Economistas respondem

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Por Luciana Dyniewicz e Luiz Guilherme Gerbelli – Jornal Estadão

Analistas dizem que a prioridade do governo petista deverá ser solucionar o problema das contas públicas

Ao assumir em 1º de janeiro de 2023, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai ter de lidar com inúmeros problemas econômicos e terá pouco tempo para solucionar cada um deles.

Para cinco economistas consultados pelo Estadão, a prioridade do próximo governo do petista nos primeiros seis meses deverá ser resolver a questão das contas públicas. Durante a campanha, Lula disse que pretende acabar com o teto de gasto, a regra fiscal que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior, mas ainda não indicou o que vai colocar no lugar.

Mais do que isso: o governo Lula vai lidar com um Orçamento considerado irreal. A proposta enviada pelo governo Jair Bolsonaro ao Congresso Nacional não contempla o Auxílio Brasil de R$ 600, mas sim de R$ 405. Para dar conta de um auxílio mais robusto, além de cumprir promessas de campanha, como o reajuste real do salário mínimo, a equipe do presidente eleito pode enviar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição para aumentar os gastos sem que eles estejam sujeitos ao teto.

Na lista de medidas imediatas, os analistas também dizem que o próximo governo petista também tem de fazer uma boa reforma tributária e retomar a imagem do Brasil no exterior, sobretudo em relação ao meio ambiente

Abaixo cinco economistas dizem quais devem ser as prioridades do novo governo.

Solange Srour, economista-chefe do Credit Suisse

Seis meses é um tempo enxuto e todos os esforços deveriam estar voltados para resolver três questões urgentes para que o juro real caia no país e impeça que a trajetória da dívida fique insustentável.

A primeira é aprovar uma nova regra fiscal que substituirá o teto de gastos a partir de 2023. É fundamental termos uma regra para limitar a despesa pública, pois está sob estrito controle do Executivo.

Primeira medida deveria ser aprovar uma nova regra fiscal, diz Solange
Primeira medida deveria ser aprovar uma nova regra fiscal, diz Solange Foto: WILTON JUNIOR / ESTADAO

Também é primordial aprovar uma reforma do gasto público que garanta que a nova regra fiscal não seja modificada ao longo do tempo como foi o teto de gastos. Poderíamos começar com a reforma administrativa, ainda que esta não traga muita economia no curto-prazo. O importante é estabelecer uma âncora para o médio-prazo e também uma restrição para os gastos de estados e municípios e estender a reforma administrativa aos demais poderes, Legislativo e Judiciário.

Por fim, o novo governo deveria encaminhar uma reforma tributária que traga maior eficiência ao sistema. Esta reforma servirá também para financiar o Bolsa Família de R$ 600. No entanto, o foco não deveria ser aumentar a carga tributária, mas ampliar a produtividade e acabar com enorme regressividade de nossa estrutura tributária. O risco é simplesmente elevarmos os impostos para gerar maiores resultados fiscais em vez de promover uma mudança no gasto público. Tal possibilidade, em vez de fortalecer, enfraqueceria a regra fiscal de um teto modificado.

José Alexandre Scheinkman, professor da Universidade de Columbia

Primeiro, é lidar com o Orçamento ‘fake’ que a administração Bolsonaro mandou para o Congresso. Esse é um problema sério, porque não estão previstos gastos que vão ser inevitáveis. Não é só a questão do Auxílio Brasil de R$ 600, mas existem outras coisas faltando no Orçamento. Para conseguir trazer essas coisas para o Orçamento, será preciso uma mudança constitucional.

Brasil tem sistema tributário ruim, diz Scheinkman
Brasil tem sistema tributário ruim, diz Scheinkman  Foto: ALEX SILVA/ESTADAO / ALEX SILVA/ESTADAO

A segunda coisa importante tem a ver com o clima. Acho que o Brasil tem um grande potencial de se tornar um dos melhores países em termos de clima – as pessoas gostam de dizer que o País é uma potência verde. E eu acho que ao, mesmo tempo em que vai trazer uma melhora do humor do mundo com relação ao Brasil, pode ajudar em investimentos.

Terceiro lugar, acho que é a questão tributária. O Brasil tem um sistema tributário muito ruim. Havia uma proposta, que pode ser melhorada e que foi desenhada por um grupo de pessoas, incluindo o Bernard Appy, mas esse governo não deu suporte para ela. O Brasil precisa passar para um sistema de imposto sobre valor agregado (IVA).

