História de DOUGLAS GAVRAS – Folha de S. Paulo
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O MPF (Ministério Público Federal) diz considerar insuficiente a atuação da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) para garantir o equilíbrio econômico entre consumidores e as operadoras de planos de saúde.
Em um documento do dia 21 de outubro, o MPF aponta que esse desequilíbrio seria uma das razões para os reajustes abusivos dos planos médicos -colocando o consumidor em posição de vulnerabilidade- e ainda faz uma série de recomendações à agência.
O texto foi elaborado pela 3ª Câmara de Coordenação e Revisão (Consumidor e Ordem Econômica) do MPF, que cuida da defesa do consumidor, da concorrência e da regulação da atividade econômica.
Ele pede que seja aprimorada a fiscalização e regulamentação por parte da ANS junto às operadoras.
Segundo o MPF, a atual regulamentação permite maior liberdade para reajustes de planos de saúde coletivos em comparação aos individuais, cujos aumentos são fixados anualmente.
A instituição critica essa liberdade, alegando que ela resulta em reajustes abusivos nos planos coletivos, o que prejudica consumidores.
Outra consequência da falha regulatória seria a escassez na oferta de planos individuais ou familiares, o que dificulta o acesso ao sistema de saúde suplementar aos indivíduos que não se qualificam para os planos coletivos, por meio de empregadores ou grupos específicos.
As recomendações são para que a agência passe a cumprir de forma mais eficaz a função de regulamentar os planos coletivos, “uma vez que a sua condução do setor regulado, neste particular aspecto, tem trazido consequências danosas aos consumidores, que ficam à mercê das operadoras”.
Conforme levantamento feito pela agência a pedido da Folha de S.Paulo, de 2018 a 2023, as reclamações contra o setor saltaram 263% -de 97.336 para 353.784.
Enquanto isso, também de acordo com a ANS, o lucro líquido do setor de operadoras de planos de saúde foi de R$ 5,1 bilhões no primeiro semestre deste ano, alta de 255% ante o mesmo período do ano passado.
Outros apontamentos do texto são para que a ANS discipline a proibição de cancelamento dos planos coletivos pelas operadoras sem dar ao cliente outras condições adequadas fora dos casos já previstos na legislação.
Também sugerem que a agência apresente proposta regulatória para obrigar as empresas a oferecerem um plano individual equivalente em benefícios e coberturas caso o plano coletivo seja cancelado.
Os procuradores ainda recomendam que a ANS apresente alternativa para determinar que as operadoras monitorem periodicamente os custos de operação.
A agência deve estabelecer um parâmetro para os reajustes aplicáveis aos preços dos planos coletivos, de preferência mediante o aumento do “pool de risco” (aplicação do mesmo percentual de reajuste a todos os contratos de mesmo porte) para abranger todos aqueles com até 99 vidas.
A recomendação do MPF é uma forma de alertar o órgão sobre um determinado problema, ainda que de forma extrajudicial. O prazo para resposta é de 30 dias e, caso não seja atendido, a Justiça pode ser acionada.
O documento é assinado pelos procuradores da República Hilton Melo, Fabiano de Moraes, Niedja Kaspay, Marcus Vinicius Macedo e Thiago Corrêa, além do subprocurador Luiz Augusto Lima.
Procurada, a ANS disse que não identificou o recebimento do referido documento até a presente data, mas que atua na defesa do interesse público e, dessa forma, promove o aprimoramento da regulação de forma permanente.
Em relação ao equilíbrio econômico entre consumidores e operadoras de planos de saúde, a agência diz que estão em andamento até esta quinta-feira (31) duas tomadas públicas de subsídios que tratam, primordialmente, de questões relacionadas a preço e reajuste de planos.
“São medidas que podem vir a: ampliar a concorrência no setor; facilitar o acesso de consumidores ao setor de planos de saúde; trazer maior diluição do risco para os contratos de pequenos grupos de planos coletivos; trazer maior transparência sobre as metodologias de cálculo de reajuste utilizadas para os planos coletivos; e colaborar para a manutenção da sustentabilidade do setor.”
