Senado Federal

Por
Isabelle Barone – Gazeta do Povo

www.pedrofranca.com.br

Senado Federal vota nesta quarta-feira (16) a medida provisória que abre caminho para privatização da Eletrobras.| Foto: Pedro França/Agência Senado

A medida provisória (MP) 1.031, que autoriza a privatização da Eletrobras, será votada pelo plenário do Senado Federal nesta quarta-feira (16). Entre outras coisas, o texto deve manter os “jabutis” — expressão utilizada quando há inserção, em algum texto legislativo, de assunto alheio ao tema central — aprovados pela Câmara no último dia 19 de maio. Permanecem, ainda, incertezas quanto aos efeitos que o processo de privatização, como está proposto, pode ter na tarifa de energia do consumidor residencial.

Caso a matéria seja aprovada na Casa, o texto segue direto para sanção presidencial, e abre caminho para a primeira grande privatização da gestão do presidente Jair Bolsonaro. Se houver modificações, porém, a MP terá de retornar para apreciação da Câmara e ser votada até, no máximo, 22 de junho, quando o texto “caduca”, isto é, perde validade.

Se a medida for derrubada pelos senadores, por outro lado, o Executivo não pode editar nova MP de teor semelhante neste mesmo ano. Restaria à equipe investir no projeto de lei 5.877/19, que tramita no Congresso e trata da privatização da estatal, mas que havia sido “abandonado” em prol da MP.

A jornalistas, o senador Marcos Rogério (DEM-RO), relator da MP no Senado, afirmou nesta terça-feira (16) que a “espinhal dorsal” da MP aprovada na Câmara deve permanecer no parecer que vai apresentar. “Um ponto ou outro pode ser que haja modificação. Da mesma forma, aquilo que o Senado Federal está construindo a partir da colaboração, do conjunto dos senadores e senadoras, eu tenho dialogado muito com o deputado Elmar [Nascimento, DEM-BA, relator da MP na Câmara], dentro dessa linha de entendimento”, disse o relator.

A declaração indica, portanto, que devem continuar no texto os itens amplamente criticados, em especial a previsão de contratação de termelétricas a gás natural e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) em locais pré-determinados e nos quais não há oferta do produto, sendo necessária a construção de gasodutos. Também devem ficar no texto a destinação do superávit financeiro da usina de Itaipu — que não será privatizada — a programa social e a garantia de benefícios a trabalhadores da Eletrobras.

Marcos Rogério nega que os tópicos, alheios ao tema central da proposta, se tratem de “jabutis”. Para especialistas, isso poderia até mesmo elevar o risco de judicialização do processo.

“O próprio governo traz no seu texto inicial situações que são acessórias. Então, o conjunto das emendas apresentadas tanto pelos deputados federais quanto pelos senadores eu não posso, de maneira antecipada, tê-los como jabutis. Esse é um termo pejorativo”, disse o senador nesta terça.

Segundo relatos de bastidores, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), teria preparado uma emenda à MP a fim de impedir que as águas do reservatório de Furnas, em Minas Gerais, região do parlamentar, sejam usadas apenas para gerar energia elétrica. Ele já havia se posicionado publicamente sobre o assunto nas redes sociais. “O Operador Nacional do Sistema Elétrico, vinculado ao Ministério de Minas e Energia, apoderou-se das águas brasileiras para o seu propósito único de geração de energia”, escreveu em tuíte publicado em maio.

“Essa política energética sem ideias, que não planeja e não pensa em médio e longo prazo, reduz os níveis de água e sacrifica o abastecimento, o turismo, a navegação, a agropecuária, a piscicultura e o meio ambiente. Sacrifica, sobretudo, milhares de pessoas! A previsão de secar os reservatórios do sistema de Furnas, em Minas Gerais, é inaceitável, ainda mais depois dos acordos feitos com a bancada federal do Estado”.

Uma emenda desse teor, no entanto, poderia gerar um impasse entre o Congresso e o governo, que trabalha com um risco de racionamento em meio à crise hídrica. O governo prepara uma medida provisória que deve aumentar o poder do Ministério de Minas e Energia e reduzir o papel de órgãos como Ibama e Agência Nacional de Águas (ANA) na gestão de reservatórios. A ideia é, se necessário, dar prioridade ao uso da água para a geração de energia, restringindo os demais usos.

Conta de luz vai aumentar ou diminuir com a privatização da Eletrobras
A tramitação da pauta no Congresso também tem gerado debates acalorados quanto aos possíveis desdobramentos da privatização da Eletrobras na conta de luz do consumidor residencial, também chamado de “cativo”. Desse mercado, fazem parte, obrigatoriamente, todas as residências e parte do comércio e da indústria. Nele, cada um consome energia da distribuidora que é concessionária de sua região, e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) fiscaliza e define os reajustes anuais.

