1. Economia
     

Cujo tamanho das perdas não justifica o triunfo militar

Guerra moral e de comunicação já foi perdida; e a guerra econômica tem impactos diretos

Luiz Carlos Trabuco Cappi*, O Estado de S.Paulo

No pós-pandemia, a guerra. E com ela a frustração das esperanças de virarmos a página da covid-19. O mundo volta ao cenário de incertezas econômicas e, pior, joga-se por terra a condição universal para a prosperidade humana, a paz.

As negociações para dar fim ao conflito evoluem, mas lentamente. E o estrago à economia global é de tal ordem que as medidas de reconstrução vão levar tempo, promover nova realocação de ativos, e exigir mais financiamento e mais consumo de commodities.

Vladimir Putin
Alemães protestam contra o presidente russo, Vladimir Putin; estrategistas russos não calcularam o tamanho dos estragos dos embargos numa economia que se tornou sofisticada após adotar o capitalismo Foto: Ardavan Safari/ Reuters

A guerra tem sempre um cálculo político, mas a invasão é claramente uma agressão à soberania da Ucrânia. Entre as consequências mais chocantes, há o drama dos milhões de refugiados, cujas cenas despertam consternação e repúdio.

A onda global de solidariedade mostra que o mundo está mobilizado, com os países aplicando sanções econômicas duríssimas. Gigantes do mundo corporativo se posicionam claramente ao abandonar o mercado russo. A guerra estrangula a liquidez financeira. Os investidores estrangeiros mantêm mais de US$ 150 bilhões em títulos e ações na Rússia. As reservas russas foram congeladas e não há liquidez para sair das posições.

Analistas já vislumbram como perspectiva global inflação mais alta, juros e protecionismo comercial. Alguns falam em estagflação. 

O centro de gravidade desse conflito é geopolítico, mas a guerra moral, política e de comunicação já foi perdida. E a guerra econômica tem impactos diretos. As sanções evidenciam seu peso relativo diferenciado em uma economia como a da Rússia, que se tornou capitalista, aberta e globalizada há cerca de apenas três décadas, após o fim da União Soviética. Os efeitos dos cortes de fluxo financeiro, do comércio e da saída de marcas icônicas são amplificados, desorganizam a economia. Provavelmente, os estrategistas russos não calcularam o tamanho dos estragos dos embargos numa economia que se tornou sofisticada após adotar o capitalismo – a União Soviética era um bloco estruturado no modelo básico de exportar petróleo e gás para fazer caixa.

Somando todos os elementos, a Rússia pode conseguir uma vitória de Pirro, aquela em que o tamanho das perdas não justifica o triunfo militar. Essa é uma lição da própria Rússia. Guerra e Paz, o clássico de Leon Tolstói, além de uma grande história de amor, mostra como Napoleão Bonaparte venceu, mas saiu derrotado da guerra contra a Rússia. Após ocupar e saquear uma Moscou deserta e incendiada, bateu em retirada depois de uma semana, com suas tropas abatidas pela fome e pelo frio. 

* PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BRADESCO. ESCREVE A CADA DUAS SEMANAS

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