Alessandra Ribeiro, economista e sócia da consultoria Tendências

Tem uma questão que já estão tentando endereçar que é a fiscal. A gente tem um Orçamento que é completamente desconectado da realidade. Esse é o primeiro ponto. Provavelmente vai sair essa PEC (da Transição) para dar um espaço maior para gastos. Estão falando principalmente de gastos sociais, mas a gente tem um receio grande com relação a outros gastos, que vão pressionar (as contas) no ano que vem. Um deles é o reajuste do funcionalismo público. A pressão vai ser grande, ainda mais do novo governo, de tentar recompor uma parte das perdas inflacionárias dos últimos anos. O que também pressiona muito os gastos, pelas nossas estimativas, é a questão de precatórios e a definição de uma despesa discricionária mínima para manter o funcionamento da máquina pública.

Orçamento está desconectado da realidade, diz Alessandra
Orçamento está desconectado da realidade, diz Alessandra Foto: Tendências/Divulgação

O que pode ser ser interessante é resgatar as relações do Brasil com o mundo. O Lula pode voltar a resgatar esses laços, essas conversas, porque isso, primeiro, pode afetar o cenário de investimento para o Brasil, como também resgatar algumas discussões de acordos comerciais relevantes. Eu destacaria o da União Europeia com o Mercosul. Podem ser coisas importantes para o cenário brasileiro.

Poderia ser uma prioridade atacar a questão tributária, com a ideia de uma reforma tributária ampla, um IVA (imposto sobre valor agregado). Uma reforma (tributária) também pode ter um efeito muito grande e positivo nas expectativas.

Samuel Pessôa, pesquisador associado do Ibre/FGV

O mais fundamental é aprovar a reforma dos impostos indiretos, que até o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), já disse que é prioridade. E eu acho que ele está certo. É um item muito importante para gerar ganhos de produtividade. O governo também precisa construir um plano de estabilidade fiscal a médio prazo. Precisa dizer para a sociedade como vai arrecadar e pagar as contas, para que a dívida pública não exploda.

Governo precisa arrecadar mais para poder aumentar gastos, lembra Pêssoa
Governo precisa arrecadar mais para poder aumentar gastos, lembra Pêssoa Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO CONTEÚDO

A sociedade quer gastar mais? Quer R$ 200 a mais de Auxílio Brasil? Quer dar aumento de salário mínimo? Se tudo isso é verdade, o primeiro passo é o governo aprovar medidas que aumentem impostos. Não tem Orçamento para fazer tudo isso. É legítimo gastar mais. Mas, para gastar mais, tem de arrecadar.

Rafaela Vitória, economista-chefe do banco Inter

O governo vai herdar um orçamento ainda não definido com muitas pressões de gastos adicionais que precisam ser administradas. Em 2022, vamos terminar o ano com despesas em 18,5% do PIB, tendo gasto R$120 bilhões acima do teto, mas com superávit primário consolidado que vai ultrapassar R$100 bilhões ou 1% do PIB. Para 2023, com a redução dos impostos, esse superávit já tende a zero e, caso o governo aceite aumentar o orçamento em mais R$100 bilhões extra teto, voltaríamos a um déficit de 1%.

Sem âncora fiscal, o prêmio de juros continuará elevado, diz Rafaela Vitória
Sem âncora fiscal, o prêmio de juros continuará elevado, diz Rafaela Vitória Foto: Divulgação/Banco Inter

Além da sinalização de responsabilidade fiscal, que pode ser frágil caso o governo aprove novos gastos sem nenhum corte ou remanejamento, como nas emendas por exemplo, a inflação também pode voltar a subir com essa nova carga de estímulos. A queda da inflação para a meta é muito importante para o médio e longo prazo, pois significaria alívio na Selic ainda em 2023. E com as taxas elevadas, refletindo ainda um alto prêmio de risco, uma sinalização inicial de responsabilidade fiscal é muito importante para essa redução, para podermos voltar a ver taxas de crescimento acima de 2% com consistência.

O governo precisa controlar as demandas por mais gastos e reestruturar as novas regras fiscais para que tenhamos maior previsibilidade. Sem âncora fiscal, o prêmio de juros continuará elevado e a inflação em risco. A prioridade no início de governo é garantir que a inflação seguirá em queda, o que trará alívio para as famílias e permitirá juros menores e crescimento nos anos seguintes.

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