Lula no páreo pressiona centro a definir candidato para eleições de 2022

 Felipe Frazão – Jornal Estadão

BRASÍLIA – A entrada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no páreo eleitoral de 2022 pressionou partidos que tentavam construir uma alternativa de centro contra o presidente Jair Bolsonaro a agilizar a escolha de um candidato ao Palácio do Planalto. Líderes políticos avaliam que a anulação das condenações criminais que impediam Lula de se candidatar a presidente vão precipitar as conversas a partir de agora para alcançar o mais rápido possível o que ainda não conseguiram: definir um nome de baixa rejeição avesso aos extremos e evitar o fracasso dos esforços por uma frente ampla.

A perspectiva de polarização eleitoral entre Lula e Bolsonaro como antagonistas impõe decisões mais rápidas, admitem dirigentes partidários de centro. Eles passaram a ser mais cobrados para apresentar um candidato logo, tanto internamente quanto nas redes sociais, por militantes. Em público, dizem que a redução da campanha presidencial à dicotomia entre lulismo e bolsonarismo reforça a necessidade de apresentarem uma terceira via.

Um cacique do DEM disse, reservadamente, que se os partidos da centro-direita à centro-esquerda não conseguirem uma unificação, salvando a frente ampla, a pulverização praticamente os deixa de fora do segundo turno. A disputa viraria, nas palavras desse dirigente, uma “guerra de rejeições”. Para evitar esse cenário, pretendem escolher quem for capaz de aglutinar a maior parte das forças políticas em diálogo.

Na última terça-feira, dia 9, o PSDB marcou a realização de prévias nacionais para escolher um pré-candidato ao Planalto, com até o momento dois nomes cotados: os governadores João Doria, de São Paulo, e Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul. Sem condições de impor seu nome e se ver aclamado presidenciável tucano, Doria disse apoiar as prévias. Elas foram agendadas para 17 de outubro, com uma antecipação de quase um ano em relação às eleições de 2022. O processo interno é inédito para uma candidatura presidencial e nunca foi realizado com tanta antecedência. Doria já disputou e venceu prévias locais para a prefeitura e o governo de São Paulo.

O apresentador da TV Globo Luciano Huck, ainda sem partido, também se movimenta. Ele marcou novas conversas com dirigentes partidários para discutir o cenário agora alterado com Lula. Huck deve voltar a conversar nos próximos dias com ACM Neto, presidente nacional do DEM. Em sua única manifestação pública sobre o julgamento favorável ao petista no Supremo Tribunal Federal, Huck afirmou que “figurinha repetida não completa álbum”, numa indireta que procura lançar dúvidas sobre a aderência popular de uma nova candidatura de Lula. A publicação no Twitter foi interpretada por interlocutores como um sinal de que deseja se manter como opção.

Sérgio Moro, ex-juiz da Operação Lava Jato e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, tem se distanciado cada vez mais de uma candidatura presidencial. Na iniciativa privada, não quis comentar acerca dos recursos vencidos por Lula. Mantém apoio reduzido no Congresso, como setores do Podemos, mas ainda é popular e soma a simpatia de movimentos anticorrupção e de militares das Forças Armadas, principalmente aqueles desiludidos com Bolsonaro.

Moro perdeu fôlego político ao sair do governo Bolsonaro em litígio com o presidente, a quem acusou de interferir em órgãos como a Polícia Federal, e desgastou-se com a revelação de mensagens trocadas com procuradores da Lava Jato, hackeadas e apreendidas na Operação Spoofing. Agora, o STF pode chamuscar ainda mais Moro, com o julgamento de sua suspeição nos casos de Lula. O placar está empatado, e o voto decisivo será do ministro Kassio Nunes Marques, indicado à Corte por Bolsonaro. Marques interrompeu o julgamento para analisar o processo nesta terça-feira. O pedido de “vista” não tem prazo para terminar.

Partidos de esquerda, de centro e de direita conversavam na tentativa de formar uma frente ampla que simbolizasse o contraponto a Bolsonaro, papel que deverá agora ser personificado por Lula. Setores majoritários do PT resistiam em aderir à ideia da frente, abrindo mão de impor um nome próprio como cabeça de chapa. Com o restabelecimento dos direitos políticos do ex-presidente, dirigentes partidários avaliam que ele conseguirá galvanizar apoios à esquerda e reduzir espaço para nomes do mesmo campo político, como Guilherme Boulos, do PSOL, e o governador do Maranhão, Flávio Dino, do PCdoB. Mesmo sufocado no espectro de esquerda, o ex-ministro e ex-governador do Ceará Ciro Gomes, do PDT, promete manter a candidatura, depois de ficar em terceiro lugar em 2018.

Fazem parte das conversas da frente ampla o DEM, que testa a popularidade do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, o PSB, o Podemos, o PDT, o Cidadania, o PV e a Rede Sustentabilidade. Embora ainda não participe ativamente das conversas, o PSD é visto como um partido com chances de integrar a frente, apesar de fazer parte do bloco do Centrão e estar mais próximo a Bolsonaro.

Partidos envolvidos na frente ampla querem evitar ações precipitadas. Ecos da eleição interna na Câmara ainda fragilizam a continuidade das conversas com o MDB, o mais provável destino do ex-presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ).

E foi Maia quem iniciou o movimento em direção a uma possível frente ampla com a participação de Lula. O deputado disse que ninguém precisa gostar do petista para entender a diferença entre ele e Bolsonaro. “Um tem visão de país; o outro só enxerga o próprio umbigo”, escreveu ele. A postagem não foi à toa: representa a tentativa de uma ala do centro de atrair o PT para a campanha de 2022.

Questionado ontem sobre o elogio do ex-presidente da Câmara, que participou das articulações para o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, Lula afirmou estar aberto a conversas.

Maia tem dito que o calendário ideal do campo de centro é chegar a um nome até o fim deste ano, mas ninguém garante que ele seja cumprido. A recente implosão da aliança na Câmara, com traições no DEM, no PSDB, no PSB e no PDT, esfriou os diálogos, sobretudo porque o presidente nacional do MDB, deputado Baleia Rossi (SP), foi duramente derrotado.

Apesar disso, Baleia diz que a viabilidade de Lula não altera os esforços da frente ampla e que o MDB quer fazer parte da escolha “sem agonia”. “Não muda. Acho que avança. Mas avança sem agonia. Não adianta a gente lançar um nome sem conversa. E a conversa tem de começar ainda dentro dos partidos”, afirmou Baleia ao Estadão. “No MDB, vou iniciar uma série de conversas virtuais específicas sobre o tema. Vou ouvir todos os parlamentares, governadores e presidentes de diretórios”, completou. “O MDB é o partido de centro, e queremos um caminho para 2022 fora dos extremos.”

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By valeon