1. Economia 

Com sinais dados pelo mercado, senadores dizem que a ideia é restringir o uso da folga de R$ 91,6 bilhões aprovada na Câmara

Adriana Fernandes, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender as emendas de relator reforçou a posição do Senado em dificultar o caminho para a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios, aprovada na Câmara em segundo turno na terça-feira, 9. Mas os sinais dados pelo mercado financeiro de que a PEC é melhor solução para bancar o novo programa social do governo do que o “plano B” de prorrogação do auxílio emergencial também estão sendo ouvidos pelos senadores.

Os preços dos ativos, como juros, dólar Bolsa, reagiram positivamente à votação em segundo turno com a aposta de que a PEC é o menor dos males para as contas públicas. Representantes do mercado têm alimentado os senadores com informações de que o risco para as contas públicas pode ser maior sem a PEC.

Segundo apurou o Estadão, os senadores pretendem mudar o texto para restringir o uso da folga de R$ 91,6 bilhões aberta com a PEC em ano eleitoral via redução das emendas de relator, base do chamado orçamento secreto, que foi colocado em xeque pelo resultado do julgamento do STF. PUBLICIDADE

Senado
Plenário do Senado nesta terça-feira. Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado – 9/11/2021

Posicionamento

O PT fechou posição contrária à PEC e os senadores de partidos do centro estão divididos – há alguns sinalizando ser contra a matéria. A articulação ganhou força com a criação da Frente Parlamentar de Defesa da Responsabilidade Fiscal, liderada pelos senadores Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) Alessandro Vieira (Cidadania-SE).

Líder do MDB, a maior bancada no Senado, Eduardo Braga (AM), admite que a tramitação na Casa não será fácil, mas apoia a aprovação da PEC com mudanças para torná-la mais restritiva, com a redução do espaço para mais gastos. “Ouvi de uma pessoa do mercado muito influente. É melhor um fim horroroso do que um horror sem fim”, argumentou . Ele diz acreditar que a PEC será votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na próxima semana, com votação no mesmo dia no plenário.

O senador Alessandro Vieira, que é um dos autores da ação no STF que questiona o orçamento secreto, a mobilização é para rejeitar a PEC. “Ela é desnecessária. Ela fragiliza o regime fiscal”, critica.

STF

Para a senadora Simone Tebet (MDB-MS), o Senado não vai aprovar a PEC do jeito que chegar da Câmara. “Ainda mais agora com o placar do STF. Vamos repor as coisas nos devidos lugares, até porque como subsídio temos a decisão dos ministros do Supremo”, afirma. Tebet diz que há saída para bancar o Auxílio Brasil e planos B e C como alternativas.

Segundo o senador Oriovisto, a criação da frente mostra que há número suficiente de senadores que vai atuar contra projetos que atentem contra o teto de gastos. “O primeiro teste vai ser essa PEC dos precatórios. Vamos nos colocar contra.”

PERGUNTAS E RESPOSTAS

Por que a PEC dos precatórios é tão polêmica, já que o dinheiro seria usado para o Auxílio Brasil? 

Pela forma como o governo conduziu a proposta. Em resumo, o texto faz duas mudanças para abrir espaço no Orçamento de 2022, ano de eleições, de R$ 91,6 bilhões: adia o pagamento de precatórios (dívidas do governo já reconhecidas pela Justiça) e muda a correção do teto de gastos, a regra que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação. Não há em nenhuma parte da PEC os detalhes do novo programa social, nem o valor do benefício, nem quais os critérios para as famílias serem contempladas. A proposta tem só o objetivo abrir o espaço no Orçamento.

Quais são as principais críticas à PEC?

Técnicos alertam que a folga também será usada para turbinar as emendas parlamentares. Congressistas falam em um piso de R$ 16 bilhões para as emendas de relator, que são direcionadas aos redutos eleitorais de aliados do governo e criticadas pela falta de transparência. 

Com a proposta haverá uma mudança no teto de gastos. O que ela pode acarretar?

Hoje, a fórmula para corrigir o teto de gastos considera a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulada em 12 meses até junho do ano anterior à vigência do Orçamento. A escolha desse período se justifica porque é o dado disponível nos meses de agosto, quando o governo precisa enviar ao Congresso o projeto de Orçamento do ano seguinte. Com a mudança, o IPCA usado na correção do teto passa a ser o índice acumulado entre janeiro e dezembro. Segundo os técnicos do Congresso, a alteração é casuística, pois, de 2023 em diante, não há qualquer garantia de que o cálculo de janeiro a dezembro seja mais vantajoso. 

Qual será a mudança na quitação dos precatórios?

Pelo texto, o limite proposto é o montante pago em precatórios em 2016, ano da aprovação do teto de gastos, corrigido pela inflação. O adiamento dessas dívidas afeta principalmente grandes empresas como Petrobras, bancos públicos e privados e fundos de investimento que adquirem os direitos de cobrar esses débitos.

É possível criar um novo programa social sem a PEC dos precatórios?

Sim. Especialistas já deram várias sugestões. É possível contabilizar o precatório do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) fora do teto, cortar despesas da máquina pública e direcionar parte das emendas para o gasto social. Com essas medidas, seria possível conseguir espaço de R$ 35 bilhões, o que dobraria o orçamento do Bolsa Família em 2022.

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