História por PODER360
O Senado espera receber em agosto a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 45/2019, que trata da reforma tributária. A Câmara ainda não enviou a proposta, que foi aprovada pelos deputados em 7 de julho, mas deverá fazê-lo depois do recesso parlamentar, conforme anunciou o senador Eduardo Braga (MDB-AM).
Tanto ele quanto outros senadores já identificaram pontos no texto aprovado pelos deputados que podem ser alterados na tramitação no Senado, principalmente aqueles introduzidos no final da tramitação na Câmara.
Braga foi designado relator na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). O presidente espera que o texto seja votado até outubro e promulgado ainda em 2023.
“Estimamos um prazo de 2 ou três meses para o amadurecimento de todos os pontos [da reforma]. O Congresso deve uma reforma tributária ao Brasil, tenho muita convicção de que a entregaremos ainda esse ano“, disse Pacheco.
O tema da reforma tributária tem sido discutido no Congresso Nacional há 3 décadas, mas nunca foi aprovada uma modificação sistemática. Em seu perfil no Twitter, Pacheco defendeu que o Brasil tenha, o mais rápido possível, um modelo tributário simplificado e moderno. Esses são os objetivos principais da PEC, que transformará 5 tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) em 3: o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e o Imposto Seletivo. Cada novo tributo terá um período de transição.
Próximos passos
A CCJ será a única comissão em que a PEC passará antes de ser analisada em Plenário. Segundo Eduardo Braga, o plano de trabalho deverá ser apresentado em agosto e terá destaque para conflitos sobre a autonomia dos Estados e municípios.
“[A possibilidade de os estados criarem novos tributos] será um dos pontos que terá ênfase no plano de trabalho. Teremos reuniões com as diversas instâncias federativas. Acho que a Câmara discutiu muitos conceitos, [mas] nós queremos quantificar esse modelo e verificar seus impactos. Apenas com os resultados desses modelos sendo rodados a gente poderá ter ideia [se aumentará carga tributária ou não]. Mas uma coisa eu posso dizer: não vejo espaço para aumento de carga tributária no país“, disse Braga em entrevista coletiva, rechaçando a possibilidade de a reforma ser fatiada para uma aprovação rápida.
Depois da tramitação oficial do texto, o relator terá 15 dias úteis para elaborar seu relatório e a CCJ terá 30 dias úteis para emitir parecer.
O presidente da CAE (Comissão de Assuntos Econômicos), senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), disse que o colegiado contribuirá para os debates com até 3 audiências públicas por semana.
“Vamos instruir um grupo de trabalho para fazer audiências públicas ouvindo os setores [da economia], o governo e as prefeituras para colaborar com o relator, que também fará parte do grupo. Tão logo voltar do recesso, a gente vai começar a marcar essas audiências públicas, podendo ser duas ou três por semana, devido à urgência. Tem diversos pontos em que há polêmica e que com certeza devem ser alterados“, afirmou Vanderlan.
Apesar de a versão original da PEC ter sido apresentada em 2019 na Câmara, o texto atual foi resultado de negociações que a mesclaram com a PEC 110/2019, apresentada primeiramente pelo senador Davi Alcolumbre (União-AP), atual presidente da CCJ. Outra proposta apresentada no Senado é a PEC 46/2022, do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR). Ela é apoiada por alguns críticos da reforma em discussão, como o senador Luis Carlos Heinze (PP-RS).
Para ser aprovada a mudança na Constituição, é necessário o apoio de 3/5 dos 81 senadores em uma 1ª votação. Depois, é preciso aguardar 5 dias ou 5 sessões para fazer uma 2ª deliberação, que também deverá ter 3/5 de votos favoráveis. É preciso total concordância entre as Casas, de modo que as alterações no Senado retornam para a Câmara. Aprovada, a emenda é promulgada pelas Mesas das duas Casas em sessão solene do Congresso Nacional. Por se tratar de Emenda Constitucional, não há participação ou necessidade de sanção pelo presidente da República.
Caso a PEC da reforma tributária seja aprovada e promulgada, o governo deverá enviar ao Congresso, em 180 dias, uma 2ª reforma: um projeto de lei de reforma sobre o Imposto de Renda.
Possíveis mudanças
As principais críticas dos senadores recaem sobre dispositivos modificados de última hora na Câmara. O relator Eduardo Braga já se pronunciou contrariamente à possibilidade de Estados criarem novo tributo para produtos primários e semielaborados.
“Vão merecer nossa atenção alguns dos artigos incluídos de última hora […] [como] o artigo 20, pelo qual os Estados poderão criar uma nova contribuição para as atividades de agropecuária, mineração e petróleo. Esse novo tributo parece estranho, já que um dos fundamentos da reforma é a simplificação tributária”, escreveu Braga em seu perfil no Twitter.
O artigo foi incluído para atender governadores do Centro-Oeste, cujos Estados temem perder arrecadação. Com a novidade da tributação no local de consumo, esses Estados, que são grandes produtores do setor primário, poderiam ter queda no recolhimento de tributos.
