Sá, gerente de serviço e qualidade da consultoria de recursos humanos Adecco, acredita que falar sobre currículo é falar sobre a identidade pessoal de cada um. “Hoje em dia, principalmente com a pandemia, a nossa marca pessoal ficou muito forte.”

A especialista também pondera que não existe um formato ideal. “O que se aplica, tanto para o formato tradicional quanto para o formato mais inovador, é ter informações claras. Os layouts mais inovadores não são necessariamente um diferencial no processo.”

Como forma de explicar a importância do conteúdo, Kerullen dá o exemplo do LinkedIn. “O perfil no LinkedIn hoje é essencial. Ele é uma ferramenta voltada para a colocação de todos os níveis e lá você se preocupa mais com o conteúdo.”

PARA PREENCHER SEU PERFIL NO LINKEDIN


● Tenha uma foto atualizada de perfil
● Dê um título para o seu perfil: coloque a área de atuação ou o cargo
● Escreva um breve resumo sobre você com no máximo dois parágrafos
● Preencha os campos de informações básicas: idiomas, cursos, prêmios, projetos de que participou e causas que apoia
● Coloque suas experiências de trabalho: assim como no currículo, descreva quais metas atingiu, quais resultados positivos obteve
● Interaja: faça publicações, comente em postagens de colegas e desenvolva uma rede na sua área de atuação

Contudo, existem áreas que tendem ao modelo mais moderno, é o que afirmam as especialistas Tatiana Silva, analista de recrutamento e seleção do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), e Patricia Suzuki, diretora de gente e gestão da Catho.

“O melhor formato tem a ver com a área de atuação. Por exemplo: áreas da comunicação tendem aos modelos mais modernos, enquanto  áreas formais, como direito, ainda possuem currículos mais tradicionais”, afirma Tatiana. Para ela, o currículo tem que representar o candidato e a área em que ele está direcionado.

Além disso, mais do que representar o candidato e sua área, a construção do currículo deve dialogar com a empresa para a qual o profissional está se aplicando, afirma Carolina Utimura, CEO da Eureca, consultoria especializada em comportamento jovem e na conexão deste público com o mercado de trabalho.

“Quando observo a questão sobre como se apresentar para a organização, é ideal estudar sobre a empresa. Ter uma boa leitura para onde você quer ir é uma lição de casa importante.”

Patrícia Beltran, do Vagas.comARQUIVO PESSOAL

Assim, ao tentar uma vaga como gestor de UX (experiência do usuário) numa empresa de tecnologia, por exemplo, não é necessário destacar no currículo um curso técnico de fotografia que fez anos atrás.


Devo ou não colocar as soft skills?

Nos últimos anos, as soft skills vêm se tornando cada vez mais populares. Entre os candidatos, o questionamento se elas devem aparecer no currículo ou não também é cada vez mais frequente. Dentre os especialistas, as opiniões se dividem. Enquanto alguns acreditam que isso deve ser unicamente papel do recrutador, outros acham que é possível colocar.

Para Kerullen, da Adecco, as habilidades socioemocionais não cabem dentro do currículo. “Não acho interessante colocar soft skills no currículo. Você pode achar que tem todas, mas com qual base ou argumento você consegue comprovar que realmente tem? Sou a favor de que as soft skills fiquem para quem está contratando.”

Patricia Suzuki, da Catho, segue a mesma linha de pensamento. “Essa não é uma informação que deva constar no currículo do profissional. O recrutador avalia no processo de entrevista. Aproveite para colocar experiências, metas alcançadas em sua carreira, os indicadores que demonstram que você fez diferença quando estava naquela cadeira.”

Por outro lado, Patrícia Beltran, do portal Vagas.com, acredita que pode ser interessante colocar as soft skills contanto que sejam baseadas em testes. “Trazem informações que vão além da perspectiva do candidato, são baseados em instrumentos.”

