Novo presidente
Por
Renan Ramalho
Brasília
16/08/2022 21:03
Ministro Alexandre de Moraes vai comandar a Justiça Eleitoral até 2024.| Foto: Antonio Augusto/TSE
O ministro Alexandre de Moraes disse nesta terça-feira (16), ao tomar posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que a Justiça Eleitoral terá interferência “mínima” na liberdade de expressão de candidatos e eleitores, durante a campanha eleitoral deste ano. “A intervenção será mínima, porém célere, firme e implacável no sentido de coibir práticas abusivas, ou divulgação de notícias falsas ou fraudulentas, principalmente daquelas escondidas no covarde anonimato das redes sociais, as chamadas fake news”, disse, sob aplausos.
No discurso, Moraes também disse que “liberdade de expressão não é liberdade de agressão”, frase que já foi usada em diversas decisões nas quais ele determinou a remoção de conteúdos na internet com ofensas ou ameaças a autoridades.
“Liberdade de expressão não é liberdade de destruição da democracia, de destruição das instituições, de destruição da dignidade e da honra alheias. Liberdade de expressão não é liberdade de propagação de discursos de ódio e preconceituosos. A liberdade de expressão não permite a propagação de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado de Direito, inclusive durante o período de propaganda eleitoral”, afirmou.
Antes, o ministro enalteceu o papel da Justiça Eleitoral na realização das eleições, destacando o papel da urna eletrônica. “Somos a única democracia do mundo que apura e divulga os resultados eleitorais no mesmo dia, com agilidade, segurança, competência e transparência. Isso é motivo de orgulho nacional”, disse, sendo sucedido de uma longa salva de palmas.
Depois, afirmou que o aperfeiçoamento do sistema “sempre será constante” e que a Justiça Eleitoral existe para garantir o direito de eleitores periodicamente escolherem seus representantes. “Existe para garantir que o exercício da democracia seja realizado de maneira segura, confiável e transparente”, afirmou.
As declarações refletem a posição do ministro no contexto de crescentes questionamentos e críticas do presidente Jair Bolsonaro (PL) ao sistema de votação, que alimentou a desconfiança de parte do eleitorado em relação às urnas eletrônicas.
Adversários nas urnas, Bolsonaro e Lula ficam frente a frente
Lula ao lado de Temer, Sarney e Dilma diante do plenário do TSE, onde estavam Jair Bolsonaro e outras autoridades.| Antonio Augusto/TSE
Presente na cerimônia, Bolsonaro sentou-se à mesa do plenário do TSE primeiro ao lado do presidente da Corte que encerrava seu mandato, Edson Fachin, e depois do empossado Alexandre de Moraes.
Também figuraram na mesa os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira; o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux; o procurador-geral da República, Augusto Aras; o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Beto Simonetti; e os demais ministros do TSE: Ricardo Lewandowski, Mauro Campbell, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Na primeira fileira da plateia, em frente a Moraes, sentaram-se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ladeado pelos ex-presidentes José Sarney e Michel Temer, e com a ex-presidente Dilma Rousseff na outra ponta, ao lado de Sarney. Estavam presentes ainda ministros e ex-ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ministros de Estado e 22 governadores, além de deputados, senadores e representantes de partidos políticos.
Lula e Dilma chegaram juntos ao TSE, acompanhados do ex-governador Geraldo Ackmin, candidato a vice-presidente na chapa petista, e da presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Bolsonaro chegou à Corte ao lado da primeira-dama Michelle Bolsonaro e do filho Carlos.
Durante a cerimônia, o presidente da República cumprimentou Moraes mais de uma vez e chegou a trocar algumas palavras ao pé do ouvido antes do discurso do novo presidente do TSE. Mas Bolsonaro evitou aplausos quando Moraes se referiu à confiabilidade do sistema eleitoral e da urna eletrônica, sendo seguido por seus ministros que estavam presentes na plateia.
PGR e OAB discursam em apoio a Alexandre de Moraes
Em seu discurso, o procurador-geral Augusto Aras disse que o Ministério Público Eleitoral estará ao lado do TSE com “o propósito de assegurar respeito à vontade do eleitor” e na defesa do Estado Democrático de Direito. “Estamos irmanados na defesa do sistema eleitoral, no combate à desinformação e em abuso de qualquer natureza. Sobretudo estamos atentos e vigilantes na sustentação do regime democrático”, afirmou.
O presidente da OAB, Beto Simonetti, disse que Moraes e Lewandowski “podem contar, sempre, com o apoio da advocacia para defender a democracia e o sistema eleitoral”. “A OAB se mantém equidistante dos projetos concorrentes nas eleições. Nós não somos apoiadores nem opositores de governantes ou de candidatos. Nosso papel, nas eleições, é acompanhar e fiscalizar o processo”, discursou.
À frente do TSE, caberá a Moraes comandar a eleição mais polarizada das últimas décadas, que elegerá o presidente da República e governadores de estado, e renovará um terço do Senado e a totalidade da Câmara Federal e das Assembleias Legislativas e Distrital.
