Editorial
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Gazeta do Povo

O ministro do STJ Herman Benjamin (no telão) durante audiência semipresencial da CCJ do Senado em que foram discutidas mudanças na Lei de Improbidade.| Foto: Leopoldo Silva/Agência Senado

Nesta quarta-feira, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado deve votar o parecer do senador Weverton Rocha (PDT-MA) que praticamente não altera o texto vindo da Câmara e que muda a Lei de Improbidade Administrativa. Se não houver boas mudanças de última hora, e se a CCJ aprovar o parecer, segue aberto o caminho para o Congresso Nacional dar sinalização diametralmente oposta ao endurecimento do combate à ladroagem, frustrando as expectativas dos brasileiros cansados de corrupção e do mau uso dos recursos públicos.

Na terça-feira, uma audiência pública ouviu as opiniões tanto de gestores quanto de autoridades com experiência no combate à corrupção – todos ressaltando aspectos diversos do projeto de lei. Acertam os gestores, por exemplo, quando criticam o texto excessivamente aberto da Lei de Improbidade Administrativa atual, que dá margem à ação ideologizada de certas alas do Ministério Público que enxergam improbidade em determinados atos de governo mais por discordância a respeito das melhores políticas a executar que por irregularidades concretas.

O projeto que tramita no Senado parece feito mais para ajudar os maus gestores a escapar impunes que para ajudar os bons gestores a governar com liberdade

O prefeito de Jacareí (SP), um dos participantes na audiência, afirmou que a lei “deveria ser o mais específica possível” na enumeração dos atos que configurariam improbidade. Assim, seria possível evitar o “apagão das canetas”, como ficou conhecida a inatividade de gestores que preferem não fazer nada a tomar alguma decisão que possa levar a ações de improbidade. No entanto, como lembrou o ministro do STJ Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin na audiência, a redação atual deixará de fora muitas condutas que são de fato irregulares, mas que não estão tipificadas em lei. Uma possível solução para este problema seria ampliar a lista de condutas específicas que configuram improbidade, mas esta possibilidade não parece estar no horizonte do relator.

E, se eliminar formulações abertas demais que deem margem a subjetivismos é uma alteração bem-vinda, o projeto que veio da Câmara e está no Senado vai muito além disso. O texto promove inúmeros retrocessos que dificultarão demais a responsabilização por irregularidades reais, a começar pela exigência de comprovação do dolo na configuração da improbidade, isentando até mesmo gestores que cometam erros culposos, mas decorrentes de evidente negligência, imprudência ou imperícia. Teria bastado estabelecer uma gradação nas punições, reservando as mais pesadas aos casos dolosos, mas sem deixar de punir também outras situações em que há erro grosseiro, evitável, embora não intencional. No entanto, o relator do projeto na Câmara, Carlos Zarattini (PT-SP), preferiu a responsabilização apenas dos atos dolosos, o que Weverton Rocha não demonstrou intenção de alterar.

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Da mesma forma, também devem permanecer inalterados, ou com mudanças muito pequenas, vários pontos ressaltados pelos especialistas no combate à corrupção, como prazos curtos de prescrição, problemas de redação e hipóteses de nulidade na ação de improbidade – itens apontados em nota técnica da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público divulgada também nesta terça-feira. Parte dessas alterações tornará muito difícil que um gestor acabe responsabilizado e punido mesmo quando cometer atos indiscutivelmente característicos da improbidade administrativa.

O “apagão das canetas” é fenômeno sério; membros do Poder Executivo não foram eleitos para não fazer nada, paralisados por medo de ações de improbidade. Este problema poderia ser atenuado se as alas mais ideologizadas do MP não quisessem atuar como impositores de políticas públicas e respeitassem a autonomia dos gestores, o que não parece factível, ao menos no curto prazo. Sobra, portanto, alterar a lei para que fique mais específica na descrição das condutas passíveis de responsabilização. Mas a Câmara aprovou, e a CCJ do Senado pode aprovar, um projeto de lei feito mais para ajudar os maus gestores a escapar impunes que para ajudar os bons gestores a governar com liberdade. Atos típicos de improbidade seguirão ocorrendo, mas cada vez menos serão assim caracterizados; improbidade com impunidade será o saldo do texto, caso prospere no Senado.


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