Editorial
Por
Gazeta do Povo

Dinheiro / Real – 25-05-2017 – O Real é a moeda corrente oficial da República Federativa do Brasil. A cédula de um real deixou de ser produzida, entretanto continua em circulação alguns exemplares. As demais cédulas de real continuaram sendo produzidas normalmente pela Casa da Moeda. Entre elas, as notas de: 2,5,10,20,50 e 100. Na foto, detalhe de algumas notas de Real.

Fenômeno da inflação é global, embora no caso brasileiro haja alguns fatores específicos que empurram os preços para cima.| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

A economia (com inicial minúscula) é o sistema que utiliza os fatores de produção – recursos naturais, trabalho, capital e iniciativa empresarial – e os coloca em movimento, com o auxílio do conhecimento tecnológico dominado, para produzir, distribuir, circular, consumir e acumular (investimento) bens materiais e serviços. Simplificando, é um sistema de produção de bens e serviços destinados a atender necessidades e desejos da população. Em um regime fundado na liberdade, a economia funciona com o direito de propriedade privada dos meios de produção – o que não exclui a propriedade estatal; ambas convivem e se complementam –, a organização empresarial da produção e o trabalho assalariado, cujas trocas se fazem em mercado livre e em regime de concorrência.

O mercado livre e o processo de trocas se dão com base nos preços dos bens e serviços, expressos em unidades monetárias, no qual a elevação generalizada e contínua de preços recebe o nome de inflação (do verbo inflar, aumentar). O estudo e observação de como funciona esse sistema de produção, circulação, distribuição, consumo e acumulação deu origem à “Ciência Econômica”, ou simplesmente Economia (com inicial maiúscula), e foi construído um corpo teórico de leis, princípios e conceitos, sendo alguns de natureza física e imutáveis, e outros de natureza sociológica e política – portanto, sujeitos a discordâncias entre correntes diferentes de pensamento.

A inflação é um dos assuntos mais complexos e mais difíceis de mensurar e entender, pois ela surge em circunstâncias as mais variadas e o laboratório de que dispõem os cientistas para seu estudo é a nação como um todo e seu movimento em períodos longos

A Ciência Econômica, para fins de estudo, dividiu seu corpo teórico em dois conjuntos. Um, a Macroeconomia, que estuda a economia nacional por meio do modelo dos “agregados macroeconômicos”, como um sistema aberto submetido a vários componentes sociológicos e políticos. O outro conjunto é a Microeconomia, que estuda partes da economia nacional e se dedica, sobretudo, à compreensão do funcionamento de uma empresa como um sistema fechado e, nela, a formação de custos, preços, salários e lucros. Para os economistas ortodoxos, quando ocorre uma elevação generalizada e contínua dos preços, esse movimento é o efeito do que para eles é a inflação: aumento de emissão de dinheiro sem o correspondente aumento na produção nacional. Atualmente, a palavra “inflação” está consolidada como sendo o movimento de aumento dos preços, seja por efeito de fabricação de dinheiro pelo governo ou por outras razões.

Os dois tipos mais comuns de inflação são a inflação de demanda (quando a procura por produtos é maior que a oferta) e a inflação de custos (quanto os preços de oferta dos produtos aumentam em razão do aumento de custos de produção). A inflação é um dos assuntos mais complexos e mais difíceis de mensurar e entender, pois ela surge em circunstâncias as mais variadas e o laboratório de que dispõem os cientistas para seu estudo é a nação como um todo e seu movimento em períodos longos. As ciências sociais padecem da chamada “dificuldade de laboratório”, ou seja, suas teorias dependem de experimentos e observação dos fatos da vida social em períodos longos, durante os quais a realidade social acontece. O Brasil constituiu um dos maiores e complexos casos de inflação alta e longa, tornando-se um laboratório para os estudiosos na tentativa de compreender esse fenômeno econômico e social do qual país nenhum escapa.


Somente nos últimos 60 anos, o Brasil experimentou vários surtos inflacionários e fez tentativas diversas – algumas heterodoxas – para enfrentar o mal. Nesse período, o processo inflacionário começou em 1963, com inflação de 80% no ano, subiu para 92% em 1964, e deu uma trégua quando a dupla Roberto Campos e Otávio Gouveia de Bulhões (ministros do Planejamento e da Fazenda respectivamente) adotou um severo plano anti-inflacionário. Porém, após a grave crise internacional do petróleo em 1973-1974, a inflação retornou aos 46,3% em 1976, seguiu crescendo até os 77% em 1979 e não mais parou. Quando José Sarney assumiu a Presidência da República, em 1985, a inflação chegou ao patamar de 242,2% em seu primeiro ano de governo e nunca mais parou de crescer, a não ser por períodos curtos sequentes à implantação de planos econômicos que duravam alguns meses e depois explodiam.

Em 1986, a inflação caiu para 79,6% no ano, porém, sem mudanças estruturais capazes de realmente acabar com o processo inflacionário; já em 1988 o país atingia a assustadora hiperinflação de 980% e seguiu piorando até o ano de 1993, quando a inflação oficial foi de 2.477%. Esse histórico precedeu a implantação do Plano Real, em 1994, elaborado pela equipe formada pelo ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, e conseguiu debelar aquele processo insano, responsável pelo aumento da pobreza e da desigualdade social. O reconhecimento popular veio na eleição e reeleição de Fernando Henrique para presidente da República, em primeiro turno nas duas vezes.

Tem sido norma que as picuinhas, as intrigas e os assuntos menores da briga partidária dominem as manchetes, os debates e as publicações, em detrimento das grandes questões nacionais realmente importantes

O ano de 2022 está sendo marcado por elevação da taxa de inflação em vários países do mundo, e uma das causas é comum: todos tiveram pandemia, fizeram isolamento social, a economia parou, empresas trancaram as portas, os trabalhadores foram retidos em casa, o desemprego disparou e a situação social se agravou a ponto de, apesar dos auxílios emergenciais dos governos, não ser possível evitar a recessão e a pobreza. A inflação que está em plena ocorrência no Brasil e diversas outras nações tem as mesmas causas, embora muito distante do quadro de hiperinflação vivida no passado. A desordem produtiva da economia gerou um choque de oferta (produção insuficiente para atender a demanda, mesmo com a queda do consumo) que já seria suficiente para pressionar os preços para cima. Adicione-se a crise hídrica, no caso específico brasileiro; e, neste ano, a guerra iniciada em 24 de fevereiro com a invasão da Ucrânia pela Rússia, e tem-se aí um quadro que ajuda a explicar a inflação renitente.

Uma grande prioridade para os primeiros anos do governo a ser eleito em outubro próximo é o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), como meio de elevar o nível de emprego e a renda por habitante. Este tema deveria estar no centro dos estudos, análises e debates nas eleições estaduais e federais deste ano. É importante chamar a atenção dos políticos, especialmente dos candidatos, para que se conscientizem do problema e suas causas, e tratem das medidas de política econômica que combinem estímulo ao crescimento e combate à inflação, empreitada que não é das mais fáceis. Infelizmente, tem sido norma que as picuinhas, as intrigas e os assuntos menores da briga partidária dominem as manchetes, os debates e as publicações, em detrimento das grandes questões nacionais realmente importantes. Cabe à população e suas lideranças fazerem pressão sobre os candidatos para que expliquem suas ideias e propostas.


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