Negociação política
Novo Centrão?
Por
Olavo Soares – Gazeta do Povo
Brasília


Presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), foi a primeira autoridade a reconhecer e parabenizar o presidente eleito Lula pela vitória nas urnas.| Foto: Joédson Alves/EFE

A decisão do PT de apoiar a reeleição de Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Câmara dos Deputados, que deve ser anunciada nesta terça-feira (29), pode ser o ponto de partida de uma nova etapa das relações de poder no Legislativo. Ao apoiar Lira, o PT busca sustentação para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que se inicia em janeiro, e tenta afastar do presidente da Câmara o PL de Jair Bolsonaro. Como “efeito colateral”, porém, a medida pode distanciar o Psol do futuro governo.

O apoio do PT a Lira ainda não é oficial. Publicamente, o partido desconversa e diz que fará uma reunião de bancada nesta terça em que discutirá diversos temas, incluindo a sucessão na Casa. Mas nos bastidores o arranjo é dado como certo, e o deputado José Guimarães (CE) sinalizou o movimento em uma entrevista à CNN Brasil.

Com isso, o PT se somaria a outros dez partidos que já confirmaram o voto em Lira: PP, União Brasil, Republicanos, PDT, Podemos, PSC, Patriota, Solidariedade, Pros e PTB. Parte dessas legendas deu sustentação a Bolsonaro nos últimos anos e agora pode votar em pautas favoráveis ao futuro governo Lula, indicando assim a tendência de funcionar como o “novo Centrão”.

A parceria PT-Lira teria como resultado inicial o apoio do presidente da Câmara à PEC fura-teto, a proposta apresentada pelo governo de transição para garantir o pagamento do Bolsa Família e outros benefícios sociais a partir de 2023. A equipe de Lula considera essencial a aprovação do projeto e tem centrado fichas na negociação para conseguir o aval do Congresso.

Há ainda a possibilidade que o voto dos petistas em Lira represente maior participação do partido de Lula nas decisões da Câmara, com posição de maior relevância na Mesa Diretora e nas comissões permanentes da Casa. O movimento deve também indicar a aproximação entre o PT e o União Brasil, partido que terá a terceira maior bancada na Câmara a partir do ano que vem.

Lira foi eleito presidente da Câmara no início do ano passado. Embora as normas vetem a reeleição dos comandantes da Casa, há o entendimento que a troca de legislatura “zera” o processo e abre caminho para uma nova candidatura. Em 2021, Lira obteve 302 votos, vencendo a disputa já no primeiro turno. Seu principal adversário na ocasião foi o deputado Baleia Rossi (MDB-SP).

Embora os partidos lancem candidaturas e formem blocos de apoio em torno dos nomes apresentados, o voto para presidente da Câmara é dado de forma individual e sigilosa por cada um dos deputados. Ou seja, as alianças formadas pelos partidos podem não ser respeitadas pelos congressistas. Na disputa de 2021, Rossi havia conseguido o apoio da cúpula de partidos como PSDB e DEM, mas grande parte dos integrantes dessas agremiações indicou posteriormente o voto em Lira.

Apoio do PT pode ser “pretexto” para mudar de lado, diz governista sobre Lira
A adesão do PT à candidatura de Lira pode inibir o PL de apoiar o atual presidente da Câmara. Lira defendeu a reeleição de Bolsonaro e foi um dos destaques na convenção do PL que confirmou a candidatura do atual presidente, quando vestiu, literalmente, uma camisa com o nome do presidente da República. A aproximação entre ambos ganhou corpo ainda em 2020 e representou a aliança entre o Centrão e o governo.

Lira, porém, nunca mostrou convergência ideológica com parte das plataformas de Bolsonaro, em especial as do campo dos costumes. Ele foi o primeiro chefe de poder a reconhecer a vitória de Lula, poucas horas após a conclusão do segundo turno das eleições. E, em anos anteriores, foi aliado dos governos petistas, assim como seu pai, o ex-senador Benedito de Lira (PP-AL).

Segundo um deputado do PL, que conversou de modo reservado com a Gazeta do Povo, a bancada que apoia o governo espera de Lira a sinalização do deputado a causas como a instalação da CPI que quer investigar supostos abusos de autoridade cometidos por membros do Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A comissão foi sugerida pelo deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS) e já conta com o número mínimo de assinaturas para avançar.

“O PL está observando o comportamento do Arthur [Lira]. Queremos saber se ele está no time dos deputados ou no time do Alexandre de Moraes. Vamos ver se ele vai dar desculpas para não instalar a CPI”, disse o parlamentar.

Na avaliação do congressista, a falta de apoio de Lira à abertura da CPI pode motivar os aliados de Bolsonaro a apresentar uma candidatura própria para o comando da Câmara. “Talvez isso [apoio do PT] seja um pretexto para Lira mudar de lado e depois dizer que nós que rompemos com ele”, afirmou.

Psol confirma rejeição a Lira

Já o Psol, partido que fez parte da aliança eleitoral de Lula desde o primeiro momento, indicou que não votará em Arthur Lira para a presidência da Câmara, mesmo com o apoio do PT ao alagoano. De acordo com a líder do partido na casa, Sâmia Bomfim (SP), “Lira foi um dos maiores responsáveis pelo avanço da agenda de Bolsonaro no Brasil” e “se silencia ainda hoje diante do golpismo da extrema direita”.

“Não há motivos políticos que nos levem a votar nele, tendo em vista que ele é um braço direito do Bolsonaro”, afirmou a parlamentar, que também citou o “orçamento secreto” como motivo para a rejeição ao nome de Lira.

Sâmia disse que “o Psol busca a construção de uma outra candidatura, que de fato expresse o antibolsonarismo”. Historicamente, o partido lança nomes para o comando da Câmara, com candidaturas que já nascem com a certeza de que terão poucos votos e existem para que o Psol divulgue suas causas durante o período eleitoral.


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