Judiciário
Por
Olavo Soares
Brasília
Detalhe da estátua da Justiça, que fica na frente do STF.| Foto: Nelson Jr./STF
Propostas apresentadas por deputados federais e senadores que buscam mudanças na composição e no funcionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) atravessam anos sem tramitação e têm se acumulado nas gavetas virtuais do Congresso Nacional. Os projetos atacam pontos como os mecanismos de escolha dos membros da Corte, a duração dos mandatos dos ministros e a sistemática de impeachment dos integrantes do STF.
Via de regra, as proposições não chegam nem sequer a ser rejeitadas; seu destino, no geral, é aguardar apreciação em comissões ou a designação de relatores – o que habitualmente não têm prazo limite para ocorrer. Algumas das propostas são defendidas por representantes da esquerda e da direita. Ainda assim, não obtêm força política para avançarem.
Duas ideias que também buscavam modificar o Supremo acabaram se enfraquecendo em um estágio ainda anterior: não conseguiram, ao menos até o momento, reunir os apoios necessários para sua tramitação. Ambas são projetos idealizados no formato de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que, para terem seu pontapé inicial formal no Legislativo, demandam a assinatura de 171 deputados.
Os dois projetos são de autoria de deputados defensores do presidente Jair Bolsonaro (PL): Domingos Sávio (PL-MG) e Paulo Eduardo Martins (PL-PR), e se tornaram conhecidos no último mês de junho. A proposta de Sávio foi apelidada de “PEC anti-STF”, porque tinha como principal meta diminuir o poder da Corte. Entre outras determinações, a proposta dava ao Congresso a possibilidade de rever decisões tomadas pelo Supremo. Já a proposição de Martins dificulta a tomada de decisões monocráticas por parte dos ministros do STF e restringe a possibilidade de sindicatos e partidos políticos apresentarem ações na corte.
Propostas para mudar escolha para o STF e que estabelecem mandato para ministros
No início de 2020 o então presidente do Senado e do Congresso, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), divulgou as prioridades do ano para o Legislativo, e entre elas estava uma proposta que revia o modelo de nomeação dos ministros do STF. O projeto tinha autoria do senador Lasier Martins (Podemos-RS) e relatoria do então senador Antonio Anastasia (PSD-MG), atualmente ministro do Tribunal de Contas da União (TCU).
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A proposta determinava que cada integrante do Supremo seria selecionado pelo presidente da República a partir de uma lista tríplice formada por um colegiado constituído por sete membros, entre eles representantes do TCU, do próprio STF e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Hoje, o presidente da República é quem escolhe um nome de qualquer cidadão brasileiro acima de 35 anos com “notável saber jurídico e reputação ilibada”.
O texto do projeto ainda determinava que os membros da corte passariam a ter mandato fixo de 10 anos. Atualmente, a única limitação de tempo é a idade do ministro, que tem de se aposentar compulsoriamente quando completa 75 anos de idade.
A deflagração da pandemia de coronavírus subverteu as prioridades que o Congresso tinha no início de 2020 e impediu o avanço da proposta que mudaria o STF. Mas mesmo após a melhoria da crise sanitária da Covid-19, o tema saiu de cena, e não está hoje entre os assuntos em destaque no Congresso.
Com isso, o projeto de Lasier Martins foi para a lista de espera, assim como um do deputado Pedro Cunha Lima (PSDB-PB), protocolado em 2015, que também estabelecia mandato de 10 anos aos ministros do Supremo.
Quatro anos depois de Cunha Lima, foi a vez de o deputado Paulo Ganime (Novo-RJ) apresentar outro projeto com novas regras para a escolha de ministros e para o tempo de mandato. Pela proposição, os ministros seriam selecionados de forma alternada, com o direito à indicação variando entre presidente da República, Câmara dos Deputados, Senado e o próprio STF. Ganime sugeriu ainda que os mandatos fossem de 12 anos.
O tratamento recebido pelo projeto de Ganime é um símbolo do destino dado às proposições sobre o tema – e também de como esse assunto se espalha pelas diferentes vertentes ideológicas. A proposta de Ganime foi “apensada” a uma outra de 2012. No linguajar do Congresso, apensar significa fazer com que dois projetos de teor semelhante tramitem juntos. A ideia é evitar o retrabalho.
O projeto de 2012 apensado ao de Ganime previa mandatos de sete anos aos ministros do STF e foi apresentado pelo ex-deputado Nazareno Fonteles (PT-PI). E, por sua vez, esse projeto de Fonteles havia sido apensado a um de 2008, proposto por Neilton Mulim (PP-RJ). A proposição de Mulim não passou por tramitações significativas nos últimos cinco anos.
O Congresso ainda discutiu um projeto da então senadora Marta Suplicy (SP) que cria uma nova sistemática para os prazos relacionados à nomeação de novos ministros do STF. Atualmente, o presidente da República é livre para fazer sua escolha para o Supremo quando quiser, e o Senado também não tem um prazo delimitado para apreciar a indicação.
A proposta de Marta previa que o presidente teria três meses para indicar o nome, e o Senado 45 dias para aprová-lo ou rejeitá-lo. O projeto chegou a ter algum avanço nos meses iniciais após ser apresentado, mas está inativo há pelo menos um ano.
Impeachment de ministros do Supremo é tratado em projetos
O Congresso ainda discute – também a passos lentos – projetos que reveem os mecanismos de impeachment de ministros do STF. Hoje, o impeachment é conduzido pelo presidente do Senado. Qualquer cidadão pode pedir o afastamento e cassação, mas a decisão sobre a abertura ou não de um processo compete exclusivamente ao presidente do Senado.
Duas dessas proposições ampliam o leque dos crimes de responsabilidade que são passíveis de impeachment de ministros do STF. Em uma delas é definido como crime de responsabilidade emitir opinião sobre processos ainda em curso. Os dois projetos são de autoria de deputados aliados do governo Bolsonaro: Chris Tonietto (PL-RJ) e Paulo Eduardo Martins.
PEC da Bengala no Judiciário venceu a gaveta
Em 2017, a imposição de prazo para o mandato de ministros do STF chegou a ser aprovada em uma comissão da Câmara que discutia a reforma política. A proposição havia sido apresentada pelo então deputado Vicente Cândido (PT-SP). Mas não prosperou quando a Câmara votou a reforma política. O trecho sobre os ministros do STF foi suprimido, e não voltou ao debate.
Dois anos antes, o Congresso havia aprovado uma rara proposta de emenda à Constituição de impacto no Judiciário: a chamada “PEC da Bengala”. A proposição elevou de 70 para 75 anos o prazo para aposentadoria compulsória dos integrantes do STF e de demais tribunais superiores. A aprovação da “PEC da Bengala”, ao estender o tempo de trabalho dos ministros, impediu a então presidente Dilma Rousseff (PT) de indicar novos nomes para o STF. À época, a Câmara era presidida por Eduardo Cunha, adversário da petista.
Nos últimos anos, uma iniciativa que reverte os efeitos da “PEC da Bengala” chegou a ter avanços na Câmara. A ideia é defendida pela deputada Bia Kicis (PL-DF), apoiadora do presidente Bolsonaro, e determina que a aposentadoria compulsória volte a ser aos 70 anos.
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