Relações público-privadas
Por
Wesley Oliveira
Brasília
No Congresso Nacional, lobistas costumam circular com facilidade para tratar de temas de seu interesse com os parlamentares.| Foto: Pedro França/Agência Senado
Incluído na lista de prioridades do governo Bolsonaro no Congresso Nacional em 2022, o projeto de lei que regulamenta a atividade do lobby no Brasil deve contar com apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para ser levado ao plenário ainda neste primeiro semestre. A expectativa, segundo líderes partidários, é de que chegar a um entendimento entre oposição e a base governista para acertar a redação final da proposta. Lobby é o nome dado à atividade de defesa de interesses de empresas e segmentos sociais no poder público.
“Eu defendo que nós deveríamos votar esse projeto para regulamentar de uma vez por todas o lobby no Brasil. Quem defende o interesse de quem, quem é responsável por defender esses interesses. O lobby de funcionários públicos é muito forte, é justo. Mas ele não será maior do que os fatos”, disse Lira.
O projeto de lei em discussão foi apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) em dezembro do ano passado, e traz uma série de regras para empresas e profissionais de relações governamentais – conhecidos como lobistas – que atuam junto aos poderes Legislativo, Executivo, União, estados e prefeituras.
Para o governo, regulamentar o lobby é prioridade por ser uma das exigências para que o Brasil entre na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o “clube de países ricos”. O ingresso do país na OCDE é uma das principais agendas externas do governo Bolsonaro. A entrada na organização daria ao Brasil uma espécie de chancela internacional de país seguro para se investir.
Em tese, a proposta do governo não cria a profissão de lobista, mas estabelece parâmetros e regras para que a atividade seja exercida. De acordo com a proposta, “as medidas visam tornar mais clara a representação privada de interesses, possibilitando, com isso, maior efetividade na repressão às condutas reprováveis”.
“A gente não quis dizer assim: ‘a profissão tem que ter essas características, vai ter algum conselho para regular’. Não. O que a gente está regulando é a atividade. Ou seja, existindo um profissional de lobby, esse profissional passa a ter regras nesse engajamento dele com o público”, disse o ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário.
O que é a atividade de lobby e o que prevê o projeto do governo
O lobby é exercido por grupos de interesse junto a agentes públicos a fim de tentar influenciar a aprovação de projetos ou atender a demandas de um determinado setor ou segmento social. A prática é bastante comum nos órgãos públicos. No Congresso, por exemplo, lobistas costumam circular com facilidade para tratar de temas de seu interesse com os parlamentares.
No início da pandemia, por exemplo, foi creditado ao lobby dos bancos, como a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a mobilização que conseguiu travar o andamento de uma proposta que previa limitar os juros cobrados nos cartões de crédito durante a crise sanitária. A proposta, de autoria do senador Alvaro Dias (Podemos-PR), foi aprovada no Senado ainda em 2020, mas acabou sendo travada na Câmara dos Deputados.
Já no ano passado, a mobilização de integrantes do Ministério Público conseguiu que a Câmara dos Deputados rejeitasse uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pretendia alterar a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Autor da proposta, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), atribuiu a rejeição ao que chamou de “máquina de propaganda” contra a proposta. “Talvez deputados não tenham se sentido encorajados a votar. Foram 11 votos a menos e eu acredito que novas rodadas poderão amadurecer um novo texto capaz de aperfeiçoar o controle do Ministério Público”, disse à época.
De acordo com a senadora Simone Tebet (MDB-MS), a regulamentação da atividade do lobby é importante para fazer justiça com a sociedade civil organizada e para criminalizar a prática ilegítima. “Vamos encarar de frente, até para valorizar os lobbies legítimos”, disse.
Para a Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), a regulamentação vai trazer mais transparência para a atividade. “Com ética e transparência, buscamos regras claras para a atividade de RIG, necessária para dar voz aos cidadãos e instituições sobre suas demandas”.
O projeto de lei do governo prevê normas sobre:
audiências com lobistas, com a obrigação da presença de mais de um agente público no encontro;
divulgação de agenda, o que incluir reuniões virtuais;
proibição de recebimento de presentes e a regulação das hipóteses nas quais podem ser recebidos brindes pelo agente público;
criação de regras para hospitalidade (recebimento de brindes e vantagens) nos casos em que agente público viaja representando o ente público em evento de particulares.
De acordo com o texto, representantes privados podem ser proibidos de participar de audiências, inclusive públicas, por até cinco anos caso descumpram as regras. Já pessoas em cargos públicos, estariam sujeitas a demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade, destituição de cargo ou suspensão e advertência.
“A norma prevê sanção para o servidor público que der informações equivocadas ou que omitir informações. E, para o privado, estamos criando o cadastro desses lobistas ou representantes de interesse que cometam alguma irregularidade. Quem for para esse cadastro vai estar proibido até cinco anos de ter qualquer tipo de possibilidade de representar interesses privados junto a autoridade do governo”, disse Wagner Rosário durante apresentação da proposta.
Texto pode ser relatado por líder do governo na Câmara
A tentativa de regulamentar o lobby já se arrasta há mais de dez anos no Congresso. Proposta do deputado Carlos Zarattini (PT-SP) como o mesmo teor foi protocolada em 2007, mas nunca foi levada ao plenário da Câmara. A expectativa, segundo líderes da Câmara, é discutir a proposta de Zarattini junto com o texto apresentado pelo Palácio do Planalto.
O texto do petista prevê a regulamentação para a atividade de lobby nos poderes Executivo e Legislativo. Além disso, classifica como improbidade administrativa o oferecimento de presentes para autoridades. No entanto, libera que os lobistas façam doações para a campanha de autoridades.
Segundo Zarrattini, foi sugerido por ele que o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), assuma a relatoria do projeto para construir um acordo na Casa. A expectativa é de que uma definição ocorra após o feriado de carnaval, quando o presidente da Câmara, Arthur Lira, pretende discutir no colégio de líderes a retomada presencial das votações. “Se o Arthur Lira me convidar, eu relato. Acho que é importante para o país”, disse Ricardo Barros.
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