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Guido Orgis – Gazeta do Povo

| Foto: ATILA ALBERTI/TRIBUNA DO PARANA

O presidente Jair Bolsonaro vem há alguns meses colocando pressão para que os estados aliviem o imposto sobre os combustíveis, em especial a gasolina. O ICMS é o principal tributo estadual e sua arrecadação é concentrada em poucos setores, sendo os principais os de energia elétrica e combustíveis.

No último balão de ensaio sobre o tema, Bolsonaro disse que proporia uma PEC para zerar os impostos federais e permitir a redução dos tributos estaduais sobre os combustíveis. Também se especulava que poderia ser criado um fundo com dinheiro público para equilibrar (na prática, manter baixos) os preços nesse mercado.

Nem o fundo, nem zerar os impostos eram boas ideias e, parece que isso ficou mais claro dentro do governo com a posição da equipe econômica contra a PEC. Ainda há a possibilidade de o governo federal reduzir os impostos sobre o diesel, mas não há muitos detalhes sobre o caminho para isso.

A reação dos estados à proposta da PEC foi congelar o ICMS por mais 60 dias e protestar contra a intromissão. É pouco provável que esse tempo seja suficiente para os preços nas refinarias esfriarem. Nem o dólar, nem o petróleo devem cair no curto prazo. Pode ser que os governadores decidam empurrar a questão com a barriga indefinidamente.

Não há dúvida de que o ICMS sobre a gasolina, em especial, é muito alto. O imposto sobre o consumo, em geral, é elevado no Brasil – fora o emaranhado legal e a sobreposição tributária com entes diferentes cobrando impostos com características semelhantes. E, além disso, se concentra em setores nos quais os estados conseguem cobrá-lo com mais facilidade.

Um exemplo é a energia elétrica. A alíquota média do ICMS sobre a energia estava em 22,8% no país em 2020, segundo a Aneel. É um percentual que vem crescendo – era de 21,1% em 2010 – e que coloca esse insumo básico para qualquer atividade humana entre os mais tributados pelos estados. A alíquota de ICMS sobre a gasolina varia de 25% a 34%, mas o percentual efetivo depende de uma conta mais complexa, já que a cobrança é feita sobre um preço de referência calculado por cada estado.

Essa foi a forma que os estados encontraram para financiar seus gastos nas últimas décadas. Cobrar muito de poucos setores é estratégico: é muito fácil monitorar poucas distribuidoras de energia e combustíveis do que milhares de estabelecimentos comerciais. Essa é a mesma razão que levou à criação da substituição tributária no Brasil, um modelo em que o governo cobra o ICMS na fábrica em cima de preços teóricos de venda.

A Petrobras, sempre acuada pela pressão por preços menores, passou a divulgar valores atualizados dos combustíveis por estado, mostrando o valor na refinaria, os custos de distribuição e os impostos. É algo tão importante para sua reputação que a companhia patrocina o link no Google.

O mais interessante da tabela é quando cruzamos os maiores valores de ICMS com os indicadores de capacidade de pagamento (Capag) feitos pela Secretaria do Tesouro Nacional. Dos 16 estados que estão no gráfico da Petrobras, o maior ICMS está no Rio de Janeiro, R$ 2,32 por litro. Nota Capag: D (é a pior nota na escala de A a D). O Rio, sabe-se, está tentando enrolar o governo federal com uma renegociação de seu plano de recuperação fiscal, no qual ele poderia aumentar os salários do funcionalismo e gastar mais para estimular a economia. Não foram tantos governadores presos por acaso.

O segundo maior ICMS é o de Minas Gerais: R$ 2,08 por litro. Nota Capag: D. Minas tem um histórico longo de problemas fiscais (um calote decretado pelo governador Itamar Franco em 1999 detonou a primeira maxidesvalorização do real). O terceiro é o Rio Grande do Sul, cobrando R$ 1,99 por litro. Nota Capag: D. O quarto é Goiás, com R$ 1,98 por litro e nota C.

Santa Catarina cobra o menor ICMS, R$ 1,45 por litro, e tem nota B (que é considerada uma pontuação boa pelo Tesouro). São Paulo cobra R$ 1,50 por litro e tem nota B. São seguidos por Amazonas (R$ 1,60 por litro e nota B) e Paraná (R$ 1,63 por litro e nota B).

Pode ser que seja coincidência que estados com histórico de má gestão do dinheiro público cobrem mais desse imposto fácil de embolsar. Mas é um indício de que o contribuinte deveria olhar com mais atenção os gastos de seus governadores, presidentes de tribunais e deputados estaduais antes de reclamar do preço na bomba.

Se a governança é um lado importante do problema (quase 90 centavos por litro separam Santa Catarina do Rio de Janeiro), o outro é a concentração do ICMS, que só poderá ser resolvida com uma reforma tributária que reordene a tributação sobre o consumo. A criação de um IVA (imposto por valor agregado) cobrado no estado de consumo e a maior padronização possível de alíquotas é um bom caminho e já está no Congresso.

Alguns governadores poderão dizer que o IVA nesses moldes tira a autonomia dos estados e não está no espírito do federalismo. Esse é o argumento que não vê duas realidades: no Brasil não existe um verdadeiro livre mercado nacional porque o ICMS é usado pelos estados para distorcer decisões de investimento e consumo; e quando os estados erram, a União socorre. Nenhuma das duas coisas é positiva.


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