História de Rolf Kuntz – Jornal Estadão

Boas notícias sobre produção industrial e emprego são más notícias sobre inflação, segundo a sabedoria do mercado financeiro. Por esse critério, os brasileiros têm motivos para se preocupar com seu poder de compra. Em junho, a indústria produziu 4,1% mais que no mês anterior e mais que compensou o recuo, de 1,8%, acumulado em abril e maio.

O último resultado mensal divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foi 3,2% superior ao de um ano antes. Em 12 meses a indústria produziu 1,5% mais que no período anterior. Nos Estados Unidos, sinais de vigor na indústria são frequentemente seguidos de quedas nas Bolsas de Valores.

Melhoras no emprego também são vistas como prenúncios de preços em alta. “Bom momento do mercado de trabalho é alerta para a inflação”, avisa material da Conjuntura Econômica postado no site da Fundação Getúlio Vargas.

No Brasil, o desemprego no trimestre encerrado em junho ficou em 6,9%. Desde 2014, essa foi a menor taxa estimada para esse período. Não se trata apenas de uma percepção registrada, tipicamente, no mercado financeiro. Dirigentes de Bancos Centrais, como ocorre também no Brasil, costumam relacionar desemprego baixo, ou em queda, com maiores pressões inflacionárias.

Em 12 meses, indústria brasileira produziu 1,5% mais que no período anterior, segundo o IBGE Foto: Taba Benedicto/Estadão

Em 12 meses, indústria brasileira produziu 1,5% mais que no período anterior, segundo o IBGE Foto: Taba Benedicto/Estadão

Esse risco é destacado na ata da última reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC): “Concluiu-se que o processo desinflacionário arrefeceu e que os níveis de inflação corrente acima da meta, em contexto de dinamismo da atividade econômica, tornam a convergência da inflação à meta mais desafiadora”.

Projeções de inflação têm crescido, no mercado brasileiro, juntamente com as expectativas de crescimento econômico. Em quatro semanas, a inflação projetada para este ano subiu de 4,02% para 4,12%, segundo o boletim Focus. No mesmo intervalo, a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) estimada para 2024 aumentou de 2,10% para 2,20%.

Se essas estimativas estiverem corretas, a alta dos preços ao consumidor ficará no limite de tolerância, 4,50%, mas bem distante do centro da meta, fixado em 3%. No mesmo intervalo, a inflação esperada para 2025 aumentou de 3,96% para 3,98%, mas o aumento calculado para o PIB recuou de 1,97% para 1,92%.

A evolução dos preços calculada para os dois anos parece divergir das expectativas de avanços do PIB e do câmbio. Segundo o boletim, o dólar projetado para os meses finais deste ano e do próximo deve ficar em R$ 5,30. A taxa básica de juros deve continuar em 10,5% em dezembro de 2024 e situar-se em 9,75% um ano depois. Se os fatos confirmarem as projeções dos juros, o Banco Central (BC) terá sido menos severo do que têm sugerido alguns analistas do setor financeiro.

Projeções sobre câmbio, preços e juros são especialmente difíceis, neste momento, por causa das incertezas quanto à evolução das contas públicas. O resultado primário das contas fiscais mencionado no boletim Focus (déficit de 0,70% do PIB nos dois anos) já é pior que o apontado pela equipe econômica do governo. Mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, notoriamente inclinado à gastança, pode arruinar qualquer estimativa, seja de sua equipe ou do pessoal do mercado.

A insegurança em relação às finanças federais é uma das causas mais evidentes da instabilidade cambial observada no Brasil. As oscilações do dólar são em parte explicáveis pela instabilidade internacional, mas a relevância das incertezas domésticas é inegável. Essa insegurança é alimentada em grande parte ? talvez pincipalmente ? por ações impulsivas e declarações desastradas do presidente a República.

Sem mencionar o presidente, a ata do Copom cita a percepção, no mercado, do “crescimento dos gastos públicos” e as dúvidas sobre “a sustentabilidade do arcabouço fiscal vigente”. São evidentes a preocupação com a gastança federal e a cobrança de maior cautela na gestão orçamentária. Por enquanto, mantem-se a taxa básica de juros de 10,5%. Mas a advertência é clara mo final do texto: o compromisso de levar a inflação à meta poderá envolver “ajustes futuros” no custo do dinheiro. Em outras palavras, caberá ao presidente Lula, por meio de uma política prudente, evitar uma nova alta dos juros.

Talvez o presidente espere da nova direção do BC, a partir do fim do ano, maior tolerância à irresponsabilidade fiscal. Se essa expectativa se confirmar, a conta da inflação maior será paga pelas famílias, com maior sacrifício para as mais pobres. Isso ocorrerá, no entanto, se o novo Copom estiver disposto a repetir os erros de política monetária cometidos durante o período da presidente Dilma Rousseff. Isso parece improvável. Muito mais fácil é esperar do presidente Lula escorrregões desse tipo. Mas isso dependerá, em boa parte, da concordância do ministro da Fazenda. Até agora, ele se tem mostrado avesso a participar dessa eventura.

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By valeon