História de Notas & Informações – Jornal Estadão

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e seu antecessor, Davi Alcolumbre, manobram para constitucionalizar mais um privilégio para juízes e procuradores: um adicional automático de 5% ao salário a cada cinco anos. A PEC do Quinquênio é uma iniciativa ultrajante do Congresso cultivada por decisões ultrajantes do Judiciário.

Os proponentes alegam que não faz sentido um servidor no final de carreira receber quase o mesmo que um iniciante, que é preciso atrair talentos e que não haverá impacto fiscal porque a PEC está “associada” ao projeto de lei que barra supersalários além do teto. É sempre o mesmo estratagema: diagnosticam-se seletivamente distorções para propor remédios que consolidam mais privilégios e ampliam a distorção sistêmica.

Não faz sentido salários similares no início e no fim de carreira. Mas a distorção na Justiça não é uma renda baixa no fim, e sim uma renda alta no começo. Justo e racional seria reduzir a remuneração inicial e condicionar a progressão à produtividade e mérito.

A carreira pública precisa ser atrativa. Muitos servidores da base e alguns do primeiro escalão são mal remunerados. Na média, contudo, os servidores federais recebem quase 70% acima de seus pares na iniciativa privada. Juízes e promotores já são campeões em renda, auxílios e privilégios e estão confortavelmente instalados até o último dia de suas vidas no 0,1% do topo da pirâmide social, com risco zero de deslizar. Num dos países mais desiguais do mundo, se já há desigualdade entre o setor público e o privado, a desigualdade dentro do público é maior, e a concentração de renda por suas elites é o que impede tantos na base de receber melhor.

Pacheco alega que haverá economia, porque o quinquênio “está associado” ao projeto para barrar os supersalários. Mas nada garante esta conexão entre alhos e bugalhos. Se se chega ao absurdo de ter de fazer uma lei para garantir que a lei constitucional do teto seja cumprida, é só porque esse limite é burlado dia sim e outro também, sobretudo pelo Judiciário. O quinquênio, por exemplo, foi sepultado em 2005, mas à base de canetadas casuísticas da Justiça foi exumado em 2022, e está sendo pago retroativamente. A probabilidade é que o projeto de contenção de supersalários fique numa gaveta e o quinquênio vá para a Constituição. O trigo aos juízes, o joio ao contribuinte. Imoral no conteúdo, essa partilha é viciosa na forma: faz sentido fixar mais uma regalia corporativa numa Constituição já irremediavelmente prolixa?

Ao assumir a presidência do Judiciário, Luís Roberto Barroso desfiou uma “agenda para o Brasil” trazendo de tudo um pouco, do saneamento à educação, da ciência à habitação popular, com destaque para a “inclusão social” e a “luta contra as desigualdades”. É de seus representantes eleitos que o cidadão espera esses progressos. Ao Judiciário basta garantir a sua legalidade. Mas os juízes poderiam fazer muito para reparar a máquina de gerar desigualdades que é o funcionalismo público. Poderiam, se o principal combustível desta máquina não fosse o seu apetite patrimonialista.

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By valeon