Atividade econômica
Vandré Kramer
Avião decola no aeroporto Afonso Pena, em Curitiba: setor de serviços cresceu 8,8% no primeiro semestre e é um dos responsáveis pela melhora nas projeções para o PIB de 2022.| Foto: Albari Rosa
As projeções de crescimento da economia brasileira para 2022 feitas pelas instituições financeiras estão aumentando há sete semanas seguidas, segundo o relatório Focus, do Banco Central. O boletim mais recente indica que o ponto médio (mediana) das estimativas chegou a 2%. Entre os economistas que respondem à pesquisa do BC, os mais otimistas já esperam expansão próxima de 3%.
É uma situação bem distinta da observada no início do ano. Até os primeiros dias de março, o ponto médio das projeções indicava avanço de apenas 0,3% no PIB. Na época, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o mercado passaria o ano revisando os números para cima. O que de fato ocorreu, pelo menos até agora.
A recente divulgação do IBC-Br, índice do Banco Central que busca medir a temperatura da atividade econômica, reforçou as expectativas de um bom resultado do PIB no fechamento do segundo trimestre. O indicador avançou 0,69% em junho, na comparação com maio, e 0,57% sobre o primeiro trimestre.
Enquanto isso, as expectativas para 2023 tomaram rumo oposto. No início do ano, o mercado projetava alta de 1,8% no PIB do ano que vem. No fim de abril, a mediana das previsões estava em 1%, e em julho caiu abaixo de 0,5%. Na coleta mais recente, o ponto médio está em 0,41%.
Uma série de fatores explica esse descompasso, apontam economistas do Bradesco. De um lado, o desempenho neste ano segue surpreendendo positivamente, como mostram os dados de arrecadação federal, emprego, crédito e utilização da capacidade instalada na indústria. A esses indicadores, diz o banco, se somarão os programas de auxílio criados ou majorados neste mês, que vão pôr mais dinheiro na mão de grande parcela da população.
Para 2023, no entanto, a análise afirma que os efeitos defasados da política monetária e a desaceleração da economia global devem afetar o PIB. “Os juros reais estão acima do nível médio observado em 2015 e o endividamento das famílias está em elevação por conta da alta de preços. Logo, é plausível esperar desaceleração do mercado de crédito e das contratações no próximo ano”, citam os economistas do Bradesco, em relatório.
Os setores que empurram o PIB para cima
O economista Eduardo Vilarim, do Banco Original, afirma que o PIB do primeiro semestre, que será divulgado em 1.° de setembro, deve vir acima do que era esperado até pouco tempo atrás. Uma prévia do indicador, o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), registrou uma variação de 2,24% em relação ao mesmo período de 2021.
Um setor que deve apresentar bons resultados é o da construção civil, que teve crescimento de 9% no comparativo entre os primeiros trimestres de 2021 e 2022. “Ele é influenciado pelo avanço das obras públicas em ano eleitoral e pela reabertura da economia”, diz.
Além da construção, outro setor que vem mostrando maior dinamismo, de acordo com Vilarim, é o de serviços. No primeiro semestre, ele cresceu 8,8% em relação ao mesmo intervalo de 2021, com destaque para os prestados às famílias, aponta o IBGE. E a tendência é de que continue se mantendo resiliente, devido ao aumento da massa salarial disponível.
A economista-chefe da Tenax Capital, Débora Nogueira, aponta que, em um comparativo global, a economia brasileira é uma das poucas no mundo que está mais acelerada.
Os Estados Unidos entraram, no segundo trimestre, em recessão técnica. A China está tentando reduzir a taxa básica de juros para dar mais tração a seu crescimento. Na Europa, diante da inflação alta e dos aumentos nos custos com energia, a atividade econômica está se desacelerando rapidamente.
Maior crescimento deve reduzir ainda mais o desemprego
A tendência de maior crescimento da economia deve contribuir, neste ano, para uma redução mais acentuada do desemprego. Pelos cálculos da equipe de análise econômica do Bradesco, a taxa pode recuar a 8,3% até dezembro. Em junho, segundo o IBGE, ela era de 9,3%.
Débora Nogueira, da Tenax, aponta que o mercado de trabalho está mais forte do que se esperava. De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o país criou 1,33 milhão de vagas no primeiro semestre, cerca de 10% abaixo do bom desempenho do mesmo período de 2021.
Além da atividade mais acelerada, Vilarim, do Original, também vê outro motivo que estaria estimulando a criação de novas oportunidades de trabalho com carteira assinada: os efeitos da reforma trabalhista, implantada em 2017.
A XP Investimentos não vê sinais de acomodação na atividade doméstica. A corretora lembra que o consumo das famílias apresentou forte expansão no primeiro semestre deste ano, puxando os mercados de bens e serviços. E aponta que, às medidas de antecipação de renda no primeiro semestre – como saque extraordinário do FGTS e primeira parcela do 13.º de aposentados e pensionistas do INSS – se soma, agora, o pagamento do Auxílio Brasil de R$ 600.
Assim, mesmo com a pressão causada pelo aumento na taxa Selic, hoje em 13,75% ao ano, e pela maior percepção de risco no ambiente econômico global e doméstico, os impulsos fiscais devem servir de contrapeso. E devem contribuir, na visão da XP, para uma desaceleração mais suave da atividade econômica neste segundo semestre.
Contas públicas são preocupação para 2023
O cenário é diferente para o próximo ano. Segundo economistas do Bradesco, há alguns meses tem ocorrido uma deterioração das condições financeiras na economia – queda da bolsa de valores, depreciação da moeda, aumento do risco-país e aumentos nos juros – que se traduz em uma maior probabilidade de recessão no primeiro semestre.
A questão fiscal também exerce uma pressão negativa para o próximo ano. A XP aponta que os riscos fiscais crescentes no quadro doméstico deterioram as condições financeiras e podem manter as taxas de juro em níveis altos por ainda mais tempo.
A expectativa de instituições financeiras é de que as contas públicas fechem 2022 no azul, mesmo com a pauta de desonerações e despesas implementada nos últimos meses. “Com receitas adicionais de dividendos, ainda podemos voltar ao cenário de superávit mais robusto vislumbrado meses atrás”, citam analistas do Bradesco.
Lucros das estatais podem fazer governo voltar ao azul após oito anos
A maior preocupação é com o futuro das contas públicas. A percepção das instituições financeiras é de que os ganhos de arrecadação perderão força nos próximos meses, devido a desaceleração da economia, queda nos preços das commodities e redução da inflação.
“Já as despesas, aprovadas em regime transitório, podem se tornar permanentes ou até mesmo serem ampliadas no próximo ano. A implicação direta é uma pressão sobre o teto de gastos, que tende a ser debatido já durante a tramitação, neste ano, do orçamento de 2023”, cita relatório do Bradesco.
O banco considera que, com expectativa de juros elevados – a volta à casa de um dígito só ocorreria em 2024 – e baixo crescimento, as simulações para a trajetória da dívida pública têm se deteriorado, levando ao aumento do prêmio de risco. Isto torna mais desafiador o cumprimento da meta de inflação.
Segundo o Itaú, o próximo governo terá de decidir sobre a continuidade dos auxílios e cortes de impostos recém-implementados, além do arcabouço fiscal que será válido à frente, em uma economia emergente com dívida pública alta e juros elevados.
A XP sinaliza para uma reforma da regra geral do teto de gastos, com elevação do teto do limite em 2023 para acomodar as novas despesas e correções em linha com a inflação nos anos seguintes.
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