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Lúcio Vaz – Gazeta do Povo

O mandato de quatro meses do deputado Leonardo Gadelha (PSC-PB) custou R$ 350 mil.| Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O pagamento de auxílio mudança a deputados federais que assumiram o mandato durante a pandemia da Covid-19 custou R$ 911 mil aos cofres públicos. O valor do benefício – R$ 33,7 mil – representa R$ 135 “auxílios emergenciais”, pago a famílias em situação de miséria absoluta. Mas o fato é que não há mudança. A ajuda de custo dada aos deputados é, na verdade, um salário extra. E os suplentes ainda fizeram despesas com a divulgação dos breves mandato, consultorias, aluguel de carrões e até de aeronaves.

De março de 2020 até agosto deste ano, pelo menos 27 deputados foram contemplados com o auxílio mudança. Dez deles assumiram o mandato definitivamente, em decorrência de renúncia ou morte dos titulares, mas 17 estiveram ou ainda estão de passagem pela Câmara em mini mandatos de quatro meses, enquanto os titulares tiram licença para tratar de assuntos particulares ou assumir cargos de secretários estaduais.

O detalhe curioso é que os deputados não precisam fazer mudança porque moram em hotéis ou em apartamentos funcionais mobiliados, com troca de móveis constante e uma reforma estrutural que já dura 12 anos, ao custo de R$ 220 milhões, em valores atualizados. E não faria sentido fazer uma mudança para ficar apenas quatro meses em Brasília.


Quanto custa a mordomia
Contando com os salários e mais penduricalhos como auxílio-moradia, auxílio mudança e 13º salário, um desses breves deputados chega a receber R$ 185 mil em quatro meses. O 13º proporcional, no valor de R$ 8,4 mil, supera o teto do INSS – R$ 6,4 mil. Mas não são apenas esses os gastos gerados pelos minis mandatos. Tem ainda a cota para o exercício do mandato, o “cotão”, que paga passagens aéreas, divulgação, consultoria, combustível e até fretamento de aeronave. A despesa total alcança R$ 350 mil por deputado.

O deputado Leonardo Gadelha (PSC-PB), por exemplo, assumiu o mandato de 31 março a 7 de agosto deste ano, na vaga de Ruy Carneiro (PSDB). E chegou alugando dois veículos, um Nissan Sentra e um Jeep Renegade, o que gerou uma despesa de R$ 32 mil. Mas ele torrou dinheiro mesmo com divulgação parlamentar – um total de R$ 107 mil, numa média mensal de R$ 27 mil. Investiu muito nas redes sociais, mas também distribuiu verba para a divulgação do seu mandato em 13 veículos locais – o jabá institucionalizado. Gadelha usou R$ 164 mil do “cotão” e ganhou R$ 185 mil de salários, incluindo o 13º proporcional.

Odorico Monteiro (PSB-CE) exerceu o mandato de deputado de 16 de abril a 12 de agosto. Ele recebeu R$ 184 mil entre salários e penduricalhos, incluindo aquele 13º, e gastou mais R$ 132 mil do “cotão”, sendo R$ 20 mil com divulgação do breve mandato, R$ 34 mil com o aluguel de carros e R$ 38 mil com consultorias sobre projetos em andamento na Câmara. A conta para o contribuinte fechou em R$ 316 mil. Os veículos alugados eram um Toyota Corolla e um Virtus.


Mandato de 42 dias
Rafafá (PSDB-PB) assumiu a vaga de Pedro Cunha Lima (PSDB) durante três meses e meio, a partir de abril deste ano. Os salários, auxílios e 13º somaram R$ 179 mil. A verba para divulgação do mandato chegou a R$ 49 mil, com divulgação nas redes sociais. Ele também gastou R$ 50 mil com consultorias, sendo R$ 40 mil por serviços contratados em julho – último mês no cargo. A nota fiscal não informa o motivo de contratação tão urgente.

O mandato do deputado Rafafá (PSDB-PB) durou três meses e meio/ Pablo Valarares/Câmara dos Deputados
A deputada Norma Pereira (PSDB-SC) exerceu o mandato por 42 dias, de 31 de março a 11 de maio deste ano, no lugar de Carmen Zanotto (Cidadania), que assumiu uma Secretaria Estadual. Norma recebeu salário integral em abril e proporcional em maio (R$11,2 mil), mais o auxílio mudança. Ao todo, com os penduricalhos, ganhou R$ 87 mil. Gastou, ainda, mais 17 mil do “cotão”, sendo R$ 6 mil pelo aluguel de uma Sportage.

Danilo Forte (PSDB-CE) assumiu o mandato como suplente em junho de 2020, permanecendo no cargo por quatro meses. Em dezembro, foi efetivado, com a renúncia de Roberto Pessoa (PSDB). Mas não há registro de que tenha recebido o auxílio-mudança. Por outro lado, Forte usou fartamente o “cotão” enquanto suplente, em 2020, gastando R$ 145 mil em quatro meses. Pagou R$ 7,8 mil pelo aluguel de uma Trailblazer durante três meses. No quarto, fretou uma aeronave, por R$ 12 mil, para se deslocar até Juazeiro.

Após assumir o mandato, torrou ainda mais a verba para o exercício do mandato. Em nove meses, gastou R$ 318 mil. Em agosto, fretou um helicóptero Esquilo para fazer sobrevoos em Itapajé, Pecem e Taíba, no dia 5, pagando R$ 14 mil. Dia 27, gastou mais R$ 10 mil para fazer sobrevoos em Itapajé. Tudo por conta do contribuinte.


Gastança já foi maior
Resta um consolo ao pagador de impostos: a gastança com o auxílio mudança já foi bem maior. A Câmara chegou a pagar o benefício para deputado que ficou apenas um dia no cargo. Em 2009, a Câmara passou a ser mais rígida, em termos: exigiu o mínimo de 30 dias de mandato para pagar a “ajuda” integral. Em 2014, a ajuda virou oficialmente “auxílio-mudança”, paga no início e no final da legislatura, de quatro anos.

O Decreto Legislativo 276/2014 estabelece que é devida aos membros do Congresso Nacional, no início e no final do mandato, ajuda de custo equivalente ao valor do subsídio, “destinada a compensar as despesas com mudança e transporte”. O decreto legislativo é aprovado pela Câmara e pelo Senado e não vai à sanção presidencial. O Decreto 276/2014 foi promulgado pelo então presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL), em 18 de dezembro daquele ano.

Pouco antes de deixar o mandato, o então presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) aprovou Ato da Mesa impondo mais uma exigência: vetou o pagamento da ajuda de custo de término do mandato para deputados que não cumpram o mínimo de 180 dias no cargo. Quando presidente, porém, pagou o auxílio até para quem ficou apenas 1 mês e pouco no cargo.

O benefício foi criado há 70 anos, com o nome de “ajuda de custo”, para compensar as despesas de transporte. Em 1995, um decreto legislativo determinou o pagamento da ajuda no início e no final do ano legislativo (duas vezes por ano) e também nas convocações extraordinárias do Congresso Nacional. Nesses casos, eram pagas mais duas ajudas, no início e no final do mês de cada convocação. Quando havia convocação em janeiro e julho, os deputados recebiam até seis auxílios por ano.

Levantamento feito pelo blog, com dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação, mostrou que a mordomia já custou R$ 31 milhões em 20 anos. Pelo menos 28 suplentes receberam a “ajuda de custo” após ficarem até 30 dias no cargo.


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