1. Economia 

Abílio Pacheco, que também é pesquisador da Embrapa, conseguiu triplicar a produtividade usando a técnica em sua fazenda e hoje auxilia outros produtores a copiar o modelo

Amanda Pupo, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – O pesquisador e produtor rural Abílio Pacheco, de 67 anos, escolheu seguir por um caminho pouco óbvio ao herdar 210 hectares na região de Cachoeira Dourada, no sul de Goiás, há 14 anos. A opção mais fácil era arrendar o espaço a usineiros para o cultivo de cana-de-açúcar, algo que os vizinhos já vinham fazendo. Mas estava reticente. 

À época cursando doutorado em Agronomia, Abílio encontrou a resposta folheando uma revista na biblioteca da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em Goiânia. A edição trazia detalhes do sistema de Integração Lavoura, Pecuária e Floresta (ILPF), técnica de produção que reúne na mesma área diferentes cultivos e otimiza a terra a partir do seu uso sustentável.

Foi ali que Abílio, pesquisador da Embrapa há 40 anos, vislumbrou um futuro para a propriedade. E o acerto é inegável. Enquanto o agronegócio brasileiro é olhado pelo mundo com desconfiança, o produtor rural tem exibido País afora – e principalmente porteira adentro – o que a terra pode oferecer quando a biodiversidade é respeitada

Abílio virou uma espécie de embaixador do sistema integrado lavoura-pecuária-floresta. No início do mês, apresentou seu projeto na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2021, a COP-26. Em setembro, Abílio ficou entre os vencedores de um prêmio global que prestigia agricultores e pecuaristas que adotam práticas verdes em seus negócios. “As grandes coisas da humanidade estão ligadas à diversidade. Eu falava há muitos anos: a produção integrada ou vai estar entre os sistemas do futuro ou será o sistema do futuro”, disse. 

Abilio
Abilio Pacheco, produtor rural e pesquisador da Embrapa, que pratica a integração lavoura, pecuária e floresta em sua propriedade Foto: CLEDSON RODRIGUES/EMBRAPA

Maior produtividade

 Com um “pé na ciência e outro na terra”, como Abílio descreve, o produtor viu a produtividade crescer ao adotar o sistema da Embrapa. Antes de implantá-lo, em meio à terra degradada, a fazenda produzia 4 arrobas de boi por hectare/ano, ante a média nacional, de 5,5. Com as mudanças, que incluíram o plantio de eucalipto e de grãos, o número saltou para 18 arrobas de boi por hectare/ano. 

O ganho se dá com o gado convivendo em meio à plantação do eucalipto, também revertido em lucro para a fazenda. “Se você gosta de sombra, por que o boi não vai gostar?”, brinca Abílio. 

Na mesma área, o produtor obtém 45 m³ de madeira por hectare/ano, vendida para a fabricação de móveis. “É uma produtividade considerada alta. As cabeças mais pensantes se preocupam com o crescimento populacional. A terra é uma só, vamos ter de comer. Com o sistema você consegue tirar isso e garantir a terra produtiva para as gerações futuras”, diz Abílio, que também mantém espécies nativas.

‘Carne carbono neutro’

 Nesse ambiente, são fixadas cerca de 13 toneladas de carbono por hectare ao ano, gás que é um dos principais causadores do efeito estufa e vilão dos esforços para controlar as mudanças climáticas. Com essa vantagem, a fazenda produz a chamada “carne carbono neutro”, produto certificado cuja valorização no mercado está em franco crescimento. Já a lavoura paga integralmente os custos da implantação do sistema de produção integrado.

Abílio reconhece o privilégio de poder unir sua bagagem de pesquisador ao trabalho no campo. Como funcionário público, também sente o dever de retribuir à sociedade. Por isso trabalha para levar a inovação a outros produtores. Um deles é José Ferreira Pinto, dono de uma propriedade de 48 hectares voltada à pecuária leiteira no município goiano de Quirinópolis. Com a técnica, a sua produção cresceu em torno de 30%, com o mesmo rebanho. 

O ganho é gerado tanto pelas melhorias no pasto em razão das árvores quanto pelo bem-estar animal, que passa a viver num ambiente mais fresco. Hoje o sistema beneficia pelo menos 80 produtores de leite. “Eu não vejo nenhuma razão para o pecuarista não produzir madeira e leite, ou madeira e carne em suas áreas. É uma união muito perfeita”, afirma o pesquisador, lembrando que o sistema de integração com o componente florestal é indicado especialmente ao pecuarista. 

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By valeon