Reação
Por
Rodolfo Costa
Brasília
Bolsonaro acusou um suposto favorecimento do TSE à campanha de Lula ao rejeitar a denúncia sobre irregularidades nas inserções de rádio.| Foto: Joédson Alves/EFE
Apesar de não haver consenso entre os estrategistas, a campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) tentará associar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a um suposto favorecimento ao PT e à candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva após a Corte rejeitar a denúncia de desequilíbrio em inserções de rádio a favor do petista.
Em comício em Minas Gerais, nesta quarta-feira (26), Bolsonaro sugeriu a possibilidade de tentativa de manipulação do resultado das eleições. Disse que as suspeitas teriam “o dedo” do PT e que o partido, juntamente com o TSE, teria “muito o que explicar nesse caso”. À noite, em declaração à imprensa no Palácio da Alvorada, voltou a fazer essa associação após o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, negar prosseguimento à queixa apresentada pela campanha à reeleição.
“Está comprovado a diferenciação e o tratamento dispensado ao outro candidato [Lula], que poderia — não posso afirmar — até ter participação dele em algum momento. Se o TSE não tinha nada a ver com isso, é incompreensível a demissão sumária desse servidor e da forma como foi conduzido para fora do TSE”, declarou Bolsonaro sobre a exoneração do servidor Alexandre Gomes Machado, que era responsável no tribunal em disponibilizar as inserções da propaganda eleitoral no rádio e na televisão.
O presidente também afirmou que a campanha vai contratar uma terceira auditoria a fim de respaldar a denúncia apresentada ao TSE e disse que a coordenação jurídica deve recorrer da decisão do ministro Alexandre de Moraes.
A despeito das declarações de Bolsonaro, a própria campanha se divide sobre o tema. Uma ala entende que é importante confrontar o TSE a fim de alertar e engajar os eleitores nesta reta final do segundo turno, sobretudo o eleitorado mais “raiz” do presidente. A percepção de outro grupo é de que as suspeitas têm pouco potencial de conversão de votos e de ampliação da base eleitoral, e que o mais prudente é manter a sustentação da denúncia e contestar nos tribunais cabíveis decisões adversas ao caso, mas evitar uma associação direta entre Lula, PT e TSE.
Os estrategistas que entendem que a campanha deve se distanciar dos holofotes defendem uma atuação mais estratégica nos bastidores. Não à toa, os coordenadores eleitorais deram aval e incentivaram congressistas da base a adotarem movimentos políticos para pedir a investigação das suspeitas e associar um suposto favorecimento do TSE à candidatura petista.
Como coordenadores da campanha reagiram ao desequilíbrio nas inserções
A campanha de Jair Bolsonaro adotou uma postura mais pragmática em relação às suspeitas de discrepância entre as inserções veiculadas nas rádios. O coordenador de imprensa, Fábio Wajngarten, usou as redes sociais para dar mais detalhes do levantamento que embasa a denúncia. “As auditorias de mídia contratadas pela campanha são renomadas, certificadas e com alta tecnologia”, disse.
Wajngarten comentou as alegadas discrepâncias nas inserções de rádio em Minas Gerais. Segundo a auditoria, apenas entre 7 e 14 de outubro, 90% das rádios mineiras exibiram 15.101 inserções a mais para o PT. “É um escândalo sem precedentes!!!”, escreveu. À noite, em entrevista à Jovem Pan, assegurou que a campanha enviou inserções às rádios. “Temos todos os recibos”, disse.
O ministro das Comunicações, Fábio Faria, outro integrante do núcleo político da campanha, teve uma atuação mais discreta. Depois de publicar na terça-feira (25) um vídeo nas redes sociais afirmando que a campanha havia protocolado a petição junto ao TSE com a auditoria realizada, ele não voltou a tocar no caso nesta quarta. Limitou-se a comemorar as informações de geração de empregos em setembro, falar sobre a agenda eleitoral de Bolsonaro e a propaganda eleitoral veiculada na rede nacional de TV, além de destacar a promessa de aumento real do salário mínimo em 2023.
O ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, foi outro a destacar a geração de empregos em setembro em comentário no Twitter. A abordagem de uma agenda propositiva é apontado como o mais estratégico no momento para virar votos e assegurar uma vitória. Boa parte dos coordenadores eleitorais esperam um desdobramento mais robusto para evitar acusações e incorrer em alguma irregularidade eleitoral que possa gerar prejuízos à campanha. “Até porque o TSE está com superpoderes”, comenta um interlocutor.
O coordenador-geral da campanha, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), se manifestou sobre diferentes temas, desde propostas em caso de reeleição, como o aumento do salário mínimo, ao tema das inserções nas rádios. “Bolsonaro levou uma segunda facada. Vamos vencer as eleições, apesar da tentativa de manipulação do resultado”, declarou.
Como a base política pode ajudar a campanha no caso das inserções
A articulação da campanha junto à base política para associar as denúncias entre Lula e TSE é algo que interlocutores apontam que deve ganhar mais força até as eleições. Os requerimentos de deputados federais para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e de uma comissão externa para acompanhar os desdobramentos do caso são ambos movimentos que tiveram o aval e a anuência da campanha nos bastidores.
Entende-se que a estratégia política junto à base não tem potencial para desgastar a campanha como as acusações diretas feitas pelo próprio Bolsonaro. A expectativa é que os parlamentares aliados ajudem a construir um movimento de engajamento da militância nas redes sociais sem as digitais do próprio presidente ou de coordenadores eleitorais.
Entre os requerimentos que tendem a ganhar mais força é de uma comissão externa da Câmara. Por não envolver despesas orçamentárias da Casa, o regimento interno possibilita que o colegiado possa ser criado apenas pelo aval e a autorização do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Já uma CPI demandaria 171 assinaturas e, em uma semana sem sessões do Congresso, essa seria uma tarefa mais desafiadora.
O deputado federal Vitor Hugo (PL-GO) defende os movimentos da base aliada e entende que a denúncia apresentada pela campanha é “gravíssima”. “São mais de 1.280 horas de exposição nas rádios a menos para a campanha do presidente. Isso é uma desigualdade e desequilíbrio que a Justiça Eleitoral precisa dar uma resposta que possibilite o reequilíbrio da paridade de armas entre os candidatos”, argumenta.
Outra estratégia adotada por aliados é o de pedir proteção à segurança e integridade do servidor exonerado do TSE. A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) fez o pedido à Polícia Federal (PF). O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) foi outro a adotar movimento semelhante, ao oficiar o Ministério da Justiça para requerer a proteção ao servidor que prestou depoimento à PF.
“Acho que vai ser inevitável aprofundar nessa investigação e entender por que isso acontece, por que o TSE tem tanta sede para monitorar rede social, censurar emissoras, jornalistas, perfis, mas não controla propagandas que a gente paga e está dando esse disparate todo que saiu na mídia”, opina.
Girão diz, ainda, que tem pedido e conversado com senadores para articular medidas relacionadas ao caso. “O Senado está paralisado, não está mais nem de joelho. Está quase no chão porque fica assistindo a isso tudo, os sucessivos abusos que vêm dos nossos tribunais superiores”, afirma. Ele é autor de um requerimento para fazer um voto de repúdio a censuras do TSE a veículos de imprensa. O requerimento foi assinado por 23 senadores, mas ainda precisa de mais quatro assinaturas.
O cientista político Lucas Fernandes, coordenador de análise política da BMJ Consultores Associados, entende que é coerente a campanha e a base política coordenarem ações que visam criar associações entre Lula e o TSE. Mas pondera que os efeitos disso apenas geram “cortina de fumaça” política.
“É o que sobrou. É melhor fazer barulho com isso do que deixar o noticiário repercutir o aumento da gasolina e do diesel, falar sobre Roberto Jefferson. É um caso que corrobora muito a narrativa de Bolsonaro de que o Judiciário supostamente tem um lado e que está ali consistentemente favorecendo o Lula”, diz.
Indiretamente, Fernandes entende que pode haver algum benefício à campanha, mas mínimo. “Dá um tema quente para ele abordar na eleição e, de quebra, pega um ou outro eleitor indeciso que veja o caso e avalie como um grande complô contra o Bolsonaro, mas que atinge um impacto e nicho pequeno do eleitorado”, diz.
