Nesta quarta (17)
Proporciona desgastes ao governo em múltiplas frentes
Por
Sílvio Ribas – Gazeta do Povo
Brasília
Plenário da Câmara dos Deputados| Foto: Bruno Spada / Câmara dos Deputados
Antes de completar metade do primeiro ano de governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assistirá nesta semana à abertura da temporada de comissões parlamentares de inquérito (CPIs), cada qual capaz de provocar desgastes em diferentes níveis de intensidade para a imagem dele e prejuízos para a evolução de seus projetos.
Para esta quarta-feira (17) estão previstos o início dos trabalhos de três CPIs na Câmara dos Deputados: manipulação de jogos de futebol por apostas eletrônicas, fraude nas Lojas Americanas e atuação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Também se espera a instalação em paralelo da comissão mista de senadores e deputados (CPMI) para investigar os atos de vandalismo de 8 de janeiro. Confira abaixo mais informações sobre cada uma das CPIs.
Análises de especialistas e políticos consultados pela Gazeta do Povo, aliadas às observações dos líderes parlamentares e ministros responsáveis pela articulação do Planalto no Congresso, indicam a necessidade de esforço considerável para evitar com que as CPI acarretem perda de popularidade e de apoio na base congressual, bem como evitar atrasos ou mesmo derrotas em votações cruciais para o governo.
Durante a reunião do núcleo político do Planalto na segunda-feira (15), Lula mostrou compreender o quadro desfavorável ao governo no Congresso. Ele tomou medidas para conter tumultos causados pela bancada de seu próprio partido na Câmara nas negociações do novo marco fiscal, que é essencial para a continuidade das políticas sociais. O relator do projeto, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), também tem deixado claro que a aprovação da proposta requer o apoio incondicional de toda base governista.
A votação do mecanismo de controle de gastos do governo, agendada para esta semana, é importante para a estabilidade governamental. A reforma tributária também é relevante, embora o seu impacto não seja imediato. A simples menção de avanço na proposta do arcabouço já teve um efeito positivo nesta semana sobre o câmbio e as bolsas.
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Luiz Filipe Freitas, analista político da consultoria Consillium, ressalta que as CPIs são sempre prejudiciais para qualquer governo. Quando várias funcionam ao mesmo tempo, o desafio se torna ainda maior. “Além do impacto na reputação, essas comissões consomem tempo precioso, especialmente quando estamos no meio do ano e começam as discussões sobre o Orçamento de 2024”, afirma.
Segundo ele, mesmo a CPMI de 8 de janeiro, que tende a ser mais favorável ao Executivo devido à maioria governista entre seus membros, exigirá energia e articulação, recursos que também estão sendo solicitados em outras frentes no Congresso. Formalmente criada em 26 de abril com a leitura do seu pedido de abertura em sessão do Congresso, a comissão mista não tem prazo para ser instalada, mas deve avançar até o fim de maio.
O senador Espiridião Amin (PP-SC), 75 anos, provável decano entre os membros da CPMI do 8 de janeiro, deverá ser, portanto, o responsável por presidir a primeira sessão do colegiado, na qual serão eleitos o presidente e o relator. Para ele, a tônica das investigações virá de informações prestadas por órgãos federais de inteligência a membros da CPMI. Os esclarecimentos deverão, ressalta ele, jogar luz sobre “omissões criminosas” que resultaram no vandalismo e, assim, identificar “todos os responsáveis”.
Para o cientista político Marcos Deois, a CPMI do dia 8 de janeiro ainda é a maior incógnita das comissões de inquérito a caminho. “Ninguém garante certa previsibilidade. Hás fatos que serão relembrados, novos agentes serão responsabilizados e são esperados desdobramentos contrários e favoráveis ao governo”, avaliou.
Quanto à CPI do MST, ele compartilha da impressão geral de que o colegiado tende a servir de palco para os parlamentares da oposição, “pois irá potencializar narrativas mais extremistas”.
Deois também entende que a CPI das Apostas Esportivas tende a proporcionar uma investigação mais bem escorada em fatos e revelações já feitas. Essa investigação ganhou ainda mais relevância após vir a público um esquema de apostas envolvendo jogadores de futebol, o qual é investigado pelo Ministério Público de Goiás na operação Penalidade Máxima. Atletas de diversos clubes e divisões do futebol brasileiro teriam recebido dinheiro para forçar cartões e cometer pênaltis. “Cada dia que passa, percebemos novo jogador envolvido. Se a CPI fizer bom trabalho, pode até desarticular provável esquema complexo de corrupção no esporte que é paixão nacional, [o futebol]”, destacou.
Desagravo a invasores de terra amplia ruptura com agronegócio
O cientista político José Amorim acredita que as CPIs serão mais um teste para a governabilidade de Lula, sobretudo a do MST, a mais esperada pela oposição no momento, além da CPMI do 8 de janeiro. “Para um governo que está com a popularidade abaixo do esperado, ter que enfrentar CPIs logo no início do mandato é um risco bastante alto”, observa.
