‘Estadão’ realizou exercício contábil, com o apoio do economista e consultor Adriano Pires, para conferir quanto cairiam os preços dos combustíveis se a Petrobras pudesse distribuir os seus ganhos para os consumidores
José Fucs, O Estado de S.Paulo
Com a divulgação dos lucros extraordinários obtidos pela Petrobras, de R$ 106,6 bilhões em 2021 e de R$ 44,5 bilhões no primeiro trimestre de 2022, prosperou por aí a ideia de que a empresa se aproveitou da explosão dos preços do petróleo no mercado internacional para alavancar os seus ganhos “às custas do povo brasileiro”.
Segundo essa percepção, a Petrobras deveria ter lucro um lucro menor – definido sabe-se lá por quais critérios – e o grosso do dinheiro deveria ser destinado a reduzir os preços dos combustíveis nas bombas. Mas o que aconteceria na prática se a Petrobras pudesse realmente “socializar” o seu lucro com os consumidores, sob a forma de descontos nos preços da gasolina e do diesel?
Para responder a esta pergunta, o Estadão realizou um exercício contábil, com o apoio do economista e consultor Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), e chegou à conclusão de que o impacto nos preços seria considerável, mas talvez nem tanto quanto muita gente imagina.
É certo que, no mundo real, isso não seria possível. Primeiro, porque a União detém apenas 37,5% do capital da Petrobras, apesar de ter o controle, por possuir a maioria das ações com direito a voto, e a empresa precisaria dividir o lucro com os acionistas privados, que respondem pelos demais 62,5% do capital.
Depois, porque isso comprometeria o fluxo de caixa da empresa e a realização de novos investimentos, destinados à modernização do processo produtivo e à melhoria da produtividade. Trata-se, portanto, apenas de uma conjectura, só para conferir qual seria o resultado aproximado da medida, e não de uma solução efetiva para a alta dos preços dos combustíveis.
Pelos cálculos de Pires, se a Petrobras tivesse usado 100% do lucro que obteve em 2021 em benefício dos consumidores, o preço médio do litro de gasolina no País ao longo do ano passado, de R$ 5,769, teria sido R$ 1,20 menor. No caso do diesel, o preço médio do litro no período, de R$ 4,559, teria sido R$ 0,95 mais baixo. Em ambos os casos, a queda seria de 20, 9% em relação aos preços médios cobrados nas bombas em 2021.
No caso de um veículo popular, com tanque de 48 litros e autonomia de 504 km na cidade, isso representaria uma economia de R$ 57,60 a cada abastecimento completo ou R$ 230,40 por mês, considerando um tanque cheio por semana. No caso de um caminhão com tanque de 400 litros e autonomia de 1.200 km na estrada, o desconto seria de R$ 380 por abastecimento completo, ou R$ 633 numa viagem de São Paulo a Salvador, de cerca de 2 mil quilômetros.
Para chegar a esses números, Pires partiu da premissa de que o diesel e a gasolina eram os dois únicos combustíveis consumidos no País, sem levar em conta a mistura de 27% de etanol na gasolina e de 10% de biodisel no diesel. Em seguida, ele multiplicou o total de litros de gasolina e de diesel efetivamente vendidos pela Petrobras em 2021 pelos preços médios de cada um dos dois combustíveis no período, segundo dados da ANP, para saber quanto a companhia teria faturado, e calculou também a participação de cada um no faturamento total.
Depois, ele dividiu o lucro da Petrobras em 2021 entre o diesel e a gasolina, respeitando a mesma proporção deles nas vendas totais e subtraiu o resultado dos respectivos faturamentos. Por fim, para chegar ao preço médio com desconto em ambos os casos, dividiu o resultado da operação pelo total de litros de diesel e de gasolina vendidos no ano passado.
Pires também calculou qual seria o desconto nos preços dos dois combustíveis, partindo das mesmas premissas, se a Petrobras usasse apenas parte de seu lucro, correspondente à fatia de 37,5% da União em seu capital, em benefício dos consumidores. Neste caso, a conclusão foi de que o desconto no preço do diesel e da gasolina seria de apenas R$ 0,36 e de R$ 0,46 por litro, respectivamente, o equivalente a 7,9% do preço médio efetivo registrado em 2021.