Caso Marielle Franco

Por
Rodolfo Costa – Gazeta do Povo
Brasília

11.05.2022 – Lula participa de Plenária Popular em Juiz de Fora (MG). Foto: Ricardo Stuckert


Lula durante ato da pré-campanha.| Foto: Ricardo Stuckert

O presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados da base governista no Congresso Nacional avaliam a possibilidade de processar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pedir sua inclusão no Inquérito 4.781, conhecido como “inquérito das fake news”, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). O motivo foi a declaração de Lula, na semana passada, em que ele associa Bolsonaro, sem apresentar prova alguma, ao assassinato da vereadora Marielle Franco (Psol-RJ), em 2018.

Sem citar Bolsonaro nominalmente, Lula apontou como responsáveis pela morte de Marielle “gente” de “governante”. “A gente não sabe a qualidade de todos os milicianos dele. O que a gente sabe é que gente dele, sabe… não tem pudor de ter matado a Marielle”, disse Lula na quarta-feira passada (1.º).

A manifestação foi repudiada por Bolsonaro, por ministros e aliados da base do governo, que analisaram nos últimos dias como responder à acusação do petista. Ainda não há um consenso sobre a estratégia jurídica a ser adotada, mas a estratégia política está bem desenhada, e envolve a pressão para que o ministro Alexandre de Moraes, do STF, inclua Lula no inquérito das fake news.

A ideia encampada por aliados e ministros é acusar Lula de ter propagado uma notícia falsa ao fazer tal associação, ainda que sem uma menção nominal a Bolsonaro, e cobrar Moraes para incluir o petista no inquérito. Caso o ministro não faça isso, governo e governistas entendem que teriam argumentos políticos e até jurídicos para alegar uma pretensa parcialidade de Moraes, que conduz o inquérito.

Que ações serão adotadas para incluir Lula no inquérito das fake news
A deputada federal Bia Kicis (PL-DF) deu a diretriz para a condução da estratégia política de pressionar o ministro Alexandre de Moraes a incluir Lula no inquérito das fake news. Na semana passada, ela questionou se “esse tipo de fake news que pode afetar as eleições será coibido”. “O pré-candidato Lula será preso ou futuramente será cassado, na remotíssima hipótese de eleito?”, questionou.


O questionamento da deputada foi endossado pelo ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira. Coordenador eleitoral de Bolsonaro, Nogueira disse estar “completamente estarrecido” com as declarações de Lula, classificou a fala como “a maior fake news que um homem público já teve a coragem de fazer”. “Dizer que pessoas próximas ao presidente Bolsonaro mataram a vereadora Marielle é de uma irresponsabilidade, de uma leviandade sem precedente. Isso sim é uma fake news”, afirmou em vídeo gravado no domingo (5) para a CNN Brasil.

O pronunciamento de Nogueira repercutiu internamente no governo a ponto de interlocutores admitirem que pedir a inclusão de Lula no inquérito do STF é uma estratégia a ser estudada.

Não é esperado, contudo, que o chefe da Casa Civil vá além disso e pressione o ministro Alexandre de Moraes a acatar sua sugestão. A ideia é que a pressão ao magistrado seja feita pelos parlamentares da base ou pelo próprio Bolsonaro, que já processou Moraes por abuso de autoridade.

O deputado federal Filipe Barros (PL-PR) quer mobilizar um grupo de parlamentares e solicitar, através de uma petição ao ministro do STF, que Lula seja incluído no inquérito das fake news. O parlamentar vai levar a ideia à reunião da bancada do PL nesta semana e espera conseguir apoio de seu partido e de outras legendas da base. “Uma das tarefas que pretendo esta semana é mobilizar um grupo de parlamentares e solicitar essa inclusão através de uma petição”, disse Barros à Gazeta do Povo.

Aliado de Bolsonaro, Barros disse ainda que, paralelamente, Bolsonaro irá adiante com a ideia de processar Lula criminalmente – uma acusação sem provas caracteriza o crime de calúnia. Porém, o deputado desconhece se os advogados do presidente vão peticionar o STF com o pedido de inclusão de Lula no inquérito das fake news. “Não sei se seria interessante ser uma estratégia da defesa. Acredito até que não. Mas isso poderia partir de um grupo de parlamentares”, afirmou Barros.

