Editorial
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Gazeta do Povo

Vitória (ES) – Supermercados lotados e com filas nos caixas e na entrada funcionam em horário reduzido. (Tânia Rêgo/Agência Brasil)


Inflação prevista para 2023 é de 5%, segundo o Focus.| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Pela segunda vez consecutiva, o Copom resolveu manter a taxa Selic nos atuais 13,75% ao ano, em sua última reunião antes da definição de quem governará o Brasil a partir de janeiro de 2023, e na penúltima antes que o próximo mandato se inicie. Desta vez, no entanto, a manutenção da taxa foi decisão unânime, ao contrário do que havia ocorrido em setembro, quando dois membros do colegiado foram favoráveis a uma nova elevação de 0,25 ponto porcentual. O comunicado emitido após a reunião é praticamente idêntico ao do encontro anterior, com algumas poucas diferenças na descrição do cenário atual, mas mantendo as observações sobre os fatores de risco internos e externos, e sobre a possibilidade de voltar a subir os juros se a inflação tiver algum repique.

Há diferenças significativas entre as disparadas inflacionárias sob os governos petistas e sob o governo Bolsonaro. Quando a inflação chegou aos dois dígitos em 2015, a escalada foi resultado das políticas gastadoras da “nova matriz econômica” implantada pelo petismo assim que ganhou confiança suficiente para abandonar o tripé macroeconômico herdado de Fernando Henrique Cardoso. Dilma Rousseff, assim, fizera exatamente aquilo de que acusara seu adversário em 2014, Aécio Neves: “plantar inflação para colher juros”. Já a atual inflação brasileira, que também chegou aos dois dígitos antes de começar a recuar, se insere em um contexto de inflação alta global, como resultado dos choques causados pela pandemia (com a política chinesa de “Covid zero” e seus lockdowns) e pela agressão russa contra a Ucrânia, embora tenha se alimentado também de políticas fiscalmente irresponsáveis, como as medidas que contornaram o teto de gastos.

O gasto público é necessário, mas a gastança desenfreada e o desperdício são inflacionários

No entanto, para o brasileiro, especialmente o mais pobre, que vê seu poder de compra corroído mês a mês sem poder se defender contra isso, neste momento os culpados pela inflação importam menos que as propostas dos candidatos para trazer de volta os preços a patamares civilizados, já que mesmo 5% ainda é um índice razoavelmente alto para economias que se pretendem sólidas e as pressões inflacionárias persistem. É preciso lembrar que, apesar do recuo nos preços do petróleo e do fim da crise hídrica que encareceu a energia elétrica, o principal fator por trás do recuo do IPCA nos últimos meses não foi a normalização da dinâmica de oferta e demanda, mas uma canetada: no caso, a lei que obrigou estados a reduzir o ICMS de itens essenciais, especialmente os combustíveis e a energia.

O assunto, no entanto, não chegou a ser debatido nem no primeiro, nem no segundo turno com a profundidade que uma mazela econômica destas dimensões merece. E os sinais preocupantes vêm de ambos os lados. Lula, que nem mesmo chegou a divulgar um plano de governo detalhado e não anuncia quem fará parte de sua equipe econômica em caso de vitória porque “não pode perder votos”, não renega as políticas gastadoras que estiveram na origem da espiral inflacionária de 2015 e promete lutar para derrubar o teto de gastos – até mesmo seu criador, Henrique Meirelles, agora aliado de Lula, já defendeu o descumprimento do teto para bancar a continuação do Auxílio Brasil de R$ 600. Do lado do atual governo, o mecanismo criado em 2016 em resposta à gastança petista acaba de ser criticado por Paulo Guedes, que o definiu como “muito mal construído”; além disso, diversas gambiarras fiscais recentes propostas ou apoiadas pelo governo, como a PEC dos Precatórios e a PEC dos Benefícios, burlavam o teto, desmoralizando-o na prática.


O gasto público é necessário, mas a gastança desenfreada e o desperdício são inflacionários. A experiência brasileira recentíssima é prova disso; a experiência argentina atual o comprova com ainda mais força. Um governo que ignore essa verdade nos próximos quatro anos não pode alegar que não havia como imaginar que as causas de sempre levariam aos efeitos de sempre. Não existe “desta vez é diferente”. Reduções de impostos têm um limite; outros fatores de risco para a inflação estão além do controle brasileiro, como o preço do petróleo; então, é imprescindível que Executivo e Legislativo façam o que estiver a seu alcance, racionalizando a despesa pública, com as prioridades certas, eliminando imoralidades e desperdícios no orçamento, incentivando a competitividade. Não cumprir esse roteiro básico é esperar por um milagre nesta época de pressão inflacionária global.


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