MDB busca União Brasil para tentar barrar Lira na Câmara e minar poder do Centrão
Foto: Zeca Ribeiro/Agência Câmara e Gabriela Biló/Estadão
Por Lauriberto Pompeu – Jornal Estadão
Luciano Bivar, Renan Calheiros e Eunício Oliveira querem impedir reeleição de Arthur Lira, mas acordo enfrenta dificuldades; União negocia apoio a futuro governo Lula em troca de cargos
BRASÍLIA – Na tentativa de conter o protagonismo do Centrão no novo governo, dirigentes do MDB articulam blocos na Câmara e no Senado com partidos de centro-direita, como o União Brasil. O alvo principal é o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), candidato à reeleição, além das comissões da Casa, por onde passam projetos de interesse do governo, como a de Constituição e Justiça e a de Orçamento.
A negociação, no entanto, sofre resistências de uma ala do União Brasil, partido que pode integrar a base do governo de Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso. O deputado Elmar Nascimento (BA), líder do União, disse ter sido procurado por integrantes da equipe de transição e que vai discutir o apoio a Lula com as bancadas nos próximos dias. Atualmente, a legenda faz parte da base de sustentação do governo de Jair Bolsonaro (PL).
Com o partido rachado, o presidente do União Brasil, deputado Luciano Bivar (PE), é um dos que almejam comandar a Câmara e tem procurado a ajuda de Lula desde o primeiro turno da eleição. A sigla abriga muitos aliados de Lira, como Elmar, o vice-presidente da legenda, Antonio Rueda, e o presidente da Comissão Mista de Orçamento, Celso Sabino (PA). “Ninguém está contra a reeleição de Arthur Lira. Ao contrário”, disse Elmar ao Estadão.
O próprio Lula resiste a avalizar um movimento para enfrentar Lira, que é o principal líder do Centrão. Na prática, o petista avalia que, atualmente, é difícil derrotá-lo e não quer ter um inimigo no comando da Câmara, capaz de levar adiante um processo de impeachment para tirá-lo do poder, como ocorreu com a então presidente Dilma Rousseff.
Divisões
O União Brasil é fruto da fusão entre o DEM e o PSL. Passado mais de um ano após o casamento, as divergências permanecem e ficam cada vez mais evidentes entre Bivar, que também era presidente do PSL, e um grupo oriundo do DEM, como o ex-prefeito de Salvador ACM Neto e o deputado Mendonça Filho (PE).
Outro ponto de discordância é em relação a ser ou não base de Lula. Interessado em comandar a Câmara, Bivar tem agido para que o partido faça parte da aliança do petista. Alguns integrantes do antigo DEM, no entanto, querem que a legenda seja “independente”, avaliando caso a caso o alinhamento ou não com o governo.
O ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) chegou a conversar com ACM Neto, Bivar e deputados do União Brasil, mas há queixas de dirigentes do partido de que o PT não é claro sobre qual seria o tipo de participação no futuro governo. Integrantes da Executiva Nacional do União reclamam da repetição de ex-ministros do PT em cargos importantes na equipe de transição e dizem que, se o futuro governo quiser mesmo apoio, terá de ouvir indicações do partido para cargos em ministérios.
Além do PP, o núcleo duro de apoio a Lira está no Republicanos e no PL, que também fazem parte do Centrão. O presidente da Câmara recebeu, ainda, sinais de adesão do PSD.
Mesmo assim, aliados de Lula no MDB ainda mantêm a intenção de apresentar um nome para desafiar Lira. “Por que o MDB não pode ter um candidato (a presidente da Câmara)? Vamos fazer um bloco grande e o MDB pode ter candidato, sim”, afirmou ao Estadão o deputado eleito Eunício Oliveira (CE). Além de Bivar, Eunício é um dos nomes desse grupo que discute a possibilidade de lançar candidatura ao comando da Câmara.
Costura
O MDB não dirige a Câmara desde 2016, quando Eduardo Cunha, hoje no PTB, era o presidente da Casa. Adversário de Lira, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) diz que os aliados de Lula precisam costurar uma “base ampla” e enfrentar o Centrão.
