Leia análise
Poucas coisas em crises geopolíticas são mais sensíveis do que a inteligência, mas governo americano tem falado sobre conhecimento de movimentos, táticas e planejamento russos
Anthony Faiola*, The Washington Post, O Estado de S.Paulo
Os avisos do governo de Joe Biden de uma invasão russa da Ucrânia passam a sensação de que o Weather Channel está rastreando um furacão. Desde que as autoridades dos EUA anunciaram pela primeira vez o aumento das forças do presidente russo, Vladimir Putin, na fronteira, há mais de três meses, elas repetiram a ameaça com crescente alarme.
Na semana passada, surgiram novas avaliações dos EUA de que o poder de fogo russo havia atingido 70% da força necessária para um ataque em grande escala. A tempestade russa, concluíram os EUA, pode atingir Kiev em dois dias, deixando até 50 mil civis mortos ou feridos.
Poucas coisas em crises geopolíticas são mais sensíveis do que a inteligência. Mas, desde o início da crise na Ucrânia, o governo Biden tem falado sobre o conhecimento dos EUA de movimentos, táticas e planejamento russos. Um analista a chama de “estratégia de megafone de Biden”.
Outros dizem que é preciso voltar alguns anos para encontrar uma crise semelhante em que um governo dos EUA compartilhou tantas informações com esse nível de especificidade tão rapidamente.
Pode haver razões estratégicas para ficar de boca fechada. O excesso de detalhes pode comprometer os ativos de inteligência e colocar em risco o futuro acesso às informações. Mas há outro grande motivo para discrição. A coleta e o processamento de inteligência são mais arte do que ciência, uma série de segredos mantidos juntos por suposições analíticas. A inteligência pode ser – e muitas vezes é – confiável, e pode ser – e muitas vezes é – errada. O exemplo: as advertências dos EUA sobre as inexistentes armas de destruição em massa de Saddam Hussein, que foram inventadas pelo governo de George W. Bush.
Isso não significa que as avaliações dos EUA estão erradas agora – ou que o urso russo não vai abrir caminho para a Ucrânia. Na verdade, até agora, a sensação é que o governo acertou. Muitos observadores dizem que o governo é taticamente inteligente ao sair à frente de qualquer operação russa exatamente como está fazendo. Diferenças entre aliados sobre uma resposta coordenada ainda existem. Mas, se Putin esperava um ataque furtivo, agora ele tem os olhos do mundo observando.
* É COLUNISTA DE ASSUNTOS EXTERNOS DO ‘WASHINGTON POST’