Editorial

Por
Gazeta do Povo

O ministro da Secretaria de Comunicação, Paulo Pimenta, o presidente, durante café da manhã com jornalistas setoristas, no Palácio do Planalto.


Paulo Pimenta também voltou a defender a regulação da mídia no país, afirmando que isso não se trata de censura.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.

É emblemático e preocupante – embora nem um pouco surpreendente – que o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência, Paulo Pimenta, tenha afirmado na terça-feira (17) que seu maior desafio à frente da pasta é recuperar a Secom como “emissora da verdade” e fonte confiável de informação. Em entrevista ao jornal Correio Brasiliense, o ministro enfatizou que a ideia é “recuperar o governo como o grande difusor em verdades”, defendeu a regulação da mídia no país e reclamou que a comunicação governamental estaria “capturada pela visão política ideológica de quem estava aqui”.

Trata-se de um grande erro. Embora a comunicação institucional de um governo, formada por uma intricada rede de produção de conteúdo que envolve órgãos de comunicação, veículos institucionais, assessorias de imprensa de ministérios, secretarias e órgãos do governo, além de campanhas publicitárias, deva, sim, primar pela divulgação de informações factuais confiáveis, e possa repassar as versões e posicionamentos do governo, não cabe a ela impor o que considera ser a verdade.

Quem sabe quais outras “verdades” o governo de Lula tentará criar em sua fome por reescrever a seu bel-prazer a história do país.

A verdade – não somos defensores do relativismo de ideias – é um bem precioso e delicado,  cuja aproximação é feita individualmente, de forma árdua, quase sempre gradual. Todos podemos, se quisermos, nos esforçar para buscá-la usando os meios disponíveis para tal, que incluem, entre outras coisas, a análise de informações e opiniões às quais temos acesso. Por ser uma realidade tão delicada (e precisamente por isso e em função da dignidade do ser humano), jamais pode ser imposta por quem quer que seja – nem governos, nem meios de comunicação, pessoas ou empresas.

Nesse sentido, a democracia é crucial para que a busca pela verdade possa acontecer, ao garantir a liberdade para que as pessoas possam expor e debater com humildade e equilíbrio pontos de vista distintos, opiniões e convicções. Isso não significa que todas as ideias e opiniões tenham o mesmo valor ou não possam ser limitadas – basta lembrar que, juridicamente, mesmo havendo proteção constitucional ao direito de expressão e opinião, há casos em que esse direito pode ser limitado. Ainda assim, trata-se de exceções, e a norma geral defende a liberdade de ideias, ao menos nas democracias.

Diante disso, a pretensão da Secom em se tornar a “emissora da verdade” do país seria risível se não fosse reflexo de uma política articulada em torno do pouco apreço à democracia. Longe se ser um mero equívoco, a fala de Paulo Pimenta é sintomática de um plano de governo muito bem orquestrado e que começa a ser colocado em marcha. Já alertamos sobre os riscos da criação de órgãos como a Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia, criada dentro da AGU, para “representar a União, judicial e extrajudicialmente, em demandas e procedimentos para resposta e enfrentamento à desinformação sobre políticas públicas”.

Há ainda o Departamento de Promoção da Liberdade de Expressão, na Secom, criado para “propor e articular políticas públicas para promoção da liberdade de expressão, do acesso à informação e de enfrentamento à desinformação e ao discurso de ódio na internet, em articulação com o Ministério da Justiça e Segurança Pública”. Trata-se uma estrutura pesada que poderá ser usada a qualquer momento contra quem supostamente promover a “desinformação”, ou seja, contrariar “a verdade” – mas a verdade segundo Lula e seus apoiadores.

Aos poucos, se tentará reescrever a história, apagando tudo o que for nocivo ou prejudicial à imagem do governo, em busca da narrativa mais positiva possível a Lula – e mais negativa aos seus opositores. Todas as demais versões poderão ser taxadas simplesmente de desinformação e assim eliminadas. Nesta semana, por exemplo, no site institucional da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em matéria sobre a nova diretoria da empresa, o processo legal que levou ao impeachment de Dilma Rousseff passou a ser chamado de “golpe”, num flagrante desrespeito aos fatos.

Como se sabe, embora tenha sido sempre tratado como um “golpe” pela esquerda, o processo de impeachment de Dilma seguiu os trâmites legislativos previsto na Constituição e na legislação brasileira e contou com o apoio da população. Na época, pesquisas de opinião apontavam que 60% da população brasileira era favorável à destituição da então presidente petista, por crime de responsabilidade pelas “pedaladas fiscais” cometidas durante seu mandato. Mesmo assim, a narrativa esquerdista insiste em tentar impor sua versão distorcida em que Dilma foi vítima inocente de um complô golpista.

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Amostras dessa predileção pela distorção dos fatos na tentativa de validar uma narrativa politicamente benéfica aos seus interesses ideológicos já pôde ser vista ainda durante o processo eleitoral. Basta lembrar do empenho da campanha petista em tentar apagar ou ao menos impedir que fatos – muitos deles já bem conhecidos – fossem divulgados sob a justificativa de que eram “fake news”.

Foi assim com o apoio histórico de Lula e do PT ao aborto, que não pôde ser mencionado durante a campanha, mas que foi confirmado poucos dias após a posse; ou mesmo a censura imposta pelo TSE, a pedido da coligação de Lula, contra postagens que mencionavam a ligação do então candidato petista e o ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, do qual até a Gazeta do Povo foi vítima, infelizmente com o respaldo da Justiça Eleitoral.

Quem sabe quais outras “verdades” o governo de Lula tentará criar em sua fome por reescrever a seu bel-prazer a história do país.


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