Eleições
Por
Alexandre Garcia
O presidente chileno, Gabriel Boric, exibe decreto convocando referendo em 4 de setembro, após receber o texto da nova Constituição do país.| Foto: Alberto Valdés/EFE
A constituinte chilena acaba de entregar ao presidente Boric o texto final de uma nova Constituição. Ela extingue o Senado de 200 anos, cria Justiça diferente para as etnias originais, aumenta “direitos sociais” como aborto e diminui o poder da polícia, entre outras mudanças. Tem 388 artigos e é uma das mais extensas do mundo.
Dos 154 constituintes que trabalharam um ano, a maioria é da esquerda; apenas 37 são de partidos de direita. Em 4 de setembro, ela será submetida a um referendo popular. Pesquisas indicam que apenas 25% a 33% aprovam a nova Constituição.
Como assim? Num plebiscito de 2020, 78% afirmaram querer uma nova Constituição. Em maio do ano passado, elegeram os constituintes pouco mais de 5 milhões dos quase 15 milhões de chilenos aptos a votar. Quer dizer, apenas 36% escolheram quem faria a Constituição; agora a maioria que se absteve de votar a desaprova. Esse é o preço da abstenção: deixar que a minoria decida, abrindo mão do poder que a democracia oferece. Na Colômbia, há pouco, 18 milhões não votaram e 11 milhões elegeram o presidente.
Somos parte dos que elegemos. Se nos abstivermos, ficando em casa ou votando branco e nulo, perdemos a razão para reclamar das consequências da eleição
Aqui, faltam três meses para a eleição de 2 de outubro. O voto é obrigatório, diferentemente do Chile e da Colômbia, mas as sanções para quem não votar são mínimas, e estão dispensados da obrigação os eleitores com mais de 70 anos. Seriam cerca de 30 milhões de eleitores. Além disso, é bom lembrar que o “fique em casa”, que prejudicou os brasileiros, pode prejudicar também o poder da maioria, pedra de toque da democracia. Todo poder emana do povo, que o exerce diretamente ou por meio de seus representantes eleitos. Ora, o exercício direto em geral é alternativa quando não dá certo o exercício via representantes eleitos. Tanto que a Constituição põe o exercício direto em segundo lugar. Então, é melhor que votemos, sem deixar que os outros decidam por nós.
Temos a exigência de que o eleito para cargo de governador ou presidente tenha maioria entre os votos válidos, para evitar problemas como os que aconteceram na eleição de Juscelino Kubitschek, por exemplo. Ele foi eleito com 36% dos votos; o segundo teve 30% e o terceiro, 26%. E houve uma contestação muito grande por parte dos 56% que preferiam os dois derrotados. Por isso hoje há o segundo turno entre os dois mais votados, obrigando-se a ter o vencedor mais da metade dos votos válidos.
Só que os votos nulos e brancos não contam. Pois no segundo e decisivo turno da eleição presidencial de 2018, entre dois candidatos, somadas as abstenções, votos anulados e brancos, 42 milhões de eleitores não participaram da decisão. O perdedor, Haddad, teve 47 milhões de votos e o vencedor, quase 58 milhões. O equivalente à população da Ucrânia, ou da Argentina, não participou da escolha do presidente do Brasil.
O que serve para presidente ou governador serve também para a escolha de nossos representantes no Legislativo. Eles terão o poder de fazer, alterar ou desfazer leis e até de mexer na Constituição, no que não for cláusula pétrea. O Supremo mexe até em cláusula pétrea, e não tem poder, nem voto para isso. Nós, eleitores, temos o poder de, dentro de três meses, escolher aqueles que podem impedir que a Constituição seja desrespeitada, e escolher aqueles que, nos poderes Legislativo e Executivo, garantam o futuro de nossos filhos e netos, protegendo os valores em que acreditamos. Como mandantes, nos identificamos com nosso mandatário. Somos parte dos que elegemos. Se nos abstivermos, ficando em casa ou votando branco e nulo, perdemos a razão para reclamar das consequências da eleição.
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