Investimentos em produção

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Cristina Seciuk – Gazeta do Povo

Navio-plataforma FPSO Carioca no campo de Sépia, no pré-sal da Bacia de Santos: Brasil pode se tornar o quinto maior produtor e exportador de petróleo do mundo até o início da próxima década.| Foto: Agência Petrobras

Com dificuldade para elevar a produção no curto prazo, o Brasil não tem como aproveitar a janela de oportunidade que se abriu para exportadores de petróleo após a invasão russa na Ucrânia. Mas, em razão dos investimentos já feitos e dos programados para os próximos anos, deve aumentar sua produção de petróleo em 78% entre 2022 e 2031 e pode alcançar o posto de quinto maior exportador do mundo.

Em 2021, o Brasil exportou quase 483 milhões de barris, ou 1,3 milhão de barris por dia, o que representa 45,5% da produção nacional, de acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior e da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Foi o segundo maior volume vendido para o exterior, atrás apenas do recorde de 2020 (com mais de 500 milhões de barris exportados), e a maior receita de exportação da história, de US$ 30,6 bilhões, graças à alta dos preços do barril.

As sanções aplicadas ao óleo russo redirecionaram parte da demanda mundial, ainda que com incerteza sobre a continuidade desse movimento. No entanto, especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo avaliam que o Brasil não tem condições de alavancar prontamente a sua produção para patamares superiores ao atual, ficando de fora das movimentações provocadas pelo conflito.

Na avaliação de Rafael Schiozer, professor de finanças da FGV/EAESP, no curto prazo não há chance de avanço substancial no volume extraído.

“Em especial em campos marítimos, como é a produção brasileira, não se pode aumentar [a produção] do dia para a noite. O aumento de produção no Brasil depende de investimentos que vão maturando. Se a Petrobras resolver explorar um campo novo hoje vai demorar no mínimo três ou quatro anos para começar a produzir nele. Tem todo um investimento em plataformas, perfuração de poços”, diz Schiozer.

Por outro lado, avalia o especialista, o aumento na produção no médio prazo é certo, em razão dos investimentos já feitos. Segundo ele, o país tem campos que devem permitir uma escalada nas exportações dentro dos próximos cinco ou dez anos.


A perspectiva também é de que o saldo entre as importações e exportações de petróleo comece a pender mais pesadamente para o lado das vendas ao exterior. “O Brasil é um exportador líquido, mas por margem muito pequena”, aponta Schiozer.

Para Adilson de Oliveira, professor titular do Instituto de Economia da UFRJ, “o Brasil certamente será mais forte como país exportador de petróleo”, com a expectativa já prevista de incremento de mais de um milhão de barris por dia na produção nacional, fruto dos investimentos concretizados ou em desenvolvimento.

Conforme o novo Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE), lançado pelo Ministério de Minas e Energia no início de abril, a produção brasileira de petróleo deve ter incremento médio de 6% ao ano na próxima década, alcançando 5,2 milhões de barris ao dia em 2021, ante 2,9 milhões de barris/dia em 2021.

Ainda de acordo com o MME, são esperados investimentos da ordem de R$ 2,496 bilhões em exploração e produção de petróleo no período. Com essa previsão de aportes, o crescimento deve se manter para além da janela traçada pelo PDE 2031 e a evolução traçada, segundo o ministério, tem potencial para colocar o país na quinta posição entre os maiores produtores de petróleo do mundo em 2031. Hoje, o Brasil ocupa a nona posição, de acordo com dados da British Petroleum, e sobe para a oitava se for considerada apenas a produção de óleo cru.

Na frente do país no ranking de maiores produtores de petróleo em 2020 apareceram Irã (8º), Emirados Árabes (7º), China (6º) e Iraque (5º). Os quatro primeiros na listagem são EUA, Arábia Saudita, Rússia e Canadá.

Guerra não mexe com produção, mas novos mercados seguem no horizonte
Detentora da maior fatia de produção de petróleo e gás natural no país, com cerca de 95% do total, a Petrobras informou à Gazeta do Povo que o conflito no Leste Europeu não alterou sua projeção de produção – com incremento de 20% entre 2022 e 2026 – e que o portfólio de compradores dos petróleos da companhia “permanece similar ao historicamente observado”.