Desequilíbrio nas campanhas
Caso das inserções de rádio: 4 pontos sobre a denúncia da campanha de Bolsonaro
Por
Gazeta do Povo
Auditoria apontou que houve mais inserções de rádio pró-Lula que pró-Bolsonaro durante a campanha do segundo turno.| Foto: Waldemir Barreto/Rádio Senado
A campanha de Jair Bolsonaro (PL) apresentou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nesta terça-feira (25) um relatório que apontou um suposto desequilíbrio nas inserções de campanha eleitoral em rádios que teria favorecido o seu adversário, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O envio do relatório atendeu a um pedido do presidente do TSE, Alexandre de Moraes, que havia dado um prazo de 24 horas para que os advogados de Bolsonaro apresentassem provas das alegações, com informações sobre “rádios, dias ou horários em que não teriam sido veiculadas as inserções”.
O ministro das Comunicações, Fábio Faria, disse nesta terça via Twitter que espera uma “solução rápida” para o caso. “Cabe esclarecer que não se trata de qualquer questionamento acerca do sistema eleitoral ou sobre a atuação do TSE. O que estamos apontando é uma absurda supressão ou migração de comerciais que Bolsonaro teria direito em favor da campanha de Lula”, ressaltou.
Na noite desta quarta-feira (26), Moraes rejeitou o pedido da campanha de Bolsonaro para abrir uma investigação sobre irregularidades nas inserções de rádios. Poucos depois, Bolsonaro fez um pronunciamento à imprensa para dizer que a assessoria jurídica da campanha irá recorrer da decisão.
Para apresentar um panorama do que já se sabe, a Gazeta do Povo organizou os aspectos mais importantes do caso nos quatro pontos a seguir.
- O que diz a denúncia?
A denúncia diz que há um suposto desequilíbrio na forma como diversas rádios estão veiculando as inserções determinadas pela Justiça Eleitoral, com suspeita de favorecimento para a campanha de Lula. Segundo a coligação do atual presidente, a sua campanha teve cerca de 154 mil aparições de 30 segundos a menos do que Lula em rádios de todo o Brasil.
A campanha de Bolsonaro diz que há “possível abuso dos meios de comunicação em rádio” em favor de Lula e pediu a suspensão das propagandas do petista “até que se atinja o número de inserções usurpadas”.
O caso mais gritante, segundo a auditoria, ocorreu na região Nordeste, onde Lula apareceu 12 mil vezes a mais que Bolsonaro nas inserções de rádio:
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O estado com maior desequilíbrio foi a Bahia, em que Bolsonaro teve 26% a menos de tempo de inserções que Lula:
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Na região Norte, a diferença verificada pela auditoria também foi relevante. Bolsonaro teve um tempo 9% menor:
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- Qual é o universo de rádios abordadas na denúncia?
O suposto desequilíbrio nas inserções ocorreu em diversas rádios de todo o Brasil. Segundo assessores da campanha do presidente, até mesmo algumas rádios com viés pró-Bolsonaro teriam veiculado mais inserções pró-Lula.
Como a diferença foi especialmente grande nas regiões Norte e Nordeste, a campanha de Bolsonaro decidiu focar nessas duas regiões para ilustrar a gravidade das denúncias, centrando-se nos dados compilados entre os dias 7 de outubro e 21 de outubro.
Depois que o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, pediu uma “juntada de provas e/ou documentos sérios” que comprovassem as alegações, assessores do presidente passaram a madrugada da segunda para a terça organizando dados sobre algumas rádios em que a discrepância foi maior. Uma pasta de Google Drive vazada nesta terça-feira (25) trazia dados detalhados sobre as diferenças verificadas em oito dessas rádios. Essa seleção foi feita com propósito ilustrativo, mas a diferença se verificou em centenas de outras emissoras em todo o país.
No Nordeste, segundo a auditoria, 991 emissoras (88,3% do total) veicularam mais propagandas para Lula; 94 emissoras publicaram mais inserções de Bolsonaro (8,3% do total); e somente 37 (3,3%) teriam feito divulgado as campanhas em número equivalente. No Norte, os números são bastante semelhantes percentualmente.
Procurada pela Gazeta do Povo, a equipe da campanha de Bolsonaro não esclareceu por que não fez um resumo sobre as outras regiões e estados e por que só revelou detalhes compilados das regiões Norte e Nordeste.
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- O que se sabe sobre as empresas de auditoria contratadas?
