Paula Bonelli

Leandro Karnal. Foto: Felipe Rau / Estadão

Leandro Karnal. Foto: Felipe Rau/Estadão

O escritor Leandro Karnal tomou posse na Academia Paulista de Letras, na última quinta-feira, na casa no Largo do Arouche, lugar que reúne intelectuais comprometidos com a promoção da língua portuguesa. Eleito em meio à pandemia, assumiu a cadeira de número 7, posto que era da escritora Anna Maria Martins, tradutora de Agatha Christie, uma das primeiras autoras que Karnal leu na infância.

Ex-professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, autor de 10 livros individuais e outros 10 como coautor, Karnal agora fala para grandes audiências. Além de palestrante presente em várias plataformas, apresenta programa na CNN, e suas crônicas são publicadas no Estadão. Neste percurso, aprendeu que adaptar o discurso é muito importante. “A pessoa é inteligente, independente de ser culta ou não, se é capaz de falar uma linguagem adequada ao seu público. O que não pode haver é traição à mensagem”, disse à repórter Paula Bonelli.

Neste ano eleitoral, ele dá dicas de livros para combater a ira que surge das diferenças políticas na família ou nas redes. Aos 59 anos, diz que não perde o sono, mas só toma café pela manhã e chá até as 17 horas.

Quais livros podem ajudar as pessoas neste ano de disputa eleitoral?

Se elas querem controlar a raiva, seria bom lerem algum filósofo estoico como Sêneca que escreveu sobre a ira e a considera o pior de todos os defeitos. Desmente Aristóteles, que dizia que a raiva servia para ação. Ele faz uma análise, ainda muito atual, de como pensar a ira e evitá-la. É bom recuperar o equilíbrio para boas decisões. Estou aprendendo muito ao ler a Mente Moralista, do psicólogo Jonathan Haidt. Me fez entender porque alguém olha para um candidato, vê todos os defeitos do mundo nele e vota nele mesmo assim.

Acha que o acirramento político deste ano será parecido com 2018?

Vai ser pior, mas está longe de ser o pior que já experimentamos. Entre 1932 e 1935, comícios eram dissolvidos a metralhadora no centro de São Paulo. No choque entre a Ação Integralista Brasileira e a Aliança Nacional Libertadora não era xingamento de rede social, era tiro. Não estamos nessa situação. Há hoje fake news, sim, gabinete do ódio. Mas as redes sociais dão a sensação de que todo mundo está se matando. O nosso ativismo de sofá é muito forte hoje.

Como vê o interesse do brasileiro pela leitura?

Temos uma dicotomia muito profunda. A geração atual de jovens é a que mais lê em toda a história. Passam o dia no WhatsApp e em outros lugares lendo frases curtas e orações absolutas, desenhos e coisas do gênero. Durante a pandemia, houve um crescimento de livros baixados em PDF ou audiolivros, que eu uso bastante para correr. Temos uma crise profunda das livrarias brasileiras, tanto nas grandes quanto nas pequenas. Agora se eu comparar com países que têm a leitura como o principal hobby, como é o caso da França, nós lemos muito pouco.

Como chegou à Academia Paulista de Letras?
Sou amigo do Gabriel Chalita, ex-secretário de educação, e um dia ele disse que eu ia gostar de fazer parte da Academia Paulista de Letras. Há uns quatro ou cinco anos, comecei a pensar sobre isso, um pouco seduzido pela ideia de que teria contato Ignácio Loyola de Brandão, João Carlos Martins e Júlio Medaglia. São pessoas que eu já achava de primeiríssima linha.

Autor de 20 livros, tem algum que gosta mais?

Gosto muito hoje de ser cronista, aquele gênero que Antonio Candido injustamente chamou de menor em determinado momento. Por enquanto, acho que o meu livro O Dilema do Porco Espinho é muito pessoal, assim como Pecar e Perdoar.

Uma pessoa culta tem que fazer adaptações para falar nas mídias?

Todas as pessoas para se comunicarem têm que fazer adaptação, o que se chama de entropia, a perda do sentido original. A pessoa é inteligente, independente de ser culta ou não, se ela é capaz de avaliar essa entropia e falar uma linguagem adequada ao seu público. O que não pode haver, é traição à mensagem. Se não se adaptar, você desaparece.

Você foi parodiado em vídeo do Pânico, chamado Karaokê do Karnal. O que achou?

Eu não vejo. É bom que falem, a liberdade inclui tudo isso, podem me imitar. Que bom que a minha imagem está gerando emprego para as pessoas. A preocupação com a opinião dos outros em mim já foi maior antigamente, mas é inútil. Não é que os críticos não tenham razão, mas a internet criou tantos que não é possível acompanhá-los.

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By valeon