Embora eleição seja somente em 2025, ações do deputado em defesa de mais verbas para emendas parlamentares também têm esse pano de fundo, na análise do Executivo; leia bastidor
Por Vera Rosa – Jornal Estadão
BRASÍLIA – O discurso do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), na sessão de abertura dos trabalhos legislativos escancarou a crise política entre o Centrão e o Palácio do Planalto. Mas, mesmo que tivesse dito a metade do que disse, Lira não deixaria dúvida sobre sua intenção de jogar duro com o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, articulador político do governo. E o presidente Lula não gostou nada do que viu.
Durante toda a sessão solene desta segunda-feira, 5, realizada no plenário da Câmara, Lira nem olhou para Padilha, embora estivesse sentado bem perto dele, a apenas uma cadeira de distância. Antes mesmo da manifestação em que mandou diversos recados ao Planalto e pôs a faca no pescoço do governo, Lira só conversava com Rui Costa, que estava entre os dois. Padilha era ignorado.
“Não fomos eleitos para sermos carimbadores”, afirmou o presidente da Câmara, líder do Centrão, sob palmas do plenário. “O Orçamento é de todos os brasileiros, não é – e nem pode ser – de autoria exclusiva do Poder Executivo”.
Enquanto Lira vociferava, Padilha aplaudia, sorria para deputados do PT e fazia sinal de positivo com os dois polegares. Saiu do plenário abraçando colegas. Antes do discurso, tentou pôr panos quentes na crise.
“Não (comando) Ministério das Relações interpessoais. É Ministério das Relações Institucionais”, afirmou Padilha, ao negar rompimento com Lira. “Esse governo não gera conflito, nem entra em conflito.”
Na prática, porém, Padilha e Lira nem se falam mais. O presidente da Câmara acusa o governo de não cumprir acordos e de segurar a liberação de emendas parlamentares. Recentemente, Lula vetou as emendas de comissão dos parlamentares, que totalizavam R$ 5,6 bilhões, e a desoneração da folha de pagamentos. O Congresso se prepara para derrubar os dois vetos, mas, mesmo assim, Lira debita toda a sua ira na conta do articulador político do Planalto e quer a sua cabeça. Como mostrou a Coluna do Estadão, Lula não vai ceder.
Rui Costa tenta amenizar o confronto e Pacheco vira fiel da balança
“Não achei nada de preocupante no discurso”, desconversou Rui Costa, ao deixar o plenário da Câmara. “A gente só consegue as coisas no diálogo, conversando. Todos nós queremos o entendimento.”
Nos bastidores, porém, auxiliares de Lula interpretaram a manifestação de Lira como um sinal de que ele, literalmente, falou para a plateia e também para o baixo clero, uma vez que quer apoio para eleger o seu sucessor ao comando da Câmara. As eleições que renovarão as presidências da Câmara e do Senado só ocorrerão em fevereiro de 2025, mas todas as ações, de agora em diante, têm essa disputa no horizonte. Lira ainda não bateu o martelo sobre quem será seu candidato, mas, a preço de hoje, o nome mais cotado no seu grupo é o do deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA).
Ao contrário de Lira, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), fez um discurso sem tom de revolta, mesmo defendendo pautas que causam incômodo na Praça dos Três Poderes, como a fixação de mandatos para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a redução de decisões individuais de magistrados e o fim da reeleição no Executivo.
Mas, com seu jeito mineiro, Pacheco – que só conheceu pessoalmente Lula em 2019 – caiu nas graças do presidente e, apesar de oscilar o discurso entre a defesa de ações do governo e iniciativas bolsonaristas contra o STF, tem tudo para contar com o apoio do Planalto ao Palácio da Liberdade, em 2026. Assim, sem que ninguém imaginasse, Pacheco se transformou nessa história em uma espécie de fiel da balança da crise entre Lira e o Planalto.