A empresa Audiency Brasil Tecnologia Ltda, com sede em Florianópolis (SC), foi a responsável por elaborar os relatórios de veiculação das campanhas em rádio que foram entregues ao TSE. Trata-se de uma plataforma de streaming de dados de emissoras de rádio da América Latina, que distribui métricas e detalhes para alavancar anúncios de clientes em rádio.
Uma campanha publicitária da empresa aponta a possibilidade de candidatos acompanharem os spots de campanha eleitoral em tempo real por meio de ferramentas para garantir que as campanhas estejam sendo veiculadas corretamente. O nome da Audiency não aparece na prestação de contas do candidato Bolsonaro e nem no Portal da Transparência.
A outra empresa responsável pela auditoria de mídia e informada pelo assessor do presidente Bolsonaro, Fábio Wanjgarten, é a SoundView. Com sede em Minas Gerais, a empresa oferece um painel de controle dos dados de veiculação de emissoras de rádio pelo mundo.
“É possível verificar se o plano de mídia está sendo cumprido. É possível verificar datas, horários, rádios, cidades e diversas outras informações estratégicas de veiculação além de escutar todas as gravações da auditoria”, informa a empresa pelo site.
A SoundView, apesar de não estar mencionada no relatório das auditorias, aparece na prestação de contas do candidato e presidente Jair Bolsonaro, disponível no portal do TSE. A empresa recebeu da campanha de Bolsonaro o valor de R$ 501 mil no dia 26 de agosto, dez dias após o início oficial da corrida eleitoral. Os candidatos Romeu Zema (Novo), Alexandre Kalil (PSD) e Alexandre Silveira (PSD) também contrataram serviços da plataforma durante o pleito.
- O que diz o TSE hoje?
Inicialmente, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, emitiu uma decisão crítica à denúncia, dizendo que “os fatos narrados na petição inicial não foram acompanhados de qualquer prova e/ou documento sério” e chamando o relatório da auditoria de “apócrifo”.
Após a apresentação de provas das alegações, Moraes rejeitou a ação proposta pela campanha de Bolsonaro, nesta quarta, afirmando que os fatos narrados ao TSE foram “extremamente genéricos e sem qualquer comprovação”. O presidente do TSE também solicitou que seja investigado eventual “crime eleitoral com a finalidade de tumultuar o segundo turno” das eleições por parte da campanha à reeleição do mandatário.
Moraes ordenou também que a Corregedoria-Geral Eleitoral seja intimada para apurar “eventual desvio de finalidade na utilização de recursos do Fundo Partidário dos autores”.
Em um comunicado à imprensa mais cedo, o TSE se eximiu de eventuais responsabilidades sobre o caso, afirmando que “compete às emissoras de rádio e de televisão cumprirem o que determina a legislação eleitoral” e que “não é função do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) distribuir o material a ser veiculado no horário gratuito”.
A corte eleitoral afirmou ainda que a “fiscalização é responsabilidade dos partidos e das coligações” e que, “em caso de a propaganda não ser transmitida pelas emissoras, a Justiça Eleitoral, a requerimento dos partidos políticos, das coligações, das federações, das candidatas, dos candidatos ou do Ministério Público, poderá determinar a intimação pessoal da pessoa representante da emissora para que obedeçam, imediatamente, às disposições legais vigentes e transmitam a propaganda eleitoral gratuita”.
O jurista Adriano Soares da Costa, especialista em Direito Eleitoral, contesta essa informação, e diz que a fiscalização também é obrigação do TSE, ainda que caiba a partidos e coligações simultaneamente. “O TSE é o fiscal da lei e tem poder de polícia. Se não fosse, por que motivo ter um responsável pelo pool de rádios e televisão? Os partidos devem, sim, fiscalizar também em defesa dos seus interesses. Mas a Justiça Eleitoral tem também essa responsabilidade, porque o sorteio dos horários e o mapa de mídia são feitos com a atuação da Justiça Eleitoral. Quem tem o poder de polícia para atuar de ofício é a Justiça Eleitoral. Não pode ela se desonerar desse poder-dever seu, promovendo a igualdade do pleito. Se não faz esse controle, como promover o cumprimento das determinações que expede e como fazer que as suas decisões sejam respeitadas?”, questiona ele.
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