A empresa não respondeu se recebeu demandas formais por parte de novos compradores ou para incrementos em contratos já existentes, mas afirmou que segue “monitorando o mercado, buscando sempre os refinadores que mais valorizam as correntes de pré-sal”, que produzem óleo leve e encarado internacionalmente como de boa qualidade.

Para efeito comparativo, em 2020 a Petrobras vendeu ao exterior 713 mil barris ao dia, o que representou cerca de 30% da sua produção total e 52% das exportações brasileiras naquele ano, quando o país somou 500 milhões de barris exportados, conforme dados gerais do Anuário Estatístico de 2021 da ANP.

Ainda de acordo com a agência reguladora, o principal destino do petróleo brasileiro é o continente asiático, com especial destaque para a China, que aparece isolada no posto de maior compradora de petróleo brasileiro. Em 2020, ela comprou 292 milhões de barris do Brasil, 58,4% do volume total exportado pelo país.

Completam a lista dos cinco maiores importadores de petróleo brasileiro os Estados Unidos (35,9 milhões de barris), Índia (28,9 milhões de barris), Espanha (26,3 milhões de barris) e Portugal (20 milhões de barris).

Segundo a Petrobras, seus principais mercados individuais são EUA, Europa e América Latina, além de países asiáticos como China e Índia.

Em nota à Gazeta do Povo, a Petrobras destacou que o conflito entre Rússia e Ucrânia representa novas fontes de incerteza, somadas a outras variáveis consideradas críticas e que já eram acompanhadas pela companhia, como o comportamento da pandemia de Covid-19 e o nível de investimentos em expansão da produção de petróleo.

“A combinação de todas essas incertezas torna muito difícil para todas as empresas e analistas antecipar o que se pode esperar do mercado de petróleo não só em 2022 como também nos próximos anos”, afirma a petroleira, ao destacar que “ambientes incertos como esse reforçam a necessidade de mantermos a nossa abordagem para a gestão de portfólio que prioriza a preservação de ativos rentáveis e resilientes em diferentes condições de mercado”.


Exportação de petróleo além da Petrobras
Em seu Plano Estratégico, que traça ações para o período 2022-2026, a Petrobras vislumbra a concentração da atividade na produção do petróleo bruto, com foco em ativos de águas profundas e ultraprofundas – caracterizadas pelo custo mais baixo de extração e de menos emissão de carbono – como diferencial competitivo.

O objetivo traçado pela estatal é criticado por Adilson de Oliveira, da UFRJ, por trazer também a opção por desinvestimentos em refinarias.

Para o professor, a medida representa risco à segurança energética do país. “A Petrobras praticamente abandonou os investimentos em refino e nós, um pouco paradoxalmente, vamos ser um grande exportador de petróleo e um grande importador de derivados de petróleo”, diz.

Na avaliação do especialista, a empresa renuncia ao seu próprio mercado – o doméstico – e impõe ao país a “recompra” da produção sob a forma de derivados. “O maior problema não é nem o custo, o problema é a insegurança energética. No Brasil, que é um país totalmente rodoviário, a segurança do abastecimento é fundamental. Imagine o Brasil sem condições de importar diesel: todos os sistemas de transporte de mercadorias ficariam paralisados”, afirma.

Sob outra perspectiva, Schiozer pondera que nem todas as refinarias brasileiras estariam preparadas para beneficiar o óleo de produção nacional. “A questão principal é o tipo de óleo que a gente produz. Parte dele, em especial o óleo da Bacia de Campos (cuja produção já está declinando), é de óleos pesados e as refinarias brasileiras em geral não estão preparadas para refiná-lo. Então, o Brasil manda esse óleo para refinarias principalmente nos Estados Unidos e importa um óleo mais leve, que é adequado às nossas refinarias”, diz o especialista.

O especialista da FGV diz que “o Brasil não é só a Petrobras” e que não se deve erguer barreiras ao investimento estrangeiro no setor. “Tivemos essa política de concentrar o mercado de exploração e produção nas mãos da Petrobras, o que se mostrou ruim. Estamos voltando para um cenário em que as empresas podem vir aqui e investir livremente, isso é benéfico para o Brasil”, afirma, em referência à participações de companhias estrangeiras em leilões de exploração.

“Como exportador, é importante para o Brasil que outras empresas venham para cá, acelerem esse processo de investimentos de exploração e produção no Brasil. É dinheiro que entra aqui e mais produção que sai, como exportação”, completa.


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