Dinheiro público
Por
Luan Sperandio, especial para a Gazeta do Povo

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Brasil gasta o equivalente a US$ 789 milhões de dólares com o Fundo Eleitoral. Os EUA gastam apenas US$ 19 milhões| Foto: BigStock

O Brasil é o país com o maior gasto anual de dinheiro público com campanhas eleitorais e partidos em um ranking que considera 26 países. O levantamento foi realizado pelo Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada) e considera o orçamento dos fundos eleitoral e partidário.

A discussão sobre o financiamento público de partidos e eleições voltou à tona após a aprovação pelo Congresso da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), que aumentou o fundo eleitoral para R$ 5,7 bilhões — quase o triplo das eleições anteriores.

Para valer, o fundo eleitoral de R$ 5,7 bilhões ainda depende de sanção presidencial da LDO. Após a alta hospitalar, neste domingo (18), o presidente Jair Bolsonaro sinalizou que pode vetar o dispositivo que trata do fundão.

“Eu sigo a minha consciência, sigo a economia, e a gente vai buscar dar um bom final pra isso tudo aí. Afinal de contas, eu já antecipo: seis bilhões para fundo eleitoral? Pelo amor de Deus”, declarou Bolsonaro.

O presidente ainda afirmou que toda a população é prejudicada com esse valor destinado às campanhas eleitorais e que “o bom parlamentar não precisa de dinheiro para fazer campanha”.

Naturalmente, o sistema de financiamento de campanha é uma questão chave em todo sistema eleitoral, e as eleições têm um custo, os partidos e os candidatos precisam de recursos para financiar suas campanhas e divulgar suas ideias. A questão é, como fazer isso?

Cada país admite um modelo diferente. Não há um modelo único ou, necessariamente, um modelo melhor ou mais correto a se adotar e se seguir no mundo. Cada país tem suas peculiaridades, tamanho de população, sistema eleitoral, como ele é disputado, se é uma eleição distrital, representativo, se a lista é aberta ou fechada, da quantidade de partidos. “Há tantas variáveis em jogo que é difícil prescrever um modelo que é o melhor a ser adotado em um determinado país”, diz o cientista político e professor do Ibmec Bruno Carazza. .

Ele defende que não se pode analisar a questão do financiamento público sem considerar outras variáveis do jogo eleitoral. “Muitos fatores tornam as campanhas no Brasil caras. Antes de discutir o montante total, precisamos ter em mente as regras atuais”, explica.

Confira abaixo como funcionam as regras eleitorais e o financiamento público ao redor do mundo:

Brasil
Doação de pessoa física: As pessoas físicas podem contribuir com até 10% de sua renda anual.

Doação de empresas a candidatos: Todas as doações de pessoas jurídicas são consideradas ilegais.

Há proibição de doações de empresas com contratos governamentais a partidos políticos e a candidatos? Todas as doações de pessoas jurídicas são consideradas ilegais.

Existem disposições para o acesso gratuito ou subsidiado aos meios de comunicação para os partidos políticos? Os partidos têm livre acesso à mídia (rádio e TV) para fins de campanha nas eleições.

Quais critérios determinam a alocação de acesso gratuito ou subsidiado à mídia para partidos políticos? Um terço do tempo distribuído igualmente; II – dois terços, distribuídos proporcionalmente ao número de representantes na Câmara dos Deputados

Existem disposições para outras vantagens financeiras para encorajar a igualdade de gênero nos partidos políticos? Há previsão de parcela dos recursos de fundo eleitoral ser destinada à mulheres e negros.

Valor total do fundo eleitoral: US$ 789 milhões (Equivalente a mais de R$ 4 bilhões)

Alemanha
Doação de pessoa física: Não há limitações.

Doação de empresas a candidatos: Permitido, não há vedações.

Há proibição de doações de empresas com contratos governamentais a partidos políticos e a candidatos? Não.

Existem disposições para o acesso gratuito ou subsidiado aos meios de comunicação para os partidos políticos? Não .

Que critérios determinam a alocação de acesso gratuito ou subsidiado à mídia para partidos políticos? Não existem disposições explícitas que exijam o acesso gratuito ou subsidiado aos meios de comunicação para os candidatos.

Existem disposições para outras vantagens financeiras para encorajar a igualdade de gênero nos partidos políticos? Não.

Valor total do fundo eleitoral: US$ 201 milhões

Estados Unidos
Doação de pessoa física: Os limites variam de acordo com o destinatário da doação. Há o limite de US$ 2.800 de doação para o comitê de candidatos por eleição, de US$ 10 mil por ano para comitê do partido estadual, distrital ou local, e de US$ 35,5 mil por ano para o comitê do partido nacional.

