Para onde vão os juros?

Fonte: Folha de S.Paulo – Gazeta S. Paulo

Olá, Investidor Inteligente, tudo bem?

O relacionamento entre o novo Governo e o Banco Central (BC) definitivamente não iniciou bem.

Lula e integrantes de sua equipe há dias vêm falando sobre o aumento de metas de inflação e sobre, na opinião deles, a desnecessária independência da referida autarquia.

E a briga ficou muito clara depois da decisão do COPOM da última quarta-feira (01), quando foi decidido pela manutenção da taxa Selic em 13,75% a.a.

A manutenção dos juros (que já era esperada) por si só não foi o que aborreceu o governo, e sim o tom do comunicado do BC após a decisão.

Leia na íntegra:

“A conjuntura, particularmente incerta no âmbito fiscal e com expectativas de inflação se distanciando da meta em horizontes mais longos, demanda maior atenção na condução da política monetária.  O Comitê avalia que tal conjuntura eleva o custo da desinflação necessária para atingir as metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional. Nesse cenário, o Copom reafirma que conduzirá a política monetária necessária para o cumprimento das metas.”

Nesse comunicado, podemos notar três recados do BC para o governo:

1) A incerteza fiscal atrapalha as expectativas de inflação e juros;

2) A discussão sobre o aumento da meta de inflação desagrada (essa está nas entrelinhas);

3) O BC é independente e cumprirá o seu papel.

Fato é que o BC, na personalidade de seu presidente Roberto Campos Neto, está incomodado com as declarações que Lula vem dando.

E Lula está incomodado com os juros altos, pois ele sabe que, nessa situação, o crescimento econômico será pífio.

Quem tem razão? Em uma análise bastante profunda, nenhum dos dois!

O governo, por um lado, está querendo gerar crescimento econômico ao aumentar a DEMANDA por produtos e serviços.

Isso explica as recentes declarações que colocam pressão para o corte de juros, seja pelo aumento da meta de inflação, seja pela simples redução da Selic…

Quando a taxa de juros diminui, as pessoas consomem mais, os empresários se arriscam mais (investem mais na atividade produtiva) e, em função disso, a economia cresce por um tempo.

Porém, o número de produtos e serviços não aumentará magicamente e a demanda forte impulsionará os preços.

É o chamado “voo de galinha”.

Fazer isso simplesmente aceleraria o ciclo econômico, acelerando também a transferência de renda dos pobres para os mais ricos.

Política social às avessas.

Contudo, Lula se utilizou dessa estratégia no passado durante seus governos – fomentou a demanda e deu certo, a oferta subiu na mesma proporção – o que lhe rendeu um grande capital político.

Mas, na época, essa estratégia deu certo por dois motivos:

1) Superciclo de commodities e…

2) Dólar desvalorizado em relação ao real.

Na época, o preço do minério de ferro e de outros itens exportados pelo Brasil disparou, trazendo para cá um enorme volume de divisas, o que engordou a conta do setor público, dos empresários e da população em geral.

Além disso, os EUA imprimiram pilhas e pilhas de dólares para suportar os esforços das guerras do Afeganistão e do Iraque, e isso fez com que o nosso câmbio ficasse supervalorizado.

O real passou a valer muito naquela época, mesmo com uma política bastante expansionista de gastos!

Mas agora é diferente.

O mundo é outro e muito mais desafiador.

A China não cresce mais à taxa de 10% ao ano

Os EUA, assim como a Europa, estão passando por ondas inflacionárias que forçam o aumento de juros.

Ou seja, é o oposto do que ocorreu anos atrás, quando Lula se tornou o “herói nacional”.

Para fazer o Brasil crescer sustentavelmente e a população melhorar de vida, é necessário AUMENTAR A OFERTA, que é a quantidade de bens e serviços disponíveis — o chamado PIB Potencial.

E para isso acontecer, necessariamente precisaremos:

1) Reduzir a burocracia;

2) Aumentar a segurança jurídica dos contratos;

3) Aumentar a capacidade de investimento da população

4) Aumentar o comércio internacional.

Para aumentar a capacidade de investimento, parte da renda disponível que hoje encontra-se na mão do Estado precisa voltar para a mão da população, que irá empreender.

E isso viria como?

Redução de gastos e de impostos.

Mas, definitivamente, essa não é a agenda do governo atual…

Então, ficaremos com os voos de galinha, tão comuns no Brasil.

Os juros provavelmente serão baixados “forçadamente” e, com isso, você verá um crescimento por 1, 2 ou 3 anos.

Na sequência, a inflação reaparecerá e fará você pagar a conta e o Brasil retroceder novamente.

Agora, por outro lado, vamos falar um pouco sobre o papel atual do Banco Central.

É acertada a tentativa do Roberto Campos Neto, ao manter a taxa de juros elevada, em “forçar” o governo a apresentar para a sociedade uma solução fiscal, um novo arcabouço, que traga a segurança de que o governo não irá fazer gastos acima da capacidade de pagamento.

Mas, se olharmos bem profundamente, essa confusão toda entre BC e governo se dá pelo debate:

“Qual é a taxa de juros ideal da economia?”

