E deixar Liz Truss no passado

Por
Filipe Figueiredo – Gazeta do Povo


Liz Truss deixa Downing Street, sede do governo britânico, para fazer discurso no parlamento, no dia 23 de setembro de 2022: de saída em tempo recorde| Foto: EFE/EPA/NEIL HALL

Liz Truss entrou para a História como o mais curto governo do Reino Unido. Entre sua eleição interna ao Partido Conservador e sua renúncia foram apenas 44 dias. Teremos mais alguns dela como premiê interina, enquanto seu partido, com pressa, escolhe quem será o novo, ou nova, líder do grupo e, consequentemente, premiê do país. A pressa da escolha se dá por um contexto que já existia e que, agora, se agravou.

Quando da queda de Boris Johnson por causa de sua gestão econômica e da polêmica das festinhas durante o lockdown, explicamos aqui em nosso espaço que uma das razões do Partido Conservador querer substituir Boris era pelo fato de o partido estava sofrendo derrotas em eleições distritais, em eleições regionais e pelo índice de aprovação do governo estar em queda.

Tirava-se Boris Johnson e um novo governo teria espaço para crescer, sem sofrer com a pandemia diretamente. O novo governo poderia, então, recuperar a imagem dos Tories antes das eleições previstas para o fim de 2024. A escolhida foi Liz Truss e o plano foi por água abaixo. Em 44 dias seu governo conseguiu criar uma pequena crise econômica e passar por duas crises políticas.

Crise e renúncia
Principalmente, o chamado “mini orçamento” de Liz Truss, que previa cortes de impostos para os mais ricos e para as grandes empresas, conseguiu repercutir tão mal que jogou a libra esterlina ao seu menor valor na História. O então chanceler, o ministro da economia britânico, Kwasi Kwarteng, foi convidado a se retirar, em meio às imagens dele brindando o corte de impostos com grandes empresários.

Dias depois, no último dia 19, a secretária do interior Suella Braverman pediu demissão, deixando uma carta bastante crítica à premiê. No mesmo dia, quarenta parlamentares conservadores não queriam votar em um debate sobre fraturamento hidráulico, para não apoiarem o governo diretamente. A situação ficou insustentável e Liz Truss renunciou, ficando interinamente até um novo líder conservador ser eleito.

O Partido Conservador está com pressa e iniciará o procedimento de escolha de um novo líder já na próxima segunda-feira. Na imprensa britânica se especula um possível grande acordo para chegar em um nome de consenso, evitando uma eleição propriamente dita dentro do partido, que seria mais demorada. O nome mais forte no momento? O mesmo Boris Johnson que Liz Truss substituiu.

A pressa se dá pelo fato de que os pedidos por eleições gerais antecipadas já se fazem ouvir. Líderes da oposição trabalhista, o chefe do governo galês, o também trabalhista Mark Drakeford, e a líder do Partido Nacional Escocês e chefe do governo da Escócia, Nicola Sturgeon, são algumas das vozes que pedem por uma eleição geral. Questionam a capacidade e a legitimidade de um eventual novo governo conservador.

Nova eleição
A convocação de uma nova eleição, entretanto, passaria pela dissolução do Parlamento. Hoje, a maioria da casa está com os conservadores, ou seja, não há como um voto pela dissolução ser aprovado. E o Partido Conservador, claro, não tem motivos para desejar essa dissolução. Caso a escolha de uma nova liderança do governo demore, entretanto, esse cenário pode mudar.

Políticos descontentes e a pressão popular podem acabar dando impulso aos pedidos por novas eleições. E aqui entra a principal informação para explicar o receio eleitoral dos conservadores no momento: todas as pesquisas apontam uma vitória esmagadora do Partido Trabalhista. O cenário eleitoral para os conservadores, hoje, está pior do que quando da queda de Boris Johnson.

Caso os Tories cheguem em um nome de consenso na próxima segunda-feira, é possível que, até a próxima sexta-feira, o nome esteja empossado, diminuindo, ao menos no momento, as pressões por novas eleições. Claro, isso se o governo não for outro desastre, como foi o de Liz Truss. Curiosamente teremos um chefe de governo empossado por um rei Charles III ainda não coroado.

Em alguns anos, talvez décadas, algum programa de perguntas e respostas fará a pergunta “quem ocupava o cargo de primeiro-ministro do Reino Unido quando da morte da rainha Elizabeth II?”, com a ironia da mais longeva monarca britânica ter morrido durante o mais breve governo do país. Liz Truss caminha para ser um tema de trívia, estabelecendo um recorde que não desejava. Até seu partido já quer esquecê-la logo.

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