Doação de empresas a candidatos: Pessoas jurídicas não podem fazer contribuições diretas a partidos e candidatos federais, mas podem fazer contribuições por meio de um PAC (political action committee, ou Comitê de Ação Política), que se trata de uma organização que pode contribuir a outros comitês de candidaturas.

Há proibição de doações de empresas com contratos governamentais a partidos políticos e a candidatos? É proibido para qualquer pessoa que celebre qualquer contrato governamental ou agência estatal.

Existem disposições para o acesso gratuito ou subsidiado aos meios de comunicação para os partidos políticos? Não.

Que critérios determinam a alocação de acesso gratuito ou subsidiado à mídia para partidos políticos? Não está previsto financiamento público indireto sob a forma de tempo de antena gratuito ou utilização de instalações por partidos ou candidatos.

Existem disposições para outras vantagens financeiras para encorajar a igualdade de gênero nos partidos políticos? Não.

Valor total do fundo eleitoral: US$ 19 milhões.

Argentina
Doação de pessoa física: Os partidos políticos não podem receber da mesma pessoa física ou jurídica um valor superior a determinado patamar, que é relacionado com o total de eleitores locais.

Doação de empresas para candidatos: Só é permitida a doação para partidos.

Há proibição de doações de empresas com contratos governamentais a partidos políticos e a candidatos? Não há restrição.

Existem disposições para o acesso gratuito ou subsidiado aos meios de comunicação para os partidos políticos? Os partidos têm livre acesso à mídia (rádio e TV) para fins de campanha nas eleições, mas estão proibidos de comprar tempo adicional e o conteúdo precisa ser pré-aprovado pelo Estado.

Que critérios determinam a alocação de acesso gratuito ou subsidiado à mídia para partidos políticos? 50% do acesso à mídia é distribuído igualmente entre todos os partidos concorrentes e 50% distribuído proporcionalmente ao número de votos obtidos na eleição anterior.

Existem disposições para outras vantagens financeiras para encorajar a igualdade de gênero nos partidos políticos? Pelo menos 30% dos fundos destinados à formação política devem ser usados ​​para a formação, promoção e desenvolvimento de habilidades de liderança política de mulheres membros do partido político.

Valor total do fundo eleitoral: US$ 12 milhões.

Chile
Doação de pessoa física: Os partidos políticos não podem receber da mesma pessoa física ou jurídica um valor superior a determinado patamar, que é relacionado com o total de eleitores locais.

Doação de empresas a candidatos: Não há restrições.

Há proibição de doações de empresas com contratos governamentais a partidos políticos e a candidatos? É vetado.

Existem disposições para o acesso gratuito ou subsidiado aos meios de comunicação para os partidos políticos? Sim, em rádio e TV, observadas restrições, como período temporal.

Que critérios determinam a alocação de acesso gratuito ou subsidiado à mídia para partidos políticos? Proporcional ao número de votos obtidos na eleição anterior.

Existem disposições para outras vantagens financeiras para encorajar a igualdade de gênero nos partidos políticos? Partidos obrigatoriamente precisam destinar parte dos recursos para implementar programas e desenvolver atividades para promover a inclusão e a participação das mulheres na política.

Valor total do fundo eleitoral: US$ 23 milhões.

Portugal
Doação de pessoa física: Limitadas anualmente a 25 vezes o valor do salário mínimo por doador.

Doação de empresas a candidatos: É proibido.

Há proibição de doações de empresas com contratos governamentais a partidos políticos e a candidatos? É vetado.

Existem disposições para o acesso gratuito ou subsidiado aos meios de comunicação para os partidos políticos? Há isenção tributária para a veiculação em canais oficiais.

Quais os critérios determinam a alocação de acesso gratuito ou subsidiado à mídia para partidos políticos? Há isenção tributária para a veiculação em canais oficiais.

Existem disposições para outras vantagens financeiras para encorajar a igualdade de gênero nos partidos políticos? Não.

Valor total do fundo eleitoral: US$ 21 milhões

Japão
Doação de pessoa física: Limitadas anualmente a 25 vezes o valor do salário mínimo por doador.

Doação de empresas a candidatos: São permitidas para partidos e ao longo de campanha eleitoral para candidatos.

Há proibição de doações de empresas com contratos governamentais a partidos políticos e a candidatos? Permitidas para partidos e organização de fundos de atividade política.

Existem disposições para o acesso gratuito ou subsidiado aos meios de comunicação para os partidos políticos? Há regras bem específicas de acordo com casos estabelecidos pela legislação.

