Recuperação desigual
Retomada mais lenta do setor de serviços atrasa a recuperação dos empregos.
Maior fonte de empregos em tempos normais, o setor de serviços cresceu em setembro pelo quarto mês consecutivo, mas ainda sem retomar o nível de atividade pré-pandemia. Indústria e varejo começaram a recuperar-se mais cedo, em maio, e saíram mais rapidamente do buraco onde haviam caído em março e abril. Desde o início da retomada, o volume de serviços prestados acumulou expansão de 13,4%, resultado modesto quando comparado com a perda de 19,8% no período de março a maio.
Com aumento de 1,8% em setembro, a prestação de serviços ainda foi 7,2% menor que a de um ano antes. Foi a sétima taxa negativa nesse tipo de confronto. O balanço de janeiro a setembro foi 8,8% inferior ao dos nove meses correspondentes de 2019. Em 12 meses o recuo foi de 6%. O último dado mensal da indústria foi melhor que o de um ano antes, assim como o do comércio varejista. Também isso mostra o descompasso na recuperação.
O distanciamento social atingiu muito mais duramente os serviços do que os outros setores. Quando se comparam os períodos de janeiro a setembro deste ano e de 2019, as maiores perdas são observadas em alojamento e alimentação, com queda de 40,2%; transporte aéreo, com recuo de 37,6; e “outros serviços prestados às famílias”, com declínio de 30%. É fácil entender o contraste com os serviços de tecnologia da informação, com ganho de 6,5% no confronto entre os dois períodos de nove meses.
Barbearias, salões de beleza e academias também estão, sem surpresa, entre os negócios com grandes perdas na fase de maior distanciamento social. Seus problemas foram muito mais graves que os do comércio varejista, beneficiado, assim como parte dos bares e restaurantes, pela possibilidade de vendas online.
O governo conta com a recuperação dos serviços para o aumento do emprego, principalmente informal, em 2021. Essa é uma das expectativas indicadas pelo Ministério da Economia. Mas para isso a retomada do setor terá de ser bem mais vigorosa que a observada entre junho e setembro. Além disso, a evolução dos negócios, nos diferentes setores, será certamente afetada pelas prioridades de milhões de famílias com orçamento muito apertado.
Com o fim do auxílio emergencial, por enquanto previsto para dezembro, os consumidores terão de controlar severamente seus gastos. Segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, o auxílio poderá ser prorrogado se ocorrer no Brasil uma segunda onda de covid-19. Nesse caso, haverá, de acordo com a perspectiva do governo, condições mais favoráveis à oficialização de um novo estado de emergência. Mas alguma pessoa ainda normal poderá desejar essa nova calamidade?
Uma segunda onda será menos provável que na Europa, se muitos cidadãos, contrariando as opiniões do presidente da República, forem cautelosos, continuando a usar máscara e observando outras medidas de prevenção. O abandono desses cuidados em muitas áreas da Europa e dos EUA foi desastroso. Produziu mortes e internações evitáveis e forçou um retrocesso na abertura econômica.
No Brasil falta um plano de manutenção da retomada. Contar com uma nova onda de covid-19 para reativar ou manter o auxílio emergencial parece no mínimo estranho. Também se fala, em Brasília, no lançamento de um grande programa de microcrédito.
Crédito fácil ajudará, mas sem substituir o auxílio direto ou um bom programa de incentivo fiscal. Além disso, quanto risco os banqueiros estarão dispostos a aceitar? De toda forma, essas questões parecem até estranhas quando nem se sabe se um orçamento para 2021 será votado até 31 de dezembro.
Empresários contam com as vendas de fim de ano para reforço de caixa. Há alguns sinais de otimismo e as contratações têm aumentado. Mas, segundo a Federação do Comércio do Estado de São Paulo, o varejo paulista deve contratar em novembro e dezembro cerca de 22,9 mil funcionários, o menor número desde 2017, quando foram abertas 24,3 mil vagas. Em 2019 foram 35,3 mil. Como ficará o País depois do réveillon? O governo tem pouco tempo para cuidar da resposta.