Editorial
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Gazeta do Povo


Relator do projeto de lei complementar que institui o novo arcabouço fiscal, Cláudio Cajado (PP-BA), apresentou seu relatório na noite de segunda-feira (15).| Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Na noite de segunda-feira, o relator do projeto de lei do novo arcabouço fiscal, Cláudio Cajado (PP-BA), apresentou a líderes partidários sua proposta para o texto, tornada pública nesta terça-feira. Diante do muito que havia a criticar na regra enviada pelo governo Lula ao Congresso Nacional, e diante das promessas de endurecimento do texto, o resultado final ainda ficou muito brando e preserva alguns dos itens mais problemáticos da âncora criada para substituir o finado teto de gastos instituído em 2016, como reação à gastança desenfreada que jogou o Brasil na pior recessão de sua história, uma herança maldita lulopetista que nem mesmo o caos da pandemia de coronavírus conseguiu superar em termos de estrago na economia nacional.

Quem ouve o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), dizer que “nós temos de construir votos no plenário e há determinados partidos que não votarão se o projeto for muito frouxo, for muito flexível, se não demonstrar as amarras e os enforcements necessários” poderia até pensar que Cajado realmente havia transformado o plano do governo em algo mais sensato, capaz de manter a dívida pública e outros indicadores em patamares aceitáveis, resistindo ao ímpeto gastador petista. Mas, na melhor das hipóteses, o projeto de lei passou apenas de “muito frouxo” e “muito flexível” para “ainda frouxo” e “ainda flexível”.

A versão de Cajado ainda deixa muita margem para irresponsabilidade na condução das contas públicas, sem a correspondente responsabilização caso as escolhas governamentais se revelem um desastre

No fim das contas, as maiores mudanças foram uma série de proibições caso as metas de resultado primário não sejam atingidas, ficando abaixo até mesmo da banda de tolerância de 0,25 ponto porcentual estabelecida no projeto. Há exigências de contingenciamento de recursos em caso de arrecadação inferior à prevista, e restrições à criação de despesas permanentes, à concessão de novos benefícios tributários e à realização de concursos públicos, entre outras vedações, se a meta fiscal não for atingida. Os mesmos gatilhos serão acionados caso as despesas obrigatórias ultrapassem 95% do orçamento, para preservar um mínimo de 5% dos recursos para as despesas discricionárias (de escolha do governo). Algumas exceções à regra fiscal foram incorporadas ao arcabouço. E Cajado não foi muito além disso.

O “piso de gastos”, por exemplo, que garante uma elevação real (acima da inflação) da despesa governamental independentemente do estado da economia, está mantido. O relator apenas reduziu a proporção desse aumento: em vez de 70% da alta da receita dos 12 meses encerrados em junho do ano anterior, esse crescimento seria de no máximo 50% em caso de descumprimento da meta fiscal. Além disso, a impunidade continua garantida: o presidente da República não fica sujeito a penalidade se o resultado primário ficar muito abaixo do previsto; no máximo, será enquadrado na Lei de Responsabilidade Fiscal se não realizar os contingenciamentos ou não obedecer às restrições necessárias, caso os gatilhos sejam disparados. Com isso, o principal “estímulo” para que um governo gastador como o petista mantenha as contas em ordem (na ausência de uma convicção autêntica sobre a importância da responsabilidade fiscal) segue inexistindo.

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A tramitação em regime de urgência, que Lira e o governo querem aprovar nesta quarta-feira, diminuirá ainda mais as oportunidades para que o novo arcabouço seja enfim transformado naquilo que o Banco Central chama de “sólido e crível”, os pressupostos para que haja a tão desejada “ancoragem de expectativas” de inflação. A versão de Cajado ainda deixa muita margem para irresponsabilidade na condução das contas públicas, sem a correspondente responsabilização caso as escolhas governamentais se revelem um desastre. Se a oposição na Câmara não se levantar contra esse texto com a mesma energia com que freou a tramitação do PL das Fake News, a casa terá desperdiçado a chance de dar ao país uma regra fiscal digna do nome.

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