Quais critérios determinam a alocação de acesso gratuito ou subsidiado à mídia para partidos políticos? Varia de acordo com a disputa de cargo. Para eleições legislativas, por exemplo, os candidatos podem anunciar no jornal cinco vezes ao longo da campanha eleitoral. As propagandas dos partidos políticos possuem número máximo de linhas de jornais, a depender do número de candidatos notificados.

Existem disposições para outras vantagens financeiras para encorajar a igualdade de gênero nos partidos políticos? Não.

Valor total do fundo eleitoral: US$ 300 milhões

Mudanças das regras eleitorais no Brasil 
Há eventos chave para se compreender o financiamento público de campanhas no Brasil.

Antes de 1994 havia a proibição de doação eleitoral por parte de empresas, mas diante do escândalo do PC Farias e dos anões do congresso, concluiu-se que frequentemente havia chances de caixa 2, então era melhor deixar explícito. Após isso, remodelou-se o fundo partidário e permitiu-se as doações empresariais, algo que durou por duas décadas.

“Mas, diante da Operação Lava Jato, ficou explícito que as empresas influenciavam o jogo político de forma desproporcional, então o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou a regra inconstitucional. Diante disso, houve uma resposta legislativa: a criação do fundo eleitoral para financiar as campanhas”, diz Bruno Carazza.

“Após isso, migramos de um modelo em que 70% vinha de grandes empresas, para um modelo que 70% vem de dinheiro público, composto pelo fundo partidário e eleitoral”, complementa.

Ele analisa que, via de regra, as eleições no Brasil são caras porque são disputadas em territórios muito grandes, há muitos partidos sem qualquer programa ideológico bem definido e muitos candidatos concorrendo.

Carazza aponta que uma forma de baratear o custo seria a adoção do voto distrital, que, inclusive, é uma das convicções da Gazeta do Povo, e aproxima o eleitor do candidato.

“No atual sistema, se eu sou um candidato, para eu me tornar competitivo, preciso fazer campanha em uma área muito grande, a partir de um partido que é uma ‘sopa de letrinhas’, o que não me ajuda a dizer nada para o eleitorado. E como há muitos candidatos, preciso gastar muito para me diferenciar dos demais e ser competitivo”, explica Carazza.

Ou seja, o sistema eleitoral brasileiro atual é desenhado para depender de muito dinheiro.

Judicialização do fundão
Sete parlamentares já entraram com ação no STF para tentar anular o aumento do fundo eleitoral: Adriana Ventura (Novo-SP), Daniel Coelho (Cidadania-PE), Felipe Rigoni (PSB-ES), Tabata Amaral (PDT-SP), Tiago Mitraud (Novo-MG) e Vinicius Poit (Novo-SP), além do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). Eles argumentam que a forma com que o reajuste no fundo eleitoral foi inserido na votação não seguiu o que determina a lei, uma vez que “não houve atendimento a um prazo razoável de deliberação quanto a uma mudança tão impactante”.

Além disso, de acordo com Eduardo Ribeiro, presidente do Novo, o partido “já se prepara para acionar o STF caso o presidente sancione o aumento do fundão”.

Novo tenta devolver os valores do financiamento público
João Amoedo, ex-presidente do Partido Novo, que tem como uma das principais bandeiras o fim do fundo eleitoral, defende o sistema americano. “É interessante, pois apesar de existir o financiamento público, há diversas regras que limitam a forma de como devem ser gastos esses recursos e os candidatos optam pelo financiamento privado”, explica. Ele ainda defende como alternativa a adoção do sistema suíço. “Apesar das óbvias diferenças para o Brasil, o sistema de financiamento privado tem funcionado muito bem. O país tem uma das democracias mais sólidas do mundo, sem gastar dinheiro público com campanhas”, defende.

O Novo tem acumulado ano após ano os valores do fundo partidário, em montante que hoje já chega a R$ 70 milhões. O atual presidente do Novo, Eduardo Ribeiro, afirma que o partido tenta, desde o registro como partido político, que ocorreu há cinco anos, devolver o dinheiro ao Tesouro Nacional. “Já fizemos diversas consultas ao Tribunal Superior Eleitoral nesse período e não há um mecanismo contábil que possibilite isso. Protocolamos um projeto de lei no início de 2019 para permitir a devolução, mas a resistência dos outros partidos é gigantesca”, diz.

Ele explica que, em relação ao Fundo Eleitoral, o partido sempre devolveu todos os recursos recebidos. “Fizemos isso em 2018, na primeira eleição que ele foi válido, e em 2020. E faremos novamente em 2022″, promete.

Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/ideias/brasil-gasta-mais-com-o-fundo-eleitoral-que-os-eua-saiba-como-funciona-em-outros-paises/
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By valeon

7 thoughts on “Brasil gasta mais com o Fundo Eleitoral que os EUA. Saiba como funciona em outros países”
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