Atlântico Norte
Por
Filipe Figueiredo – Gazeta do Povo
O secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), Jens Stoltenberg, discursa em uma coletiva de imprensa, antes de uma reunião de dois dias dos Ministros da Defesa da OTAN, em Bruxelas, Bélgica, 15 de junho de 2022.| Foto: EFE/EPA/STEPHANIE LECOCQ
Já se passaram quatro meses da invasão russa da Ucrânia e os países do chamado Ocidente ainda estão tateando em como responder aos eventos. A presente semana pode ser um passo no sentido de uma resposta uniforme e duradoura. Nos dias 26 a 28 ocorre a 48ª cúpula do G7, na Alemanha, sucedida, nos dias 28 a 30, pela 35ª cúpula da OTAN. No segundo caso, a guerra na Ucrânia será certamente o principal tema.
Antes mesmo do atual conflito, no final de janeiro, comentamos aqui em nosso espaço algumas das razões que explicam a falta de uma postura unânime dentro da OTAN em relação à Ucrânia. Com a invasão russa e meses de conflito, entretanto, as diferenças começaram a diminuir, com as repercussões afetando todos os países, embora em escalas diferentes.
Importante frisar que as diferenças começaram a diminuir, mas ainda existem. Os interesses dos EUA e do Reino Unido são uns, os das potências continentais, França e Alemanha, são outros, assim como os dos países do leste europeu ou os interesses da Turquia. Cada um deles está em situação distinta e, principalmente, as eventuais consequências de qualquer ação não seriam sentidas de maneira uniforme.
Guerra na Ucrânia e convidados
A atual cúpula da OTAN tem também como preâmbulo uma entrevista do secretário-geral da organização. No último dia dezenove, Jens Stoltenberg afirmou que a guerra na Ucrânia “pode levar anos”. Ou seja, é partindo dessa premissa que o bloco precisa negociar entre si e determinar suas posições, não mais suficientes para o curto prazo ou limitando-se ao que se pensava anteriormente, que o conflito seria curto.
Uma das expressões dessa necessidade de pensamento de longo prazo é o fato de que será uma cúpula bastante recheada em Madri. A sede foi escolhida para celebrar os quarenta anos da entrada da Espanha na aliança. Além dos países da OTAN, estarão presentes líderes da União Europeia, Coreia do Sul, Nova Zelândia, Japão, Austrália, Geórgia, Suécia e Finlândia. O presidente ucraniano falará via vídeo.
Fora a UE, os convidados se dividem em três grupos. Suécia e Finlândia, os dois países escandinavos que são oficialmente candidatos à integrarem a aliança; Geórgia, um país que, embora não seja oficialmente candidato, faz parte do programa de expansão desde 2006 e está em um conflito congelado com a Rússia, nas regiões da Ossétia do Sul e da Abcázia; finalmente, os países do oceano Pacífico.
Esses são convidados tendo a China como antagonista comum. Hoje, entretanto, as questões econômicas da guerra na Ucrânia fazem com que lidar com a China seja algo muito próximo de lidar com a Rússia, já que as relações comerciais e econômicas entre os dois países aumenta cada vez mais. Será a primeira vez na História que o chefe de governo japonês estará em uma cúpula da OTAN.
Novo documento
Japoneses e russos, inclusive, estão com relações cada vez mais azedas, marcada pela disputa fronteiriça envolvendo as três ilhas do sul do arquipélago das Curilas. A presença dos países do Pacífico também está ligada ao interesse dos EUA em relação ao principal desdobramento dessa cúpula. Em Madri os países adotarão o novo documento de Conceito Estratégico da OTAN.
O documento é publicado a cada dez anos, delimitando os principais desafios da aliança, seus objetivos, sua interpretação do cenário global e quais as ações que serão eventualmente adotadas pela aliança. O atual documento em vigor foi publicado em 2010 e é considerado obsoleto, vide os recentes eventos na Europa. O governo dos EUA deseja que o novo documento tenha uma linguagem mais assertiva em relação aos chineses.
Certamente ocorrerá uma mudança de linguagem em relação à Rússia, considerada um “parceiro estratégico” no atual documento. Outra pauta importante que será debatida é a ascensão de Finlândia e Suécia, que enfrenta o veto da Turquia. O governo Erdogan acusa os escandinavos de “apoiar o terrorismo” por receber refugiados curdos, incluindo integrantes do Partido dos Trabalhadores do Curdistão.
Especula-se até um encontro bilateral entre Erdogan e Joe Biden. Para que um país integre a OTAN, ele precisa da concordância de todos os integrantes, o que, na prática, dá um “poder de veto” ao governo turco. Na prática, a Turquia está “criando dificuldade para vender a facilidade”, barganhando sua posição em troca de compensações, como o retorno do país aos programas de armamentos dos EUA.
Maior revisão da OTAN
Também deve ser discutido o fornecimento de armamento e, principalmente, de treinamento para as forças ucranianas. Até o momento ocorreram poucas ações concertadas nesse sentido, com iniciativas nacionais, como as dos EUA. Uma eventual solução em bloco deve envolver o treinamento de forças ucranianas em território alemão, além do fornecimento de armamentos mais avançados.
Finalmente, os países bálticos desejam pressionar por uma expansão da Força de Resposta Rápida da OTAN, que é baseada no leste europeu. Atualmente ela é composta por quarenta mil militares, mas o plano é de expandir seu tamanho para até trezentos mil, distribuídos pela Europa oriental e Alemanha. O projeto passa por questões logísticas e econômicas, já que existem custos envolvidos.
Segundo Stoltenberg, seria “a maior revisão de nossa defesa e dissuasão coletiva desde a Guerra Fria”. Anos atrás, quando da eleição de Donald Trump, muitas pessoas questionavam a continuidade da existência da OTAN. Hoje, alguns anos atrás, a organização passa por um processo de expansão, revisão e consolidação. Mais uma consequência da invasão da Ucrânia.
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