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Paulo Uebel – Gazeta do Povo
| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Os países mais desenvolvidos do globo avançam na transformação digital de seus governos para trazer mais eficiência de gastos à máquina pública e melhores e mais acessíveis serviços para os cidadãos. O Brasil segue esse exemplo: somos o sétimo país em maturidade de governo digital entre 198 países do ranking do Banco Mundial; e o primeiro das Américas, à frente até dos Estados Unidos e do Canadá. Porém, se analisarmos todos os entes e Poderes do Brasil, a regra é continuar a criar novos concursos, inchando ainda mais a máquina pública, sem que isso gere, necessariamente, melhores indicadores sociais e melhores serviços aos cidadãos.
Hoje, o Brasil tem 115 concursos com inscrições abertas, reunindo mais de 14,6 mil vagas com salários de até R$ 27,5 mil. Um concurso público significa, no Executivo Federal, um compromisso financeiro para o contribuinte que dura, em média, 59 anos: 28 anos de serviço, 20 anos de aposentadoria e 11 anos de pensão. É uma despesa recorrente alta que deveria ser muito bem avaliada. Infelizmente, ninguém faz uma análise de médio e longo prazos sobre a real necessidade dos concursos públicos. A pressão dos sindicatos e entidades representativas é muito alta.
Em ano eleitoral, a tendência é que os governantes cedam às pressões e autorizem concursos e aumentos salariais. É o que está acontecendo: ao menos 24 governadores darão aumento aos servidores públicos de seus estados, 16 reajustes já foram confirmados e oito ainda tramitam em Assembleias Legislativas. O custo disso será de, ao menos, R$ 28 bilhões a mais aos pagadores de impostos. Novamente, aumento de salário não significa melhoria dos serviços à população.
E é um ciclo vicioso: o Estado tem usado concursos públicos para resolver desafios temporários ou secundários, como acúmulo de processos, atrasos pontuais ou mesmo para atividades de apoio, que deveriam ser enfrentados com transformação digital, contratações temporárias ou terceirização de serviços. Os concursos públicos devem ser reservados para desafios estratégicos de médio e longo prazos, em atividades que são exclusivas do Estado, e que não podem ser delegadas ou terceirizadas.
Segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), um governo digital maduro “é proativo quando antecipa as necessidades das pessoas e responde a elas rapidamente, evitando a necessidade de dados complicados”. O poder público no Brasil precisa investir em tecnologia, no uso e cruzamento de dados, na adoção de inteligência artificial e no uso de machine learning. Antes de focar nisso, não deveria fazer concursos públicos para fazer mais do mesmo.
A Estônia economiza 2% do PIB (Produto Interno Bruto) graças à transformação digital do governo. Por lá, apenas três serviços exigem a presença do cidadão: casamento, divórcio e transferência de imóveis. O Reino Unido integra todos os seus serviços públicos na mesma plataforma, o que evita a burocracia do cidadão ter de abrir vários sites para os serviços que precisa.
Nessa linha, o Brasil criou quatro metas: consolidar 622 domínios do Executivo Federal no portal único gov.br até 2022; integrar todos os estados à Rede Gov.br até 2022; consolidar a oferta dos aplicativos móveis na conta única do governo federal nas lojas até 2020 e ampliar a utilização do login único de acesso gov.br para 1.000 serviços públicos digitais em 2022 – estas duas últimas já atingidas.
Porém, ainda não é suficiente. Não basta que o cidadão tenha acesso a determinados serviços públicos online, é preciso desafogar os órgãos públicos e ter mais facilidade para demitir funcionários em funções já extintas: a obsolescência de funções deve aumentar à medida que se avança na transformação digital.
O governo federal gasta, por ano, R$ 8,3 bilhões com mais de 69 mil funcionários em cargos extintos ou em fase de extinção, como datilógrafos, encadernadores e operadores de Telex. Esses funcionários somam 12% dos funcionários públicos. É muito desperdício!
Apesar de sermos líderes em governança digital, também nos destacamos num ranking nada agradável: o Brasil é o sétimo país do mundo que mais gasta com o funcionalismo, uma conta de 12,9% do PIB. Na União Europeia, os gastos com funcionalismo público ficam, em média, em 9,9% do PIB.
Precisamos desafogar a máquina pública e continuar focando em iniciativas de transformação digital, de melhoria de eficiência e de avaliação de políticas públicas. O Estado brasileiro precisa ser mais digital, enxuto e inteligente, não manual, pesado e ineficiente. A hora de mudar já passou!
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