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- Author,Jonathan Beale
- Role,Correspondente de defesa da BBC News Brasil
Passaram-se quase duas semanas desde que Israel lançou a sua ofensiva terrestre em Gaza e mais de um mês desde que iniciou bombardeios aéreos intensivos contra o Hamas, em resposta aos ataques brutais em Israel, nos quais mais de 1,4 mil pessoas foram mortas.
O objetivo militar declarado desde o início pelas forças israelenses foi destruir o Hamas, militar e politicamente.
Mas Israel está mais perto de atingir essa meta? E ela é de fato alcançável?
Segundo Israel, isso é só o começo – o país tem afirmado repetidamente que esta operação será longa e difícil.
Um alto funcionário das Forças de Defesa de Israel (FDI) que falou à BBC usou a analogia de uma luta de boxe: “Este é apenas o quarto round de 15.”
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Ninguém em Israel diz exatamente quanto tempo estima que vai durar a guerra.
Alguns apontam para o fato de que foram necessários nove meses para que as forças iraquianas apoiadas por outros países recuperassem a cidade de Mossul do grupo Estado Islâmico em 2017.
Israel pode querer continuar lutando por mais vários meses, embora possa não controlar o calendário, à medida que aumenta a pressão internacional para uma pausa nos combates ou mesmo um cessar-fogo.
Perdas militares
Até agora, Israel afirma ter realizado mais de 14 mil ataques e matado dezenas de alvos de alta relevância, incluindo comandantes do Hamas.
Cada um desses ataques envolve múltiplas armas.
Yaakov Katz, especialista militar e ex-editor do jornal Jerusalem Post, diz que Israel já disparou mais de 23 mil munições.
A título de comparação, no auge da batalha por Mossul, os aliados lançaram cerca de 500 bombas por semana sobre alvos do Estado Islâmico.
Mais de 10,8 mil pessoas em Gaza foram mortas desde o início da guerra, segundo o ministério da Saúde administrado pelo Hamas, incluindo mais de 4,4 mil crianças.
Os militares afirmam que as forças terrestres israelenses dividiram com sucesso a Faixa de Gaza entre norte e sul e que suas tropas cercaram a cidade de Gaza.
Eles alegam que estão agora “no coração da cidade”, embora ainda estejam distantes de reivindicar o controle do local.
O Hamas nega que as forças israelenses tenham obtido quaisquer ganhos significativos ou que tenham penetrado profundamente na cidade de Gaza.
Esta fase inicial da ofensiva terrestre de Israel parece estar correndo como planejado, com o objetivo de isolar o Hamas, e é provável que o custo para o grupo tenha sido elevado.
As estimativas no início da guerra sugeriam que o Hamas tinha entre 30 mil e 40 mil combatentes.
Uma importante fonte da defesa israelense disse à BBC que cerca de 10% desse total – 4 mil combatentes – foram mortos.
Essas estimativas são impossíveis de verificar e devem ser tratadas com cautela, mas a escala da campanha de bombardeio israelense já deve ter afetado a capacidade de combate do Hamas.
Em contraste, as perdas militares israelenses parecem ter sido relativamente baixas.
Israel afirma que 34 dos seus soldados foram mortos desde o início das operações terrestres.
Yossi Kuperwasser, especialista israelense em inteligência e segurança, diz que os militares estão conduzindo suas operações terrestres “com mais cuidado e cautela” para evitar baixas significativas entre as tropas.
Ainda não está claro quanto do Hamas permanece no norte, quantos combatentes poderão ainda estar escondidos em túneis subterrâneos em Gaza ou quantos poderão ter se misturado à população civil que fugiu para o sul.
Os túneis ainda representam um desafio significativo para Israel.
As forças israelense estão tentando explodir os túneis que encontram, em vez de se envolverem em combates subterrâneos.
Desafios da guerra urbana
A vantagem de Israel em termos de inteligência e capacidades militares é evidente.
Israel pode interceptar comunicações e até desligar as redes de telefonia móvel e de internet de Gaza. Possui total superioridade aérea com jatos e drones capazes de monitorar todos os movimentos em solo – mas não abaixo da superfície.
Uma alta fonte da defesa israelense disse à BBC que os militares do país ainda identificavam mais de 100 novos alvos por dia, embora esse número deva diminuir à medida em que a guerra continua.
Quanto mais tempo o conflito durar, mais Israel terá de contar com tropas em terra para identificar e eliminar a resistência.
Justin Crump, um antigo oficial do Exército Britânico que agora dirige a Sibylline, uma empresa de inteligência de risco, diz que Israel parece estar fazendo progressos razoáveis dada a densidade do terreno, mas “agora vai encontrar as áreas urbanas mais fortemente defendidas da cidade”.
As tropas israelenses são mais bem equipadas e treinadas, mas a guerra urbana ainda pode ser difícil mesmo para forças armadas mais sofisticadas.
Até agora, os combates corpo-a-corpo em terra parecem ter sido limitados – e certamente não se comparam – à escala da guerra urbana que tem ocorrido entre Rússia e Ucrânia em cidades como Bakhmut.
Muitos dos vídeos divulgados pelas FDI mostram o uso de tanques e blindados.
Israel também não comprometeu todas as suas forças na operação.
Alguns estimam que possa haver apenas 30 mil soldados israelenses dentro de Gaza até agora.
Essa é uma fração relativamente pequena do total – Israel conta com 160 mil militares na ativa e mais de 360 mil reservistas.
Crump diz que a questão é: quantos membros da infantaria estão dispostos a se comprometer a varrer todos os edifícios e o labirinto de túneis do Hamas?
Em vez disso, Israel pode optar por atacar os redutos do grupo. Ele acredita que Israel tentará evitar combates bloco a bloco, até porque isso poderia levar a muitas baixas.
Também certamente colocaria em risco a vida dos mais de 200 reféns detidos pelo Hamas.
Plano pós-invasão
Tudo isso levanta a questão de se o objetivo de guerra declarado por Israel – destruir o Hamas – é realmente alcançável.
Mesmo altos funcionários do governo israelense reconhecem que é impossível destruir uma ideologia com bombas e balas.
Parte da liderança do grupo nem sequer está em Gaza.
Katz diz que, se membros do Hamas conseguirem sobreviver a esta guerra, poderão alegar que “porque ainda estamos aqui, na verdade vencemos”.
Por essa razão, Crump acredita que os objetivos de guerra de Israel poderiam passar de destruir o Hamas para puni-lo, de forma a garantir que os ataques de 7 de outubro não se repitam.
Israel também está sob crescente pressão, especialmente por parte dos EUA, para explicar o que vai acontecer depois da invasão.
Uma fonte da defesa israelense diz que Winston Churchill não estava pensando no plano Marshall para reconstruir a Alemanha quando ajudou a lançar a invasão dos aliados no Dia D da Segunda Guerra Mundial.
Mas as guerras raramente são vencidas sem um plano pós-invasão – algo que tem estado completamente ausente na operação militar de Israel até agora.