De um lado, a equipe econômica fala em uma possibilidade de diminuição de até 7,4% da conta de luz, após a capitalização da estatal. A informação consta de um relatório publicado pelo Ministério de Minas e Energia (MME), e isso sinaliza o apoio do governo ao texto aprovado pela Câmara. Nesta terça, a Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás) também saiu em defesa da tese, afirmando que o processo de privatização da Eletrobras poderia gerar um alívio de até R$ 8 bilhões nas contas dos consumidores residenciais.

Do outro lado, contudo, as previsões de associações e economistas apontam para um desdobramento diferente: um aumento da tarifa do consumidor em até 10%, equivalente a R$ 41 bilhões.

Entre os principais fatores que apontam para um encarecimento tarifário está a previsão de contratação de geração termelétrica movida a gás em leilões nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Devem ser contratados 6 mil megawatts (MW) de usinas térmicas movidas a gás e 2 mil megawatts (MW) de PCHs. A proposta, para a equipe econômica, teria o objetivo de “conferir maior segurança energética no cenário de transição decorrente da desestatização da Eletrobras”.

Modelo de capitalização e golden share devem ser mantidos
A MP prevê que a privatização da Eletrobras será feita por meio da capitalização, a partir da emissão de novas ofertas públicas de ações da estatal. Os atuais acionistas terão seu capital diluído e o governo federal, que hoje detém 51% das ações, perderá a posição de acionista controlador.

Por outro lado, a União terá direito a uma golden share — ação de classe especial que lhe garante poder de veto em decisões da assembleia de acionistas. A MP também veda que qualquer acionista ou grupo tenha participação maior que 10% no capital social da empresa. Esses pontos dificilmente serão modificados, apontam fontes nos bastidores.

Itaipu terá recursos “engessados” a partir de 2023
No processo de capitalização da Eletrobras, a hidrelétrica binacional Itaipu e a Eletronuclear não poderão ser privatizadas. Uma nova estatal ou empresa de economia mista será criada para gerir as duas companhias. A partir de 2023, quando os empréstimos e financiamentos da Itaipu devem estar quitados, 75% dos resultados financeiros da companhia serão destinados à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Trata-se de um fundo para o qual contribuem as distribuidoras, voltado ao custeio de políticas públicas e alívio das tarifas.

Os outros 25% dos resultados financeiros da Itaipu serão direcionados a programas de transferência de renda. O superávit financeiro da empresa é estimado em U$ 1 bilhão ao ano. Hoje, cerca de 48,9% de custo médio de geração de energia pela hidrelétrica binacional são destinados à amortização de empréstimos e financiamentos. Já a partir de 2033, 50% desses recursos serão destinados à CDE, 25% para programas sociais e 25%, para a empresa responsável.

VEJA TAMBÉM:
Bandeira tarifária que paga as térmicas pode ter reajuste superior a 20%
Despacho térmico total terá impacto de R$ 9 bilhões até novembro
Aneel prorroga proibição de corte no fornecimento de energia para baixa renda
Garantias para funcionários da Eletrobras
Sob justificativa de “insegurança jurídica” aos trabalhadores da Eletrobras, o texto aprovado determina que a União reserve parte das ações representativas do capital da estatal a eles. Funcionários que tenham se desligado da empresa nos últimos dois anos também poderiam ter direito. Os empregados desligados terão o prazo de seis meses após a sua rescisão de vínculo trabalhista, desde que o seu desligamento ocorra durante o ano subsequente ao processo de capitalização, para exercer esse direito.

A União também poderá, de forma facultativa, promover o aproveitamento do trabalhadores que perderem seus empregos em decorrência da privatização em outras empresas públicas federais, em cargos de mesma complexidade e remuneração similares. Dados divulgados pela Eletrobras dias atrás mostram que os fundos de pensão de seus empregados fecharam 2020 com déficit de R$ 6,8 bilhões.

Recursos da privatização da Eletrobras irão para projetos de revitalização
Pelo menos R$ 8 bilhões oriundos da privatização da Eletrobras serão destinados à revitalização de programas regionais, segundo o texto que será analisado. O Ministério de Minas e Energia será responsável pela gestão e definição dos projetos. Serão beneficiárias: a bacia do Rio São Francisco, os reservatórios de Furnas, a bacia do Rio Parnaíba e o Rio Madeira.


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/economia/privatizacao-da-eletrobras-vai-a-votacao-no-senado-com-jabutis/
Copyright © 2021, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.

Loading

By valeon