Rodrigo Vianna, da Mappit, aponta que principalmente no começo da carreira, o currículo nada mais é do que transformar suas experiências em ações. “É mais sobre comportamento, experiência e vivência do que atividade em si.”

Para ele, a palavra que norteia o currículo é propósito. “Em que lugar do seu currículo você vai encaixar seu propósito? O que você vai ser? Como você vai mudar o mundo? O que você vai deixar de legado? O propósito liga você ao seu comportamento. Adaptabilidade, flexibilidade, resiliência… Qualquer livro tem essas palavras.”

Para o publicitário Rodrigo Souza, que mora no Panamá, deu certo fazer um currículo no formato mais tradicionalARQUIVO PESSOAL

A VISÃO DOS CANDIDATOS

Exatamente por ser um retrato pessoal das experiências profissionais de cada um, estudantes da mesma profissão possuem diferentes visões sobre o melhor modelo de currículo. É o caso de Giovanna Bertasi e de Rodrigo Souza, ambos formados em Publicidade e Propaganda.

“O currículo, na maioria das vezes, acaba sendo o primeiro ponto de contato com a empresa. É nossa primeira venda de nós mesmos, nos apresentando para uma vaga por meio de um papel ou arquivo”, diz Giovanna, formada em 2019 na ESPM e atualmente integrante do Programa de Jovens Talentos da Britvic Brasil.

Ela conta que optou pelo moderno mais moderno por acreditar que de certa forma ele ia se destacar em relação aos outros. “Tem mais cor, um layout diferente e deixa a visualização das informações específicas de maneira mais fácil”, aponta.

Giovanna acredita que, por ser da área da comunicação, poderia ficar para trás se optasse pelo formato tradicional.

As empresas buscam algo que condiz com a formação, e o primeiro contato que elas têm é o currículo

Giovanna Bertasi, publicitária

Segundo ela, as empresas exigem que as “pessoas de comunicação sejam antenadas, adeptas a mudança, mais modernas mesmo”.

Em contrapartida, Rodrigo conta que tinha o currículo moderno que havia feito no Adobe Illustrator. “Ao longo do tempo e das minhas entrevistas, eu ia mudando, mesmo sem fazer um curso novo. Eu lia as dicas e ia ajustando.”

Ele diz que estava em grupo de trainees e decidiu pedir dicas de como melhorar o currículo lá. “Mandei meu currículo e falaram que valeria a pena apostar em um modelo menos moderno. Outras duas pessoas enviaram um modelo tradicional, quadradão, e eu resolvi mudar pra esse formato (mais tradicional). E surtiu efeito.”

Rodrigo diz que depois de mudar para uma estrutura mais antiga, começou a receber mais respostas positivas das empresas. “Chegou um momento em que eu não sentia mais resposta para os envios de currículo naquele layout moderno. Eu vi que, naquele modelo, não cabia o que eu precisava falar.”

Atualmente, ele trabalha como especialista em marketing e comunicação na Hilti Latin America, localizada no Panamá. Contudo, seu processo começou aqui no Brasil. “Eu estava tentando (vaga de emprego) tanto aqui quanto no exterior e era o mesmo CV para os dois. De qualquer forma, a mudança de currículo me deu mais contato com as empresas”, diz Rodrigo.

Para ele, o currículo é um primeiro passo importante. “Toda caminhada começa com um primeiro passo. E, se você não dá um bom primeiro passo, você não vai a lugar nenhum. Ou você coloca ali a sua vontade, ou as coisas não vão fluir.”

ONDE FAZER O CURRÍCULO ONLINE


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Gerador de currículo


O que um currículo deve conter?

