Política

Por
Diogo Schelp – Gazeta do Povo

This handout photo taken on May 14, 2020 and received on May 15 from Lula’s press office shows former Brazilian president Luiz Inacio Lula da Silva speaking during an interview with AFP via video link from his home in Sao Bernardo do Campo, Sao Paulo state. – Former president Luiz Inacio Lula da Silva says he fears a “genocide” in Brazil because of fierce opposition to coronavirus containment measures by current President Jair Bolsonaro, whom he said should be impeached. (Photo by Ricardo STUCKERT / PRESS OFFICE OF LUIZ INACIO LULA DA SILVA / AFP) / RESTRICTED TO EDITORIAL USE – MANDATORY CREDIT “AFP PHOTO / PRESS OFFICE OF LUIZ INACIO LULA DA SILVA / RICARDO STUCKERT” – NO MARKETING NO ADVERTISING CAMPAIGNS – DISTRIBUTED AS A SERVICE TO CLIENTS — NO ARCHIVES —

O ex-presidente e pré-candidato Lula| Foto: RICARDO STUCKERT/

A não ser que uma grande surpresa aconteça (pois isso nunca pode ser descartado em se tratando da política brasileira) e a julgar pelas pesquisas que há meses refletem uma estabilidade no quadro eleitoral, o ex-presidente Lula e o presidente Jair Bolsonaro estarão no segundo turno das eleições deste ano.

Algumas atitudes polêmicas recentes dos dois pré-candidatos, que sob certo ângulo podem parecer contraditórias ou prejudiciais a eles próprios, na realidade são calculadas e pensadas já em antecipação ao jogo do segundo turno.

Lula tem o voto seguro de petistas, de uma parcela significativa de eleitores de baixa renda e de cidadãos que elegem até o diabo para não dar a Bolsonaro um segundo mandato.

Bolsonaro conta com uma base de apoiadores que o idolatram e a ele são fieis até o fim do mundo ou apocalipse pandêmico, é aceito como opção menos pior por quem já votou nele e está disposto a fazer isso de novo para evitar o retorno do PT e cada vez mais também ganha adeptos entre favorecidos pelo Auxílio Brasil (o Bolsa Família com outro nome e momentaneamente com valor turbinado).

Tanto Lula quanto Bolsonaro, porém, precisam disputar os votos daqueles que, no primeiro turno, não vão preferir nenhum dos dois e também dos indecisos e daqueles que, por enquanto, declaram voto nulo ou branco.

Uma análise rápida poderia fazer crer que, para isso, Lula precisaria neste momento amenizar o discurso e mostrar-se moderado para atrair o voto do centro.

Em vez disso, aventurou-se no espinhoso debate da liberação do aborto, criticou a classe média, cutucou os militares e sugeriu à sua militância que fosse à casa de parlamentares para constranger suas famílias e pressioná-los por pautas políticas.

Bolsonaro, por sua vez, vem colhendo índices de aprovação crescentes ao seu governo, em grande parte devido também à moderação do seu discurso. Passou um tempo sem falar mal das vacinas contra a covid-19, vem tentando chamar atenção para uma agenda positiva com pegada social e de realização de obras e reduziu confrontos com os outros poderes da República, em especial o Judiciário.

Nos últimos dias, porém, voltou a levantar a voz contra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), manifestando, em comício após motociata realizada na Sexta-feira Santa, sua indignação contra a decisão do WhatsApp de só permitir a criação de comunidades com grande número de pessoas no aplicativo de mensagens após as eleições deste ano. O adiamento só acontecerá no Brasil, enquanto o resto do mundo já desfrutará da funcionalidade.

O anúncio feito pelo WhatsApp foi feito depois de, em fevereiro, a Meta, empresa que detém também o Facebook e o Instagram, se comprometer junto ao TSE em não adotar no Brasil medidas que possam facilitar a difusão de fake news nas eleições.

A criação das comunidades no WhatsApp possibilitaria novamente o disparo em massa de mensagens, recurso muito usado pela campanha de Bolsonaro em 2018.

A indignação de Bolsonaro com uma decisão que é, acima de tudo, uma escolha estratégica de uma empresa privada poderia ser compreendida como um atestado de que ele se valeu e pretende novamente se valer da disseminação de mensagens inorgânicas e inautênticas nas redes sociais, tática que favorece o espraiamento de desinformação e ataques a adversários com notícias falsas.

Suas falas de indignação também reavivam os embates com a Justiça Eleitoral brasileira e com seus principais ministros, que igualmente integram o Supremo Tribunal Federal (TSE).

Mas tanto Lula quanto Bolsonaro têm método em suas atitudes aparentemente polêmicas.

Lula radicaliza o discurso neste momento porque precisa energizar sua militância. Tempo de TV e estratégia digital não bastam. Eleição se ganha com o bloco na rua, e a mobilização da petezada é a maior força do ex-presidente. E é um desafio maior conseguir esse empenho dos militantes quando se acaba de anunciar como vice um ex-adversário político associado ao malvado “neo-liberalismo” e ao “fascismo” tucano.

Bolsonaro se sente de fato prejudicado por uma decisão empresarial que limita sua estratégia de chegar ao celular das tias do zap. Por outro lado, essa limitação vale também para o seu adversário. A regra não é só para ele; petistas também terão mais dificuldade de disseminar fake news. Afinal, apoiadores de Bolsonaro não vivem dizendo que a esquerda também se vale desse expediente?

O que Bolsonaro realmente está explorando com sua indignação contra o acordo entre WhatsApp e o TSE é a narrativa de que há um complô para impedir sua reeleição. O presidente busca, desde já, uma justificativa para a derrota ou — no limite — para uma recusa de aceitar o resultado da eleição.

Lula e Bolsonaro sabem como se comunicar com suas bases. E sentem que é chegada a hora de antecipar o segundo turno. A campanha em si já foi antecipada há muito tempo.


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