História de Notas & Informações – Jornal Estadão

A entrada em vigor da tarifa adicional de 25% sobre as importações de aço e alumínio pelos EUA coloca à prova a capacidade de negociação comercial e a diplomacia do Brasil. Até o início da vigência do decreto de Donald Trump, no último dia 12, havia ainda alguma expectativa de tratamento diferenciado, mas não houve exceções. Com a sobretaxa, as primeiras estimativas apontam perda de US$ 1,5 bilhão nas exportações brasileiras neste ano, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Ao contrário das reações de Canadá, União Europeia e China, que diante do protecionismo exorbitante do governo Trump partiram para o confronto com medidas retaliatórias, o Brasil tem mantido o propósito de negociar com os EUA. É uma decisão acertada, considerando os elementos favoráveis ao lado brasileiro, como uma relação equilibrada de compra e venda entre os dois países, com leve superávit americano, e uma exportação brasileira fortemente concentrada em placas de aço, produto semiacabado que serve de insumo às fábricas que Trump diz querer fortalecer. Acaba atirando na indústria americana intensiva em aço, como a de eletrodomésticos e de automóveis, já que a produção americana de placas é insuficiente para atender à demanda.

O poder econômico do Brasil, infinitamente menor do que o norte-americano, conduz à busca de uma via negocial estrategicamente pensada. Por isso, discursos desafiadores do presidente Lula da Silva contra Trump são nada mais do que jogo de cena voltado ao público interno. “Não adianta o Trump ficar gritando de lá, porque eu aprendi a não ter medo de cara feia”, disse Lula em recente evento em Minas Gerais, no qual advertiu ainda o americano: “Fale manso comigo”. A plateia aplaudiu e Trump, por certo, nem tomou conhecimento.

Para alívio geral, o tom nas discussões internas do governo é outro, como revelou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que disse ter recebido do chefe recomendação expressa para ter “muita calma nessa hora”. Após reunião com representantes da indústria do aço, o ministro lembrou que o Brasil teve êxito em negociações passadas com os EUA, em condições menos favoráveis do que a atual. De fato, em 2018 foi firmado um acordo em que o aço brasileiro permaneceu isento de imposto de importação nos EUA, dentro de um sistema de limite de cotas.

Em comunicado conjunto divulgado pelos Ministérios das Relações Exteriores e do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, o governo não descartou recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC) para enfrentar os “efeitos nocivos” da sobretaxa imposta pelo governo Trump. É do jogo. Apesar do esvaziamento da OMC – iniciado ainda no governo Barack Obama e que tomou corpo a partir do primeiro mandato de Trump –, o órgão é a principal instância a administrar o sistema multilateral de comércio que o presidente dos EUA tenta subverter.

O Órgão de Apelação da OMC está paralisado desde 2019, o que abriu caminho para Trump violar acordos. Mas, neste momento, mais importante do que a eficácia da organização é a legitimidade que dará ao País na busca pela obediência aos ritos do comércio multilateral. A primeira instância da OMC está em funcionamento e pode autorizar atos de reciprocidade por países que considerar prejudicados. Talvez seja este, inclusive, o momento de se buscar a revitalização da organização que, há décadas, garante o respeito às regras do comércio mundial.

A atitude do governo brasileiro em relação à política prepotente de Donald Trump tem sido, até aqui, ao mesmo tempo crítica e ponderada. Além de a balança comercial do aço ser superavitária para os EUA, o Brasil conta com a complementaridade da siderurgia dos dois países – a brasileira importa de lá o carvão usado na produção das placas exportadas – como ponto forte para um entendimento. Por isso, como ressaltou o vice-presidente Geraldo Alckmin, “a disposição, primeiro, é do diálogo”.

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By valeon