História por RANIER BRAGON • Folha de S.Paulo
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ex-diretor geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) Alexandre Ramagem não fez o checklist patrimonial padrão de saída, assim como faltou à entrevista em que seria firmado o termo de confidencialidade sobre sua atividade no cargo, aponta resultado parcial de investigação interna do órgão.
A agência iniciou a apuração na quinta-feira (25), após vir à tona a notícia de que a Polícia Federal encontrou em endereços do ex-diretor um computador, um aparelho celular e possivelmente pendrives físicos de criptografia de propriedade da Abin.
Ramagem chefiou a Abin na gestão de Jair Bolsonaro (PL) e deixou o cargo em 30 de março de 2022 para disputar as eleições daquele ano. Ele é, atualmente, deputado federal pelo PL do Rio de Janeiro.
De acordo com informações obtidas pela Folha, todo servidor da agência de inteligência que se desligue da função precisa passar por um checklist patrimonial obtendo uma declaração formal de todos os setores de que ele devolveu os equipamentos que, por ventura, estava usando.
Além disso, é feita uma entrevista em que o servidor se compromete a manter a confidencialidade dos atos relacionados à sua atividade na Abin.
Segundo o resultado parcial da apuração da agência, o acesso de Ramagem ao sistema interno do órgão de inteligência foi cortado no dia da exoneração. Os equipamentos fixos de sua sala de trabalho foram todos devolvidos.
A Abin está promovendo uma busca nos órgãos internos para saber de onde eram o computador, o celular e os pendrives encontrado com Ramagem.
Embora tenha sido chamado para a entrevista em que deveria firmar o termo de confidencialidade, o ex-diretor não compareceu, mostra a apuração interna.
A Folha tentou contato com a assessoria de Ramagem neste sábado (27), mas não obteve resposta.
Em entrevista à GloboNews na quinta-feira, o ex-diretor da Abin negou qualquer utilização ou relação com a ferramenta de espionagem alvo da investigação e afirmou não ter devolvido equipamentos da agência por achar que tinha autorização para permanecer com eles.
“Nunca tivemos a utilização, execução, gestão ou senha desses sistemas”, disse, se referindo a ele e sua equipe direta.
Sobre os equipamentos, afirmou que todos são obsoletos e sem uso. “Poderia devolver, mas estavam ali, eu não sabia. Pensei que fossem da Polícia Federal antigos, que eu tenho direito à custódia, à cautela. Era um telefone antigo, um computador antigo, que estavam ali há mais de anos, sem entrar em qualquer tecnologia da Abin e sem ter contatos com o sistema da empresa.”
Ramagem está no centro da investigação sobre a utilização pela Abin, de 2019 a 2021, do software israelense FirstMile. A suspeita da Polícia Federal é que a ferramenta tenha sido usada pela gestão Bolsonaro para espionar ilegalmente adversários políticos.
O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), já autorizou duas operações de busca e apreensão contra alvos da investigação, uma em outubro do ano passado e a outra na quinta-feira, ocasião em Ramagem teve o gabinete na Câmara dos Deputados e seu endereço no Rio vasculhados.
As operações também acirraram os ânimos entre a cúpula da PF e da Abin. No pedido feito a Moraes para a realização da última operação, a PF afirma que a atual gestão firmou um “conluio” para dificultar as investigações e proteger servidores implicados no uso irregular da ferramenta.
Chefia o órgão de inteligência o delegado da Polícia Federal Luiz Fernando Corrêa. Nos bastidores, ele ocupa grupo oposto ao do diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues.
Nas duas operações a PF pediu e Moraes autorizou buscas na sede da Abin, em Brasília.
A agência de inteligência nega qualquer tipo de conluio, dizendo ter sempre colaborado e ter atendido a todas as solicitações feitas pela PF desde a instauração do inquérito, em março.