História por admin3 • IstoÉ Dinheiro

O Brexit é excelente exemplo de causas e consequências de decisões político-econômicas. Desde o referendo popular que decidiu pela saída do Reino Unido da União Europeia (UE), em junho de 2016, até a retirada definitiva, em janeiro de 2020, houve ainda três adiamentos pelo caminho. Agora, após pouco mais de três anos é possível avaliar com consistência os resultados. E o impacto é significativo na economia inglesa e no seu sistema financeiro.

A curto prazo, o Brexit levou a um declínio na confiança do mercado e à incerteza em torno do futuro das relações comerciais do Reino Unido com a UE. Isso afetou negativamente a economia, com uma queda no valor da libra esterlina e aumento na inflação. A saída do Reino Unido da UE também afetou as cadeias de suprimentos e a livre circulação de pessoas, o que afetou muitos setores, como o de manufatura e o turismo, mas o financeiro foi particularmente afetado pelo Brexit, já que muitas instituições baseadas em Londres usavam o Reino Unido como porta de entrada para o mercado único da UE. Como resultado, muitas empresas financeiras transferiram operações à UE para garantir acesso contínuo ao mercado único.

O orgão responsável pelo orçamento inglês, Office for Budget Responsability (OBR). Em março de 2023 o OBR estabeleceu três prioridades para este ano: reduzir a inflação para metade de 2022, crescer a economia e reduzir a relação dívida/PIB (hoje em 100%). Nesse sentido, o OBR espera que o núcleo da inflação caia do pico de 10,7% no último trimestre de 2022 para 2,9% no quarto trimestre de 2023 sendo que a inflação cheia deve atingir 6,1% este ano. O crescimento da Inglaterra em 2022 foi de 4,1%. Em comparação com o ano passado o crescimento da economia inglesa estará comprometido em 2023, devendo crescer no máximo 1% este ano. Nos anos seguintes de 2024 e 2025 a expectativa é de crescimento de 1,8% e 2,5% respectivamente, em parte devido à queda de juros e redução dos preços da energia que deverá trazer a inflação de volta à meta de 2%.

Em resumo, as metas OBR não serão realizadas. Hoje, para dois terços da população inglesa o Brexit foi um erro. Há quatro motivos para tanto. O primeiro é o comércio entre países. O próprio OBR enfatizou que houve queda significativa do comércio inglês como proporção do PIB, maior do a verificada em que qualquer outro país, em virtude das maiores barreiras comerciais impostas pelo Brexit. O segundo impacto negativo foi a queda da imigração para a Inglaterra. Assim, por exemplo, é comum percebemos a ausência de veterinários no país, visto que esses profissionais deixaram a Inglaterra para atuar nos demais países europeus. Os setores mais afetados pelo Brexit foram os de transportes, hospitalidade e comércio. O terceiro fator é a queda na taxa de investimento. Muito embora o investimento pré-Brexit tenha sido baixo, há dados agregados que evidenciam que a incerteza gerada pela saída da UE foi responsável por uma queda de até 10% no investimento. Isso se traduziu em redução da produtividade e, portanto, do PIB em cerca de 1%. O quarto e último é o fato de os acordos comerciais pré-Brexit terem sido revogados e até o momento não foram retomados. Ou seja, acordos comerciais com potências como Estados Unidos e China estão no limbo, ainda aguardando novidades da economia inglesa.

Em síntese, qual é a conclusão? Primeiro, a população está certa e o Brexit prejudicou a economia inglesa. E os mecanismos e impactos se revelaram mais complexos do que os modelos macro e de comércio foram capazes de prever. Não obstante, a grande maioria de especialistas previu corretamente que o Brexit traria no curto prazo uma perda de PIB que poderia chegar até 4%. Tais efeitos seriam transitórios, e de curto prazo. À medida que a economia se reorganizasse ela poderia se reerguer e estabelecer novos acordos de comércio e regras migratórias que trariam de volta a corrente de comércio e a entrada de pessoas na Inglaterra. Resta saber se a popularidade do governo será sustentada em níveis elevados para ultrapassar esse tal ‘curto prazo’.

Vitoria Saddi, PhD em economia pela University of Southern California, é estrategista da SM futures. Atuou como economista-chefe da Roudini Global, do Citibank, da Queluz Asset e do Salomon Brothers

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