Há uma semana, no mesmo dia em que o presidente eleito se reuniu com Lira, Renan participou de um encontro com Bivar, ACM Neto e os líderes do MDB na Câmara, Isnaldo Bulhões (AL), e no Senado, Eduardo Braga (AM), para tratar da negociação sobre a aliança entre os dois partidos.
Renan disse que Lira “flertou com o fascismo” ao ter se aliado a Bolsonaro. “O objetivo é costurar uma base ampla que possibilite eleger o presidente da Câmara e do Senado, aprovar as reformas necessárias e garantir a governabilidade. Esse bloco inicialmente tentaria atrair algumas dissidências, mas não priorizaria a atração de quem flertou com o fascismo”, afirmou o senador.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, teve, recentemente, uma reunião com o deputado Baleia Rossi, que comanda o MDB. Após o encontro, Baleia disse que o partido será “colaborativo” com o futuro governo Lula.
Em um sinal da aproximação do MDB com o futuro governo, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) já está na equipe de transição do petista na área de Desenvolvimento Social. Simone ficou em quarto lugar na disputa presidencial e apoiou Lula no segundo turno. A presença da senadora no Ministério é dada como certa, embora o cargo não esteja definido. Renan e o senador Jader Barbalho (MDB-PA) também estão na transição e integram o Conselho Político.
O PT ainda não decidiu como se comportará na disputa pela presidência da Câmara, mas Lula já disse que o partido não terá candidato próprio e, no último dia 9, repetiu isso ao próprio Lira. Eleito para o comando da Casa com a ajuda de Bolsonaro, em 2021, Lira não demorou para acenar ao petista.
Em 30 de outubro, minutos após a vitória de Lula, o deputado do PP fez um pronunciamento e o parabenizou, mostrando-se disposto a colaborar com o futuro governo. O deputado José Guimarães (PT-CE) foi escalado pelo presidente eleito para conversar com Lira. O deputado Neri Geller (PP-MT), que apoiou Lula desde o primeiro turno, também tem feito essa aproximação.
Eunício minimizou os sinais de Lula. “Você acha que o presidente vai ficar com o Arthur Lira ou vai ficar com um candidato da base dele? Tem que ter calma com isso”, afirmou.
Renan, por sua vez, reclamou da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) negociada pelo futuro governo com o Centrão, que deve romper o teto de gastos para permitir a liberação de aproximadamente R$ 175 bilhões. O ex-presidente do Senado avalia que negociar a aprovação da PEC da Transição – como ficou conhecida a iniciativa que quer abrir espaço para pagar o novo Bolsa Família de R$ 600, além de outros benefícios sociais – é dar muito poder a Lira, que deseja manter o orçamento secreto. O esquema de compra de apoio político no Congresso foi revelado pelo Estadão.
Medida Provisória
Tanto Renan quanto Eunício já disseram que o melhor é não se comprometer com o Centrão e tentar resolver o assunto editando uma Medida Provisória. A iniciativa, de atribuição do presidente, tem validade imediata, mas é necessária a aprovação pelo Congresso, em até quatro meses, para virar permanente.
“O governo mudou. Democracia é assim: entram uns, saem outros. Não faz sentido negociar essa história do orçamento secreto até porque, pelo que eu conversei com o pessoal do grupo de orçamento do Senado, e até perguntei a algumas pessoas do TCU, não precisa de PEC para tapar esse buraco que o Bolsonaro deixou”, afirmou Eunício.
No Senado, há uma aproximação do PT com o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e a meta é impedir que um bolsonarista seja eleito para comandar o Congresso. “Vamos costurar uma base ampla que possibilite escolher os presidentes da Câmara e do Senado, aprovar as reformas necessárias e garantir a governabilidade”, disse Renan. A disputa para a escolha da cúpula do Congresso está marcada para fevereiro de 2023.
“Já conversei com o Pacheco, eu e o senador Randolfe (Rodrigues), e vamos voltar a conversar. Essa questão (de definir nome para candidatura a presidente do Senado) é um detalhe menor. O fundamental é uma frente com conteúdo político, institucional e programático para colocar no lugar desse fisiologismo, que significa a relação do atual Congresso com o governo”, insistiu Renan.
O senador admitiu não haver unanimidade no MDB para o apoio a Lula, mas avaliou que, de qualquer forma, o partido estará próximo do governo. “Todos os partidos terão dissidências”, justificou ele.