O Censo da Educação Superior
Ensino virtual vem crescendo, sem, contudo, melhorar a qualidade da educação
Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
O Censo da Educação Superior de 2019, divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), mostrou que nos últimos dez anos o número de matrículas aumentou 43,7%, passando de 5,9 milhões para 8,6 milhões. Desse total, 75,8% dos alunos de graduação estudam em instituições privadas e os 24,2% restantes cursam universidades públicas.
Ainda que em termos quantitativos o aumento do número de universitários seja uma informação importante, do ponto de vista qualitativo ele tem de ser visto com cuidado. Entre outros motivos, porque o Censo detectou que, de dez alunos que ingressaram no primeiro ano do ensino superior em 2019, quatro optaram por se matricular em cursos de graduação a distância.
O Censo também revela que as matrículas no ensino a distância vêm crescendo a cada ano, enquanto as dos cursos presenciais vêm se reduzindo. Em 2009 o número de ingressantes nos cursos virtuais representava 16,1% do total de calouros no ensino superior. Em 2018, já eram 39,8% do total. E, no ano passado, foram 43,8%, o que equivale a cerca de 1,6 milhão de estudantes. Por causa da pandemia, as estimativas são de que o próximo Censo registrará um crescimento ainda mais vigoroso do ensino remoto em todos os anos da graduação, uma vez que a política de isolamento suspendeu as aulas presenciais em todo o País.
Com relação a 2019, o Censo revela que a escolha do ensino remoto foi mais expressiva entre os calouros das universidades privadas, chegando a 50,8% do total, enquanto o número de matrículas no primeiro ano do ensino presencial caiu. Isso mostra que as universidades privadas vêm apostando na educação virtual.
Esses números causam preocupação entre os especialistas em ensino superior. Em primeiro lugar, porque a educação presencial é sabidamente mais eficiente do que a virtual, em termos de aprendizagem dos alunos. E, em segundo lugar, porque a qualidade do ensino nas universidades privadas é mais baixa do que nas universidades públicas. Segundo o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) de 2019, divulgado pelo Inep dias antes da publicação do Censo, só 1% dos cursos de graduação das universidades particulares obteve a nota máxima – ante 24% nas universidades federais.
Além disso, há outro ponto que já vinha sendo duramente criticado pelos especialistas em ensino superior. Em dezembro do ano passado, o MEC baixou uma polêmica portaria, autorizando as instituições de ensino superior a ampliar para até 40% a carga horária do ensino remoto nos cursos presenciais de graduação, inclusive nas áreas das engenharias e saúde (com exceção de medicina). Essa era uma antiga aspiração dos grupos educacionais privados, uma vez que as plataformas digitais permitem cortar gastos com a demissão de professores e redução dos custos com espaços físicos.
Outra informação importante do Censo diz respeito às licenciaturas, cuja função é formar professores. Segundo o levantamento, um em cada cinco estudantes do ensino superior está matriculado em cursos de licenciatura. E mais da metade estuda, justamente, em instituições particulares, cujo ensino é em geral fraco. A má formação dos futuros docentes sempre foi um dos principais obstáculos para a melhoria da educação básica.
Ao anunciar o Censo, as autoridades educacionais asseguraram que a distância entre o ensino presencial e o virtual não será tão grande, em matéria de aprendizagem. Alegaram que esses cursos se destinam a realidades diferentes e públicos com perfil socioeconômico distinto. De fato, os alunos do ensino virtual são, em média, mais velhos e trabalham durante o dia. Contudo, se for tomado pelo seu valor de face, esse argumento é uma justificativa para um nivelamento por baixo do ensino superior. Isso explicaria por que o Brasil há muito vem perdendo a corrida educacional, não conseguindo formar o capital humano de que necessita para ganhar mais espaço nos mercados mundiais.