Artigo
Por que uma moeda comum para Argentina e Brasil é uma má ideia
Por
Marcos Falcone – Gazeta do Povo
National Review
Os presidentes argentino, Alberto Fernández, e brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, em encontro em Janeiro em Buenos Aires| Foto: EFE/ Enrique García Medina
Algumas semanas atrás, o ministro da economia da Argentina, Sergio Massa, disse ao Financial Times (FT) que seu país e o Brasil estão iniciando os preparativos para uma moeda comum. Sabemos que essa é uma ideia antiga, pois vem sendo lançada pelo menos desde a década de 1980. Mas é uma boa ideia?
A forma como foi divulgada a notícia de uma moeda comum para Brasil e Argentina é um tanto confusa. Na entrevista ao FT, Massa parecia sugerir que os dois países abandonariam suas moedas atuais em favor de uma nova, assim como os países da zona do euro fizeram algumas décadas atrás. Mas, alguns dias depois, o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, disse que os dois países estavam conversando sobre uma “moeda comercial”, o que é bem diferente.
A lógica dos governos argentino e brasileiro é que uma moeda comercial impulsionaria o comércio bilateral entre os dois países, o que à primeira vista parece positivo, mas na verdade é problemático. De fato, basta olhar para a história recente da América do Sul para perceber onde está o problema: nenhum dos países está interessado no livre comércio e, ao contrário, ambos estão bastante interessados em apoiar os capitalistas amigos.
O exemplo do Mercosul, bloco que Brasil e Argentina formaram com Uruguai e Paraguai na década de 1990, é notável porque não conseguiu expandir o comércio além de suas fronteiras. Ao contrário do que deveria ser, o Mercosul simplesmente transformou alguns países protecionistas em um grande bloco protecionista que prejudica os consumidores. Isso ficou tão evidente que o Uruguai agora ameaça assinar acordos unilaterais de livre comércio com outras nações.
De fato, a única vez que Brasil e Argentina estiveram perto de avançar para um comércio mais livre foi durante as negociações entre o Mercosul e a União Europeia, e isso resultou em um acordo em 2019, mas as circunstâncias são diferentes agora. Naquela época, os dois países tinham governos relativamente pró-livre mercado, e a única razão pela qual o acordo nunca entrou em vigor foram preocupações ambientais e preocupações protecionistas por parte da UE. Hoje, porém, a esquerda está de volta à América do Sul: Lula da Silva já disse que buscará renegociar o acordo em favor do desenvolvimento industrial de seu país, enquanto o presidente argentino Alberto Fernández tem preocupações semelhantes e é ainda mais relutante a seguir em frente. Não parece, então, que o livre comércio esteja nos planos de nenhum dos dois governos.
Citando isso como uma vantagem, no caso da Argentina, algumas autoridades afirmaram que um maior nível de comércio com o Brasil removeria a única barreira ao crescimento econômico do país, mas isso é flagrantemente falso. Embora os consumidores argentinos certamente se beneficiem de bens e serviços mais baratos, é improvável que os obtenham apenas do Brasil, que já é o principal parceiro comercial do país. Mais importante, no entanto, a maioria dos problemas econômicos de longa data da Argentina não tem nada a ver com comércio, mas com políticas fiscais e monetárias irresponsáveis que causaram várias crises de dívida e uma taxa de inflação anual de pouco menos de 100%. São os déficits fiscais persistentes que causam condições estagflacionárias, bem como a “falta de dólares” a que o governo alude: Quando o governo fica com 100 por cento dos lucros comerciais, as pessoas mantêm seu dinheiro longe dele a todo custo.
O que brasileiros e argentinos precisam são de reformas fiscais que permitam aos indivíduos manter mais de seus ganhos e não apenas a metade deles, como é o caso atualmente, mas é improvável que os esquerdistas que agora governam os dois países avancem com cortes de impostos. No caso brasileiro, o ministro da Economia, Fernando Haddad, ainda disse que planeja aumentar significativamente os gastos públicos, algo que o governo argentino também tentou fazer nos últimos anos de forma mais limitada, buscando cumprir um acordo de resgate com o FMI. Mais impostos, mais gastos públicos: nenhum dos dois governos está pensando em reformas para lidar com seus déficits fiscais.
No mínimo, ao invés de uma boa ideia, o anúncio inicial do argentino Sergio Massa e os comentários posteriores feitos por outras autoridades brasileiras e argentinas parecem ter sido uma cortina de fumaça projetada para evitar a discussão da reforma real. De fato, nenhum dos lados está interessado em promover o livre comércio ou em tornar seus países mais atraentes para investidores locais e estrangeiros. Mas, enquanto esses objetivos estiverem fora da agenda, o crescimento econômico provavelmente escapará do Brasil e da Argentina, e a qualidade de vida de seus cidadãos provavelmente não melhorará, não importa quão fortes sejam seus laços protecionistas.
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