Por Roberta Jansen – Jornal Estadão
Documento da Confedereação Nacional da Indústria (CNI) entregue ao governo reforça importância do ensino profissionalizante
A reforma educacional é crucial para a retomada do crescimento do País, segundo o Plano de Retomada da Indústria, apresentado nesta quinta-feira, 25, pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) ao governo federal. De acordo com o documento, a educação profissional, nos moldes do que vem sendo feito nos países mais desenvolvidos, deve ser uma prioridade.
Também nesta quinta-feira, em artigo publicado no Estadão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice Geraldo Alckmin defenderam a indústria como “fio condutor” de uma política econômica voltada para a geração de renda e de emprego.
O plano apresenta cinco ações na área da educação, “que buscam garantir a formação dos jovens para o mercado de trabalho, com uma política nacional de educação profissional e tecnológica, e a plena implementação do novo ensino médio – em especial o itinerário de formação técnica e profissional – e com a modernização do sistema de aprendizagem.”
A educadora Cláudia Costin, presidente do Instituto Singularidades, cita algumas medidas práticas que poderiam ser adotadas o mais rapidamente possível. “Num contexto de automação acelerada, digitalização, inteligência artificial, precisamos educar para duas coisas simultaneamente: desenvolver o pensamento crítico e o pensamento criativo; precisamos educar os alunos para serem pensadores autônomos e criativos”, afirmou.
“Mas o que o Brasil pode fazer? Em primeiro lugar, parar com essa história de quatro horas de aula por dia. Nenhum país que se industrializou tem quatro horas de aula por dia, mas, sim, de sete a nova horas. Não apenas aulas, mas laboratório, experimentação. É um processo de educação mais mão na massa, digamos assim. A outra coisa é evitar essa educação conteudista, em que os professores despejam um conteúdo e não ensinam os alunos a pensar.”
Dentre as ações listadas no Plano de Retomada da Indústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI) estão a implementação do novo ensino médio, a modernização do aprendizado profissional, a implementação de uma proposta nacional de reconhecimento de saberes com base em competências e habilidades, a elaboração de uma política nacional de educação profissional e tecnológica adequada à oferta e às demandas de médio e longo prazo dos setores produtivos e o desenvolvimento de uma política pública de requalificação profissional e aperfeiçoamento de trabalhadores.
“Se o governo quer uma reindustrialização nos moldes do passado, como o investimento em carros populares, por exemplo, na indústria pesada, mais tradicional, é preciso termos uma qualificação laboral e uma educação de base muito melhor do que temos hoje”, afirmou o pesquisador João Marcelo Borges, do Centro de Desenvolvimento da Gestão Pública e Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (DGPE/FGV). “Hoje, os 20% dos nossos alunos mais ricos têm uma proficiência em matemática, linguagem e ciência pior do que os 20% mais pobres da Coreia do Sul. Esse é o tamanho da distância.”
No entanto, pondera Borges, se a ideia é investir numa industrialização mais moderna, o desafio é ainda maior. “Se quisermos disputar indústrias do presente e do futuro, não nos basta reduzir essa diferença, mas sim incorporar ao nosso ensino o desenvolvimento de competências como o pensamento crítico e o estímulo à criatividade, que são as competências exigidas na parte da inovação”, explicou. “Isso sequer começamos a fazer.”
Na análise do diretor de Educação e Tecnologia da CNI, Rafael Lucchesi, o foco deve ser no ensino profissionalizante. “Além da deficiência estrutural de qualidade, a matriz educacional brasileira é bem diversa da de outros países. Nos países desenvolvidos e nos emergentes mais bem sucedidos, 50% dos jovens de 15 a 17 anos têm a educação profissional junto com a regular; na Áustria e na Finlândia, esse percentual é acima dos 70%. No Brasil, apenas 9% dos jovens têm isso. Ou seja, o sistema não dá ao jovem uma identidade social”, afirmou Lucchesi.
Para o especialista, o ensino profissionalizante não exclui o ensino de um pensamento crítico e criativo, necessário para a indústria do futuro. “A sociedade brasileira tem uma concepção escravocrata, uma lógica elitista, segundo a qual a universidade está acima do bem e do mal”, disse. “Em todo o mundo, a escola é muito mais democrática do que no Brasil, ela dá a todos os jovens uma identidade social. Aqui, até a reforma do ensino médio, a escola reafirma o abismo elitista.”
João Marcelo Borges frisa, no entanto, que o foco não pode ser apenas na educação básica dos jovens, mas também a qualificação do empresariado. “As empresas brasileiras têm baixa produtividade por conta da qualificação da força de trabalho, sim, mas também por conta da péssima qualidade dos métodos empresariais e gerenciais”, afirmou o especialista da FGV. “Precisamos reformar a agenda da educação básica, mas também a qualificação dos empresários, para que usem métodos mais produtivos.”