A SEGUIR, A ÍNTEGRA DA RESPOSTA DA ANS
“Inicialmente, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) informa que não identificou o recebimento do referido documento até a presente data.
A respeito do trabalho realizado pela ANS, é importante ressaltar que a Agência atua na defesa do interesse público e, dessa forma, promove o aprimoramento da regulação de forma permanente.
Especificamente sobre o equilíbrio econômico entre consumidores e operadoras de planos de saúde, a ANS ressalta que estão em andamento até 31/10/2024 duas Tomadas Públicas de Subsídios (nº 4 e nº 5) que tratam, primordialmente, de questões relacionadas a preço e reajuste de planos. São medidas que podem vir a: ampliar a concorrência no setor; facilitar o acesso de consumidores ao setor de planos de saúde; trazer maior diluição do risco para os contratos de pequenos grupos de planos coletivos; trazer maior transparência sobre as metodologias de cálculo de reajuste utilizadas para os planos coletivos; e colaborar para a manutenção da sustentabilidade do setor.
O conjunto de temas proposto pela ANS reflete a continuidade de um trabalho iniciado pela Agência em 2015, que já resultou em medidas como a definição da metodologia de cálculo do reajuste de planos individuais publicada em 2018 e implementada em 2019. Com a pandemia, foi necessário focar a atuação da reguladora em assuntos que se mostraram mais urgentes em razão da gravidade da situação. Na sequência, a Agência retomou as discussões de assuntos, alguns que inclusive constam da Agenda Regulatória 2023-2025, e agora foram levados para ampliação do debate com toda a sociedade.
A Tomada Pública de Subsídios nº 4 trata dos temas:
Reajuste de planos coletivos
· Definição do tamanho do agrupamento -atualmente, os agrupamentos são compostos por contratos com até 29 beneficiários. A ideia é ampliar esse universo para maior diluição do risco e, consequentemente, obtenção de reajustes mais equilibrados;
· Definição de parâmetros para as cláusulas de reajuste –objetivo é dar ao consumidor maior transparência sobre o cálculo realizado para a definição do percentual.
Mecanismos financeiros de regulação (coparticipação e franquia)
· Definição do limite financeiro do fator moderador por procedimento -percentual máximo que poderá ser cobrado por procedimento;
· Definição dos limites financeiros mensal e anual;
· Definição dos procedimentos não elegíveis (sobre os quais não poderá haver cobrança por realização).
Venda on-line
· Avaliação quanto à obrigatoriedade de venda on-line, a fim de facilitar o acesso dos consumidores a diferentes opções de produtos, de forma isonômica;
· Avaliação da necessidade de aprimoramento da Resolução Normativa nº 413/2016.
Revisão técnica de preços de planos individuais/familiares
· Definição dos critérios de elegibilidade -estabelecimento de requisitos para que operadoras possam solicitar reajustes excepcionais para o conjunto da carteira individual em razão de desequilíbrio econômico-financeiro em determinado contrato;
· Definição de indicador que caracterize ameaça ao equilíbrio econômico-financeiro da operadora;
· Definição de indicador que caracterize participação efetiva da carteira individual no âmbito da carteira total da operadora (representatividade);
· Definição do tempo e volume que caracterizem existência e continuidade de atuação no mercado de planos individuais;
· Definição de contrapartidas;
· Comercialização de planos individuais;
· Definição de prazo de implementação e frequência dos pedidos.
Em paralelo, está sendo realizada a Tomada Pública de Subsídios nº 5, que tem como objetivo receber contribuições da sociedade sobre a reformulação das regras dos planos ambulatoriais. O objetivo da ANS é promover a participação direta da sociedade na revisão e aprimoramento das regras atuais, a fim de incentivar a venda de planos com cobertura para realização de consultas e exames de forma segura para o consumidor.
Atualmente, o setor de planos de saúde conta com 51,4 milhões de beneficiários em planos de assistência médica -o que corresponde a 25% do total da população brasileira- , além de 33,8 milhões de beneficiários de planos exclusivamente odontológicos. Por ano, a saúde suplementar realiza cerca de 2 bilhões de procedimentos, entre consultas, exames, terapias e cirurgias.”