Independentemente do formato do currículo, os especialistas apontam uma apresentação básica que deve ser seguida, construindo uma narrativa que conte sobre as experiências do candidato. Um currículo com as informações bem sintetizadas é essencial para prender o recrutador. Por isso, separamos algumas dicas que podem auxiliar nesse processo:

1Dados pessoais: alguns especialistas afirmam que eles não são tão importantes quanto no passado, por conta da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), além do fato de as novas seleções serem mais voltadas para técnica e comportamento. Contudo, outros ainda veem este ponto como essencial e apontam a importância de colocar dados como endereço e perfil no LinkedIn

2Objetivo: este é um ponto importante, em que o candidato deve refletir para onde quer ir, entendendo a necessidade e o contexto da vaga a que está se aplicando. Para aqueles que ainda não sabem de fato, os especialistas recomendam colocar pelo menos as áreas que possuem interesse em se desenvolver

3Informações sobre formação: universidade, semestre em que está (se ainda estiver cursando), período de aula (se é noturno, matutino ou vespertino) e previsão de conclusão são itens a serem incluídos

4Idiomas: os candidatos que possuem outros idiomas devem listá-los junto ao nível de conhecimento. Caso possuam certificados internacionais, é interessante citá-los

5Cursos: para os especialistas, é importante informar cursos que estejam relacionados com as áreas de interesse. Quais cursos praticou e participou que dialogam com aquela área e vaga? Se não tiver nenhuma correlação, não precisa informar

6Experiências: para os candidatos que ainda não possuem experiência, recomenda-se colocar projetos e atividades que tenham fit cultural com a vaga, até mesmo os realizados no meio acadêmico. Além disso, é permitido citar intercâmbios e trabalhos voluntários. Para os que já tiveram experiência, cite-as e diga quais metas atingiu, quais resultados positivos obteve com a vivência

Patrícia Beltran, especialista de RH da Vagas.com, explica que ao falar sobre a trajetória uma dica essencial é utilizar termos chaves que dialogam com a descrição da vaga, um ponto que pode chamar atenção do RH.

“Observar quais são as palavras que mais se repetem nas oportunidades que eles se candidatam e palavras extras que eles têm conhecimento, como sinônimos. Por exemplo: se aparece várias vezes Excel intermediário, isso é um termo chave. Se você tiver conhecimento nessa área, deve descrever isso.”

Rodrigo Vianna, da Mappit, aponta um ponto de atenção quanto ao número de caracteres. “É assim como no Twitter. Mais conteúdo com menos caracteres”. Para ele, menos é mais. “Se você coloca muita informação, para quem está do outro lado da mesa pode ser cansativo, porque a outra pessoa recebe uma série de currículos no dia.”

Para um bom currículo, coloque informações que digam respeito à vaga desejadaWERTHER SANTANA/ESTADÃO

A IMPORTÂNCIA DO CURRÍCULO PARA CARGOS MÉDIOS E ALTOS

Há quem pense que para cargos seniores basta uma indicação. Segundo Isis Borge, diretora do Talenses Group, consultoria de recrutamento e seleção para todos os níveis hierárquicos, isso é exceção, e não a regra.

A especialista afirma que a grande maioria dos processos seletivos vai pedir do profissional um currículo que contenha as informações principais a respeito daquele profissional.

“Com todas as políticas de códigos de conduta e ética, cada vez mais as pessoas indicam de uma forma mais neutra, para que o profissional faça o processo seletivo junto com outros candidatos e siga o fluxo normal. Isso faz com que o currículo seja necessário.”

Ela explica que para o profissional decidir o formato do currículo também depende qual tipo de vaga e em qual mercado ele está pleiteando a vaga. “Existem mercados mais tradicionais e mercados extremamente arrojados. Mas, na dúvida, opte pela simplicidade.”

Isis afirma que o currículo é importante em todos os níveis de senioridade, tendo em vista que é um resumo sobre a experiência profissional e das habilidades técnicas adquiridas ao longo da carreira. “Vale lembrar que o currículo é a primeira impressão que a nova empresa terá do potencial candidato. Então, se for um currículo bem estruturado, será um chamariz positivo para que a empresa tenha interesse em conhecer o profissional.”


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By valeon