História de Carlos Castelo – Jornal Estadão
Mais vale o bom nome do que o melhor dos perfumes”. (Eclesiastes, 7:1).
(Designer) Foto:© Fornecido por Estadão
Era um perfume muito, muito ruim. Ao ser borrifado, as rosas murchavam, os pombos caíam dos telhados e os gatos saíam correndo para debaixo dos sofás. Chamava-se Eau de Fèces, e sua fragrância era uma mistura de alho, Pato Purific e meias suadas.
Os fabricantes desse produto, de fato, eram verdadeiros mestres da ilusão. Eles o embalavam em frascos de cristal, com rótulos dourados e preços exorbitantes. A etiqueta dizia: “feito com ingredientes raros, colhidos na natureza, por gnomos fascistas”. Muitas pessoas compravam Eau de Fèces como se fosse uma poção mágica. Na real, era uma infusão trágica.
Ninguém conseguia usar aquela água catinguenta por mais de dois minutos. Os corajosos que tentavam aplicá-la em seus pulsos eram, no ato, cercados por uma nuvem de moscas varejeiras. Os vizinhos batiam à porta, exigindo que parassem de emanar aquele futum. Mas, por incrível que pareça, as vendas continuavam a subir, subir.
As teorias sobre o sucesso do Eau de Fèces eram variadas. Alguns diziam que era um item de status: “se você pode pagar por isso, é porque está acima das preocupações mundanas, como o olfato”. Outros acreditavam que o perfume era parte de uma conspiração global para manter as pessoas afastadas umas das outras, evitando assim o contágio por enfermidades respiratórias.
Um dia, um repórter free lance decidiu desvendar o mistério. Seguiu o rastro da fragrância até um galpão abandonado nos arredores do Distrito Federal. Lá, encontrou um casal. Os dois riam histericamente enquanto misturavam raízes e outros ingredientes fétidos num caldeirão.
Súbito, o homem parou de gargalhar e olhou direto para o jornalista. Disparou, com os olhos vidrados:
“Meu amigo, agora que descobriu tudo, veja como nosso segredo é simples: as pessoas amam odiar. Elas pagam caro por essa essência para reclamar dela, para depois se unirem em sua aversão coletiva. Nosso sucesso foi colocar no mercado uma experiência compartilhada, uma catarse olfativa!”
O repórter ficou perplexo. “Mas por que não fizeram um perfume bom?” – indagou.
“Ah”, disse o homem, “perfumes bons são logo esquecidos. Como os tiranos e genocidas, os perfumes horríveis são lembrados para sempre”.
“E, além disso, o Eau de Fèces é um excelente repelente de mosquitos da dengue e chicungunha” – acrescentou a esposa.
E, assim, a inusitada colônia continuou a vender feito pão quente, apesar de seu odor de cachorro molhado. As pessoas passaram até a adquiri-la como uma espécie de desafio pessoal, uma prova de resistência.
Dia desses, o casal que trouxe ao mundo o Eau de Fèces se mudou de cidade. Por razões que fogem ao conhecimento público, agora residem num presídio federal. Ali, rodeados por coisas malcheirosas, convivem felizes como dois gambás numa fossa séptica.