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Marcel van Hattem – Gazeta do Povo


| Foto: EFE/André Borges

Não fazia nem duas semanas da vitória de Lula no segundo turno nas eleições e o primeiro “boa sorte” se fazia ouvir dentre aqueles que o apoiaram achando que tudo seria diferente. Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central no primeiro governo Lula, admitia a investidores que a política econômica do governo que viria em breve a assumir – ou mesmo a falta dela – gerava grande preocupação. Diante do cenário devastador que enxergava à frente, Meirelles preferiu, como a jogadores em um Cassino, apenas desejar um amistoso e enganoso “boa sorte”, afinal, sabemos qual o destino do dinheiro do ludopata.

Pouco mais de um mês depois, ainda algumas semanas antes de Lula assumir, mais um “companheiro” inusitado e com sincero ar de desavisado afirmava: “apoiei Lula, mas agora estou com medo”. Tratava-se de outro ex-presidente do Banco Central, este de FHC: Armínio Fraga. Apesar de demonstrar preocupação com a tremenda irresponsabilidade fiscal petista já àquela altura de dezembro consolidada com a iminência da aprovação da PEC da Gastança, que furou o teto em quase R$ 200 bilhões e eliminou a âncora fiscal da Constituição, Fraga preferiu demonstrar a convicção de quem não quer dar o braço a torcer: “eu apoiei a candidatura do presidente Lula. Foi um apoio, no meu caso, sem qualquer condicionalidade. Eu votei e não me arrependo”. Entretanto, completava: “mas agora estou com medo. (…) O todo é bem preocupante”.

Diante do cenário devastador que enxergava à frente, Meirelles preferiu, como a jogadores em um Cassino, apenas desejar um amistoso e enganoso “boa sorte”, afinal, sabemos qual o destino do dinheiro do ludopata

Desconsideremos aqui os interesses pessoais, vaidades particulares ou rejeições políticas que as manifestações acima possam eventualmente representar. Não é do interesse desse artigo especular sobre eventuais motivações que fizeram um Henrique Meirelles ou um Armínio Fraga apoiar um descondenado por corrupção, que entregou o país a uma sucessora inepta que afundou nossa economia em recessão e, também por isso, acabou sofrendo impeachment por crime de responsabilidade. Minha exploração aqui, mesmo enxuta, pretende ser mais ampla: tanto Meirelles como Fraga representam o recente apagão coletivo que fez milhões de brasileiros se iludirem de que o Lula Paz e Amor de duas décadas atrás seria reeditado – agora, porém, por única e exclusiva vontade do eleitor. Faltou combinar com o eleito.

O Lula Paz e Amor dos anos 2000 foi puro contexto. A postura então conciliadora de Lula foi necessária para a sua primeira vitória após três tentativas como o candidato de esquerda que, apesar do radicalismo (ou por causa dele), quase vencia. O reboco pesado em sua imagem iniciou antes da eleição de 2002 com sua Carta ao Povo Brasileiro e foi detalhadamente moldada por ternos Armani, barba aparada e muito marketing de Duda Mendonça. Hoje, porém, deve estar claro para quem quiser ver: foi pura enganação de quem não tem paz nem amor no seu DNA, nem os tem no programa de sua ideologia marxista.

Consagrado nas urnas, inebriado pelo poder e incensado pelos acólitos de qualquer poderoso no Brasil, Lula decidiu manter no mandato a estratégia de campanha: convidou Henrique Meirelles, deputado federal eleito pelo PSDB de Goiás e banqueiro internacional, para ser seu presidente do Banco Central; Antônio Palocci, então celebrado como o homem do diálogo no PT e seu coordenador de campanha, foi para a Fazenda; e criou uma série de mecanismos institucionais, como o Conselhão, para se aproximar do mercado, além de conceder crédito farto e subsidiado para a iniciativa privada, em especial para os mais próximos.

Lula aliou-se já no início do seu governo ao Centrão, apresentou projetos e PECs polêmicas para a sua base mais radical e viu ser fundado o PSOL a partir da costela do PT: sua nova roupagem light gerou indignação em parte de seus correligionários petistas, o que levou alguns à expulsão por infidelidade, outros à desfiliação. O afastamento dos mais radicais e a aproximação com o establishment permitiu a Lula superar escândalos como o do Mensalão, reeleger-se presidente, eleger e reeleger sua sucessora. Foram quase 14 anos até a queda. E que queda!