Na avaliação dele, um dos indicativos que o governo petista não queria correr esses riscos foi ter acelerado a liberação de recursos represados para emendas parlamentares. Essa reação pode ter sido tardia ou insuficiente. “Ainda que o governo tenha maioria na CPMI e a oposição corra riscos de amargar perdas nela, a chance de haver desgaste para o Planalto segue alta pela simples exposição favorecida pelo colegiado”, disse.
Para a CPI do MST, colegiado dominado pela oposição, Amorim concorda que o grande esforço dos seus membros será mesmo o de constranger o governo. Em resposta prévia, Lula e os seus ministros deram seguidas mostras nos últimos dias de apoio ao movimento de invasores de terras, ampliando o desgaste com o agronegócio. “Além dos riscos à imagem do governo, é possível que as CPIs atrapalhem a agenda legislativa, incluindo o marco fiscal e a reforma tributária”, complementa.
O governo, contudo, tem usado a estratégia de desdenhar de todas as CPIs, inclusive a dos sem-terra. “Os que imaginam que essa CPI vai ser um espaço para atingir o MST vão dar um tiro no pé”, disse o ministro de Comunicação Social, Paulo Pimenta, no último domingo (14), em feira de integrantes do movimento.
As negociações na Câmara, sob a articulação de Arthur Lira (PP-AL), são um teste importante para as novas relações de poder entre o Executivo e o Legislativo, enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) continua tendo papel relevante na resolução de impasses entre os poderes.
Lira reiterou em entrevistas na segunda-feira (15) que o governo Lula “precisa descentralizar, confiar e delegar poder para melhorar sua articulação política”. No entanto, analistas ressaltam que a gestão ainda é fortemente influenciado pelo PT, que detém os principais cargos de articulação, e parece relutante em ceder posições a outros partidos.
O que deve ser investigado em cada CPI?
CPI das Lojas Americanas
A CPI das Lojas Americanas foi solicitada pelo líder do PP na Câmara, André Fufuca (MA), com o objetivo de investigar as discrepâncias contábeis registradas pela varejista, que resultaram em um rombo bilionário.
O autor do requerimento, que aspira a presidência da comissão, enfatiza a necessidade de esclarecer as circunstâncias das chamadas inconsistências fiscais e informar a população sobre a real situação da empresa, especialmente os investidores do mercado acionário.
Como ocorre com outras CPIs, espera-se que os dois maiores blocos partidários da Casa ocupem a maioria das 34 vagas no colegiado.
CPI das Apostas Esportivas
Autorizada em 26 de abril, a CPI das Apostas Esportivas foi iniciada por meio do requerimento do deputado Felipe Carreras (PSB-PE), membro da base governista. Composta por 34 membros titulares, a comissão tem como objetivo investigar a manipulação de resultados no futebol brasileiro, conforme denúncias surgidas a partir das investigações conduzidas pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO) no âmbito da operação Penalidade Máxima.
Inicialmente, o MP-GO investigou a manipulação de três jogos da última rodada da Série B em 2022, mas as revelações da segunda fase da operação já chegaram a atletas da Série A do futebol brasileiro. Além disso, a CPI também buscará pressionar pela regulamentação do setor.
O deputado Felipe Carreras, autor do requerimento, será o relator da comissão, e a presidência ficará a cargo de André Figueiredo (PDT-CE). Entre os membros esperados, destacam-se parlamentares ligados ao esporte, como Bandeira de Mello (PSB-RJ), ex-presidente do Flamengo, e o ex-jogador de vôlei Maurício de Souza (PL-MG).
CPI do MST
Proposta em março pelo deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS), a CPI do MST tem como objetivo investigar as atividades do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) nos primeiros meses de 2023, visando identificar seu verdadeiro propósito e seus financiadores.
A comissão será composta por 27 membros titulares, incluindo parlamentares ligados ao agronegócio, como Alceu Moreira (MDB-RS) e Júlia Zanatta (PL-SC). Zucco, como autor da proposta, espera ocupar a presidência dos trabalhos, enquanto a relatoria deverá ficar a cargo do deputado Ricardo Salles (PL-SP).
CPMI do 8 de janeiro
Além das CPIs na Câmara, foi proposta uma CPMI composta por deputados e senadores para investigar os atos de vandalismo ocorridos em 8 de janeiro. Essa iniciativa foi proposta pelo deputado de oposição André Fernandes (PL-CE) e enfrentou forte resistência do governo e do presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para ser instalada.
No entanto, após a divulgação de imagens da invasão do Planalto, que contaram com a presença do então ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Marco Gonçalves Dias, os parlamentares da base do governo passaram a apoiar a CPMI. O requerimento foi aprovado em 26 de abril durante uma sessão do Congresso.
A oposição, que é minoria, indicou nomes como os senadores Eduardo Girão (Novo-CE) e Magno Malta (PL-ES), além do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ). Já os representantes do governo são liderados pelos deputados Rogério Correia (PT-MG) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ), bem como pelos senadores Fabiano Contarato (PT-ES) e Rogério Carvalho (PT-SE).
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