A missão dele será pacificar o processo eleitoral, marcado por questionamentos à segurança do sistema eletrônico de votação. Para isso, o novo presidente do TSE contará com o apoio do ministro do STF Ricardo Lewandowski, novo vice-presidente da Corte Eleitoral, também empossado nesta terça. O mandato de Alexandre de Moraes irá até junho de 2024.
O que esperar de Moraes no comando do TSE
Como deixou claro em seu discurso, Alexandre de Moraes promete firmeza no combate à desinformação, especialmente ligada à integridade do sistema de votação eletrônica, mas também em relação às “fake news” espalhadas na internet e nas redes sociais que possam manchar a imagem de candidatos, caso o conteúdo das postagens seja “sabidamente inverídico”.
O termo consta numa resolução recente do TSE que permite à Justiça Eleitoral não apenas remover de sites e plataformas acusações de fraude sem provas contra as urnas, mas também processar seus responsáveis por crime eleitoral e, no caso de candidatos, torná-los alvos de ações que podem levar à cassação da candidatura, do diploma ou do mandato.
Já em relação a ataques entre os próprios candidatos com mentiras, uma recente mudança no Código Eleitoral pune com até um ano e meio de detenção o ato de “divulgar, na propaganda eleitoral ou durante período de campanha eleitoral, fatos que sabe inverídicos em relação a partidos ou a candidatos e capazes de exercer influência perante o eleitorado”.
Uma demonstração de que Moraes agirá com rigor nesse sentido foi sua recente decisão em que ele, a pedido do PT, determinou a retirada da internet de postagens e vídeos que associavam o partido e o ex-presidente Lula à facção criminosa PCC.
Para coibir mentiras sobre as urnas, o precedente para cassação e inelegibilidade foi construído em 2021, quando o plenário do TSE, por unanimidade, condenou o deputado estadual o deputado estadual Fernando Francischini (União-PR), em razão de uma transmissão ao vivo, no dia da eleição de 2018, na qual ele disse que algumas urnas no Paraná estavam “fraudadas” para impedir votos em Bolsonaro.
Ademais, a linha dura na repressão a “ataques” – como ofensas ou supostas ameaças a autoridades – foi demonstrada fartamente nos inquéritos que conduz pessoalmente no STF – como o das “fake news” e o das “milícias digitais”.
É possível que o conhecimento e as provas reunidas pelo ministro nessas investigações possa alimentar ações eleitorais no TSE que apontem uso das redes para disseminação de mentiras sobre o sistema eleitoral e sobre candidatos.
Embora Moraes seja apenas um entre os sete ministros titulares que compõem o TSE, seu voto tem influência sobre os demais. E sua postura institucional de defesa do tribunal, especialmente num momento em que a Corte é alvo de questionamentos e críticas por parte de Bolsonaro e muitos de seus apoiadores, tende a ganhar amplo apoio entre os colegas.
No campo institucional, um dos grandes desafios é pacificar a relação com as Forças Armadas, que, desde o ano passado e por influência de Bolsonaro, propõem mudanças na fiscalização da apuração e totalização dos votos.
Dentro do governo, há a expectativa de que Moraes atenda a alguns dos pedidos dos militares negados pelo atual presidente, Edson Fachin, mas ele até o momento não deu qualquer sinal disso. Alterações acarretariam complicações de ordem logística e burocráticas que enfrentam grande resistência por parte de servidores e técnicos do TSE.
Moraes terá como vice-presidente o ministro Ricardo Lewandowski, que já presidiu o TSE e é conhecido pelo comportamento cordial e conciliador. Apesar de indicado por Lula para o STF, de manter uma linha progressista nas decisões e frequentemente oposta a interesses do governo, é bem visto por Bolsonaro, porque não faz provocações nem passa recados políticos em eventos públicos, como outros ministros considerados desafetos – caso de Edson Fachin, que deixa nesta terça a presidência do TSE, e de Luís Roberto Barroso, seu antecessor.
Ainda no campo institucional, Moraes poderá contar para a interlocução com os demais poderes e instituições o ex-advogado-geral da União José Melo do Amaral Junior, que defendeu o governo entre 2020 e 2021. Ele será o secretário-geral do TSE e tem como atribuição costurar e negociar acordos, conversas e tratativas de interesse de Moraes junto a outros órgãos e atores políticos.
Nas eleições, Moraes também terá como colegas no TSE a ministra Cármen Lúcia, do STF, os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Benedito Gonçalves, que assumirá a função de corregedor, e Raul Araújo, além dos juristas Sérgio Banhos e Carlos Horbach. Caberá a todos eles julgar, após as eleições, eventuais ações por abuso de poder político ou econômico que venham a ser ajuizadas, não apenas contra candidatos à Presidência, mas também a outros cargos, em grau recursal, como governador, senador e deputado federal ou estadual.
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