O impeachment de Dilma Rousseff, nascido da insatisfação social da classe média que tomava as ruas desde as manifestações de junho de 2013, tornou-se uma bandeira nacional que perpassava classes sociais. Os mais pobres sofriam com o altíssimo desemprego, na casa dos 14 milhões de brasileiros, e com a volta da inflação, a começar nos preços da energia elétrica e dos combustíveis. Os mais ricos, representados no delírio marxista-esquerdista pelos industriais mais do que tudo, decidiram externar sua insatisfação emitindo notas empresariais país afora, auxiliando no financiamento de manifestações populares (que, de fato, pouco careciam de recursos pois, eram espontâneas e absolutamente numerosas) e, claro, colocando um famoso pato amarelo na Avenida Paulista simbolizando graficamente de que lado os empresários estavam – e não era o lado do PT, da Dilma ou do Lula.

Menos de dois anos após o impeachment de Dilma, Lula foi preso em 2018 pela Operação Lava Jato após condenações em série por corrupção e lavagem de dinheiro. Seu algoz mais notório era o juiz da primeira instância que julgava todos os principais suspeitos da bilionária pilhagem à Petrobras, Sérgio Moro. Cortejado pela mídia e idolatrado pelo povo nas ruas, Moro era convidado a um sem número de palestras no Brasil e no exterior, muitas das quais organizadas por quem? Sim, elas de novo, as entidades empresariais.

Eram justamente os mesmos empresários que Lula tanto imaginava ter ajudado década e meia antes, quando assumia o poder. Os mesmos a quem Lula julgava ter aberto tantas portas em governos petistas enquanto via parte da sua base mais radical e fiel torcer o nariz, quando não abandonar o barco, mas que passaram a execrá-lo e finalmente declaravam abertamente aquilo que o PT sempre foi e a Justiça confirmava: uma organização criminosa.

No entanto, quando preso em Curitiba, quem se dispôs a fazer longas vigílias de meses a fio diante da carceragem da Polícia Federal não foi nenhum grande empresário ou banqueiro – ou alguém viu Henrique Meirelles ou Armínio Fraga acampados em Curitiba? Quem gritou a plenos pulmões que “Lula é inocente” e que o impeachment de Dilma foi um golpe foi apenas uma incansável minoria de esquerda – incluindo-se aí os mais radicais comunistas e “companheiros” do PSOL, outrora marginalizados pelos petistas. A quem Lula, agora, será grato?

Esta pergunta deveria ter sido feita antes das eleições, é verdade, por muita gente que se deixou levar pelas emoções ou por falsas narrativas. É tarde para mudar o passado, mas é mais do que hora de refletir o futuro que queremos para o nosso país. Está muito claro que o “Lula Paz e Amor” do marketing de 2002 foi substituído pelo “Lula Ódio e Rancor” de sua própria natureza e DNA, do pós-impeachment e do pós-cadeia. Àqueles que ainda imaginam que Lula possa adotar postura conciliadora e pacificar o país, fica o alerta definitivo: não haverá anistia para quem os petistas identificarem como seus inimigos. E eles, hoje, são quase 100 milhões de brasileiros, incluídos os que anularam seus votos, votaram em branco ou preferiram não comparecer às urnas.

O contexto atual é completamente diferente do contexto dos anos 2000. O PT e Lula, mais do que nunca, são os mesmos de suas origens revolucionárias. Para vingar o passado recente, observamos a volta com força da ideologia marxista aos discursos oficiais, a volta da disseminação do ódio de classes como instrumento de obtenção de poder.

Que aqueles que até outubro passado foram incautos e responsáveis por este cenário trágico não se enganem mais: o PT não tem nenhum compromisso com a “salvação” da democracia brasileira e Lula não voltou para espalhar o amor pelo país. O DNA autoritário petista é justamente aquele que está sendo revelado por Lula em suas diatribes diárias de forma transparente, diante de todos: é feito de ódio e rancor, sentimento contra os quais não há sorte ou medo que possam servir como antídotos. É preciso estratégia, trabalho duro e muita coragem para combater a tirania socialista que avança sobre o nosso país.


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