A transição para o IBS também impactará a arrecadação dos Estados que concedem benefícios fiscais no ICMS, em troca de aportes feitos pelas empresas beneficiadas em fundos governamentais de compensação, para investimentos e habitação. A possibilidade de tributar com uma nova contribuição seria para compensar essas perdas de arrecadação.
O senador Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo na Casa, espera que volte a constar na reforma a prorrogação de benefícios fiscais do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), que será extinto, para plantas automobilísticas nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste até dezembro de 2032. Essa previsão também foi retirada na Câmara na votação do dia 7 de julho. Para o senador Angelo Coronel (PSD-BA), benefícios fiscais são vitais para a indústria de sua região.
“Qual empresa grande vai se instalar no Nordeste se não houver o incentivo fiscal dado pelos governos?“, questionou em entrevista à TV Senado.
Regimes diferenciados
Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder do governo no Congresso Nacional, o Senado poderá diminuir a quantidade de setores que se beneficiam de isenções ou alíquotas menores. Segundo Randolfe, muitas isenções aumentarão a alíquota dos novos tributos para os demais setores, para compensar a perda em arrecadação.
“Quanto mais isenções, maior a alíquota será. O Senado vai ter que cumprir esse papel de tentar ajustar ou reduzir o número de isenções para poder reduzir, ao fim, o percentual da alíquota. Esse é o desafio“, disse o senador.
O texto da PEC inclui serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos nos regimes especiais de tributação, em que há aplicação de alíquotas diferenciadas em razão da natureza da atividade, mas não necessariamente menores. É o que ocorre com bancos e seguros, por exemplo.
Já setores como educação, saúde e medicamentos devem ter regimes que poderão ter diminuição das alíquotas da CBS e do IBS, juntas, de 60% a 100% (ou seja, imposto zerado). Uma lei complementar definirá que tipos de serviços ou de bens desses setores serão beneficiados e as formas de compensar a arrecadação governamental. Também serão contemplados ramos da cultura, de produtos agropecuários, de transporte coletivo de passageiros e de alimentos.
Tributos estaduais e municipais
O IBS, que será disciplinado por lei complementar, substituirá definitivamente o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) nos Estados e o Imposto sobre Serviços (ISS) em 2033. Como os valores arrecadados em IBS serão agregados nacionalmente, haverá um conselho federativo que irá gerir esses recursos e distribuir os valores entre os entes federativos. O conselho terá 27 representantes estaduais (um para cada Estado e o Distrito Federal) e 27 dos municípios e do DF.
A nova dinâmica difere das regras atuais, em que cada Estado e cada município gere com autonomia seus impostos. Por essa razão, a instituição do conselho recebe críticas de senadores da oposição, como Hamilton Mourão (Republicanos-RS), para quem o modelo “rompe o pacto federativo”.
O senador Rogerio Marinho (PL-RN) considera que a figura do conselho federativo não é oportuna e que o texto precisa de mais tempo para debate.
“O projeto de fato foi apresentado 10 minutos antes do [início da sessão do] Plenário da Câmara. Não tenho dúvida que a grande maioria dos parlamentares votou sem conhecer as minúcias e os impactos [do texto]. O governo sequer teve a preocupação de acompanhar essa discussão, todas as concessões que foram feitas não passaram pelo crivo da Receita Federal, do Ministério da Fazenda… Há necessidade enorme que o Senado se debruce para verificar as incongruências. Defendemos a descentralização dos recursos, [e] a criação desse conselho que concentra os recursos no governo federal para depois distribuir [os impostos arrecadados] para estados e municípios vai na contramão do que entendemos como adequado“, apontou Marinho.
Durante o período de transição entre a implementação do IBS e extinção do ICMS e ISS, que durará de 2029 a 2034, 90% do montante arrecadado será redistribuído pelo conselho entre os Estados e municípios, respeitando a proporção média de receita arrecadada entre 2024 e 2028. A medida busca evitar a perda de arrecadação, apesar de ser inevitável que alguns entes arrecadem em quantidade maior ou menor com relação ao modelo atual.
As regras de distribuição do IBS entre os entes terão uma longa transição de 50 anos (de 2029 a 2078). Também caberá ao Conselho Federativo decidir sobre a gestão desses recursos. Serão aprovadas as definições acordadas , simultaneamente, pela maioria absoluta dos representantes dos municípios e pela maioria absoluta dos representantes estaduais que, somados, correspondam a pelo menos 60% da população brasileira.
Quanto à arrecadação dos contribuintes, o IBS terá período de transição de 4 anos (de 2029 a 2033), em que os entes cobrarão só partes do ICMS e o ISS, a cada ano menores. Concomitantemente, o IBS será cobrado progressivamente para compensar a diminuição desses impostos. O IBS terá uma alíquota de referência estipulada pelo Senado, mas cada ente definirá a sua. O contribuinte pagará a soma da alíquota estadual e da municipal.
Antes da transição, o IBS poderá ser testado com a alíquota de 0,1% a partir de 2026. Os contribuintes enquadrados nesse teste poderão ser compensados com valores menores no PIS ou Cofins, ou de outra forma que lei complementar definir.
Com informações da Agência Senado.