Que estratégia jurídica pode ser adotada por governistas contra Lula
Aliados de Bolsonaro consideram que a estratégia política para questionar a acusação sem provas de Lula está bem desenhada. Mas o mesmo não se pode dizer da estratégia jurídica. O PL e Bolsonaro ainda analisam qual é a melhor forma de proceder.

Governistas e ministros que defendem a tese de pedir a inclusão de Lula no inquérito das fake news cogitam protocolar alguma representação no STF. O departamento jurídico do PL entende que essa é uma alternativa possível. A análise de advogados do partido é de que, quando Lula faz uma associação sem provas e embasamento envolvendo Bolsonaro com o assassinato de Marielle Franco, Lula estaria cometendo uma fake news e, portanto, poderia ser demandada uma investigação contra ele.

Contudo, essa é uma decisão que cabe a Bolsonaro e ao partido. Por esse motivo, mesmo um processo contra Lula ainda é incerto, apesar de haver indícios de que o presidente vai processar o petista. A executiva nacional do PL conversou com os advogados do presidente na segunda-feira (7) e o posicionamento do jurídico é de que cabem, sim, uma representação contra o ex-presidente.

A análise é de que, além do pedido de inclusão de Lula no inquérito das fake news, cabe tanto uma representação no âmbito criminal e no âmbito eleitoral. Na esfera eleitoral, a tese é de que o petista pode ser responsabilizado por propaganda eleitoral antecipada negativa.

Existe a possibilidade de que o PL entre com uma representação contra o ex-presidente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas essa é uma decisão que caberá a Bolsonaro e ao presidente nacional do partido, Valdemar Costa Neto. O jurídico aguarda uma resposta do presidente e da executiva nacional para acionar ou não o TSE.

Mas aliados do governo dizem que Bolsonaro e o partido não devem apostar apenas em uma representação no TSE para ampliar as possibilidades contra Lula em outros tribunais. Caso decidam acionar outras esferas do Judiciário, deputados dizem que existe a possibilidade de até mesmo a Advocacia-Geral da União (AGU) ser acionada.

Investigação da morte de Marielle não tem relação com Bolsonaro
Não é a primeira vez que Bolsonaro foi associado com o assassinato de Marielle Franco. A vinculação, feita anteriormente por oposicionistas, tomou por base o depoimento de um porteiro do condomínio Vivendas da Barra, onde o presidente da República tem uma casa e onde vive no Rio de Janeiro. O porteiro afirmou que o ex-policial militar Élcio Vieira de Queiroz, o motorista do veículo que perseguiu Marielle, foi ao condomínio e indicou que iria à casa 58, que pertence a Bolsonaro.

Mas, na realidade, Élcio Vieira de Queiroz foi à casa 65, que é de Ronnie Lessa, acusado de ser o autor dos disparos. O porteiro disse que interfonou para a casa de Bolsonaro e alega ter falado com um homem com a voz do presidente. Naquele dia, porém, Bolsonaro estava em Brasília – o que é comprovado pelo registro de presença na Câmara (na época, ele ainda era deputado) e também por vídeos que ele divulgou em duas redes sociais.

A procuradora Simone Sibilio, chefe do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio, disse que o porteiro mentiu neste depoimento e que as provas técnicas coletadas indicam que foi Lessa quem autorizou a entrada de Queiroz.

Lessa e Queiroz foram denunciados por homicídio qualificado de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, e pela tentativa de homicídio de Fernanda Chaves, assessora da vereadora que também estava no carro e que sobreviveu aos disparos. Em maio deste ano, o Ministério Público confirmou que uma das hipóteses com o qual trabalha é que o contraventor Rogério de Andrade seja o mandante do assassinato.

A vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes foram mortos no dia 14 de março de 2018. Ela havia participado de um debate promovido pelo Psol com jovens negras na Casa das Pretas, na Lapa, bairro da região central do Rio. Por volta das 21h, quando ela, o motorista e a assessora deixaram o local, outro veículo passou a seguir o carro em que o grupo estava. Perto das 21h30, esse veículo, um Cobalt, emparelhou com o carro da vereadora. De dentro desse Cobalt, ao menos 13 tiros foram disparados. Marielle foi atingida por quatro tiros na cabeça e Anderson, por três tiros nas costas.


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