O BC diz que é 13,75%; para o governo, quem sabe, deveria ser negativa…

Fato é que fomos ensinados a acreditar que ou o BC ou o governo sabem qual deveria ser a taxa de juros.

Mas, eles não sabem!

A taxa de juros SELIC, assim como qualquer produto ou serviço, é só mais um PREÇO NA ECONOMIA.

E é um preço TABELADO, assim como já foi a água, a luz, a gasolina e — os mais velhos irão se lembrar — os bois do Sarney

O PREÇO é um sinal dado para toda a economia sobre qual é o valor monetário atual de determinado bem ou serviço.

Compradores e vendedores irão tomar suas decisões baseadas nisso!

Se o preço for determinado livremente entre comprador e vendedor, é certo que o negócio sai e que ninguém sairá injustiçado (pois tomou sua decisão livremente).

Se o preço for manipulado — isto é, for determinado por uma autoridade em vez de ser pelo livre mercado —, algum lado sairá ganhando e o outro, perdendo.

Isso gera incrível INSEGURANÇA e ERROS DE CÁLCULOS nas tomadas de decisão.

Vamos pegar o exemplo da produção de tomates.

Digamos que o quilo tenha o preço de 10 reais no mercado e esse é o preço que garante a produção e o abastecimento.

E que o custo de produção seja 5 reais.

Agora digamos que o governo decida reduzir “na marra” o preço para 5 reais…

O que acontecerá?

As pessoas irão comprar muito mais, para “aproveitar o preço baixo”.

Esses compradores iniciais serão os ganhadores nessa situação.

O produtor, que foi forçado a vender no preço mais baixo, será o perdedor, pois terá prejuízo.

E para piorar, nesse nível de preços, irá deixar de produzir, pois o novo preço não cobre o custo de produção.

Qual é o resultado?

Como o preço do tomate não foi determinado por um livre acordo entre comprador e vendedor, mas sim por um burocrata do Estado…

E, nesse caso, foi fixado abaixo do custo…

O que veremos é ESCASSEZ!

Se fosse determinado muito acima do preço atual (por exemplo, em 20 reais), muitos produtores iriam começar a produzir…

Mas não haveria consumo, uma vez que as pessoas não estariam dispostas a pagar, a não ser que fossem forçadas a fazer, por exemplo, no caso de monopólios sobre bens essenciais.

Nesse último caso, veríamos EXCESSO de oferta e desperdício de recursos escassos (capital, trabalho e tecnologia empregados em um mercado sem demanda genuína).

E o mesmo ocorre com a taxa de juros, que é o preço do DINHEIRO

A taxa de juros informa aos poupadores e aos tomadores qual é o preço para que ambos tomem as suas decisões.

Se o governo decidir baixar forçadamente a taxa de juros, de modo que não compense ao poupador continuar poupando, haverá escassez de capital (poupança) na economia e excesso de tomadores.

Por outro lado, se a taxa de juros for elevada forçadamente, haverá excesso de poupança e poucos tomadores.

Quando há desequilíbrio entre poupadores e tomadores, há transferência injusta de renda…

Há desconfiança…

O ambiente passa a não gerar segurança…

Há desperdício de capital quando o juro é muito baixo…

E há falta de capital para empreendimentos na economia real, quando é muito alto.

País nenhum cresce decentemente dessa forma!

Como saber qual deveria ser a taxa de juros ideal?

Só saberíamos se ela fosse determinada pela livre ação entre poupadores e tomadores.

Isto é, se fosse determinada pelo livre mercado, assim como é com os produtos da feira ou do mercado. Aliás, os preços dos juros futuros (contratos de DI negociados na B3) são determinados pelo mercado…

No entanto, essa definição é ancorada na manipulada taxa Selic.

Pelo fato de não ser determinada em um livre mercado, a taxa de juros SELIC (o preço do dinheiro) necessariamente é um preço errado, que gera decisões erradas por parte dos agentes econômicos.

O preço certo de determinado bem ou serviço é aquele que equilibra compradores e vendedores.

Mas, infelizmente, esse é um papo bastante profundo, que país ou governo nenhum quer fazer.

Por quê? Porque, dessa forma, o Estado perderia o enorme poder de controlar a política monetária e a vida de sua população.

Enquanto isso não ocorre, fiquemos atentos ao embate entre Banco Central e Governo.

O mais provável que aconteça – apesar de estarmos ainda longe disso – é um acordo entre as partes:

1) Uma âncora fiscal “meia boca” por parte do governo e…

2) Um aumento “reduzido” da meta de inflação.. e assim vamos

Se BC e governo “reduzirem o tom” e chegarem a um meio termo, as taxas de juros poderão cair e, com isso, os ativos prefixados poderão ganhar destaque e se beneficiarem.

Para você, Investidor Inteligente, o mais importante a fazer é se manter cético a tudo isso.

Não acreditar que o país irá decolar, nem que irá quebrar…

“É o Brasil, sendo o Brasil, por mais longos e longos anos”, muito provavelmente.

Espero estar errado!

Dentro desse contexto extremamente desafiador, você deverá tomar suas decisões de investimento!

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By valeon